terça-feira, 10 de maio de 2011

SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO III


RESENHA DO CAPÍTULO
OS PROFESSORES: INSTRUTORES OU EDUCADORES?[1]
Elcio Alberton
O autor parte da afirmação que educar se constitui numa tarefa muito mais excelsa do que o simples processo de instruir.  Ao longo do texto leva a compreender que a missão de educador equivale a um sacerdócio que transforma o professor em verdadeiro mestre de vida.  Desde esta perspectiva também a escola tem uma função muito além de local para a instrução. E educar consiste em transmitir valores, posturas, condutas, comportamentos, ao passo que instruir é uma redução a produção de conteúdos e competências específicas.
Uma escola que reduza sua função ao campo da instrução poderá ser uma boa preparadora para o mercado de trabalho e até desenvolverá competências e habilidades, mas não formará para a vida. (Caso da Escola Municipal Tasso da Silveira – Realengo). Neste sentido já se expressou Paulo Freire e o fez com as seguintes palavras: “Transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formativo”[2]
Outro expoente que trata da educação sobre a mesma ótica é Gusdorf[3]: “Se a instituição escolar na sua totalidade tem por fim a aprendizagem da humanidade pela pessoa é evidente que o sistema pedagógico deveria ter como tal um valor formativo” (Apud. Juliatto, 2010, p. 58).
Algumas condições são indispensáveis para que a escola desenvolva mais plenamente seu potencial formativo e um deles será a capacidade de desenvolver no seu interior o conceito de comunidade seja no seu todo, seja em suas partes, compreendendo a sala de aula, os espaços de lazer, a biblioteca, sala dos professores e etc.
Ninguém pode por em dúvida que a realização do ser humano e o seu modo de SER e fazer no mundo se deve à formação que se estabeleceu no período escolar. A influência desta instituição sobre as pessoas é tal que todos os governos totalitários tomam como primeiras medidas o controle dos sistemas educacionais.
Neste sentido cabe com exatidão a qualificação de educador para designar a missão de ensinar e o papel do professor uma vez que este tem uma tarefa especial que consiste em formar o caráter dos seus alunos, em repassar-lhes valores e lições de vida. Não se excluí é obvio da tarefa do professor o papel de facilitador no processo de aprendizagem. Isso claro que é importante, mas a missão do professor é muito mais complexa e dele se espera muito mais do que capacidade técnica e preparo intelectual.
Parece claro que o professor que resume sua função à tarefa de transmitir e facilitar habilidades e competências tem seus dias contados, sobretudo diante dos inúmeros meios eletrônicos que vão paulatinamente ocupando esse espaço.  Mas há uma condição que nenhum recurso tecnológico é capaz de suprir: a condição de educador, aquele que inspira, orienta e influência.
É o mesmo Gusdorf, na obra Professores para que? Quem afirma que do professor - instrutor se espera apenas conhecimento, do mestre educador se pede que seja capaz de interpretar o que ensina aplicando o saberes ao cotidiano das relações.
A ideia de professor como “un insegnante” é de longe comparada com a figura do “maestro de vita”  presente nas pequenas comunidades interioranas do norte da Itália pré-unificada. Aliás, foi esta figura que mais tarde acompanhou os imigrantes na saga de “colonizar o Brasil” no final do século XIX.
Por aí se pode ver que educação se constitui num sacerdócio, ou seja, é um elemento de vocação, mais que de simples profissão, para ser tal exige-se virtude e cultivo de hábitos que moldem o coração.
George Steiner[4] afirma que “ensinar seriamente é tocar no ponto mais vital de um ser humano... É buscar um acesso à integridade mais viva e íntima de uma criança ou de um adulto... Um ensino de má qualidade é um assassinato e, metaforicamente, um pecado” (Apud Juliatto, 2010, p.62).
Considerando este quesito há de se compreender que nunca nenhum docente está pronto na sua condição de educador, assim como também nenhum estudante é perfeito discípulo. Em ambos os casos a vida pede abertura para um aprendizado constante. Neste sentido não se pode falar de uma educação para o futuro, mas sempre sob a ótica presentista.
As instituições educacionais, escolas e universidades tem uma responsabilidade insubstituível que consiste em oferecer educação integral, a qual como se disse é muito mais do que facilitar a produção de saberes. Dentre os educadores de renome, merece citação o popular: Tristão de Ataíde, (Alceu Amoroso Lima) o qual declarou que o compromisso da Universidade “é promover a humanização integral entre pessoas, também entre classes e povos” (LIMA, 1961, p.12).
Já se disse que a função do professor é mais uma vocação do que uma tarefa a ser exercida e nesta direção já falava também Gandhi, afirmando que a verdadeira educação consiste em fazer aflorar o que há de melhor dentro das pessoas. A isso se denomina cultivar valores, que no dizer de Juliatto 2010, “são aqueles elementos que dão significado à vida. E o trato com os valores é responsabilidade do educador. Ele não considera importante somente proporcionar uma formação integral e humanista do futuro profissional, mas, sobretudo, sabe que tem o  compromisso de melhorar a alma humana” (p.65-66).
Nesta mesma direção se expressou o papa João Paulo II, falando aos universitários em Roma: “Como homens de ciência interrogai-vos continuamente sobre o valor da pessoa humana” (nove set. 2010). O descuido no que se refere ao cultivo de valores favorece a deformação dos alunos passando assim uma ideia que eles não são importantes. Neste sentido fica bem falar de educação integral como integradora da educação profissional.
Para que estas realidades sejam reconhecidas não é difícil compreender o conceito de praticidade que envolve o processo de ensino/aprendizagem. É por meio desta condição que alunos e professores têm condições de se adaptar às novas situações e enfrentá-las com serenidade. O educador é uma espécie de engenheiro do conhecimento, neste sentido estando preparado para fazer sempre novas articulações.
Os problemas existem para serem resolvidos e esta é a segunda ótica que precisa ser reconhecida na função do professor, diante das urgências e dificuldades o professor pragmático adora postura positiva, isto é, olhar clinico e sereno de quem sabe que poderá encontrar a solução de descontinuidade para o problema.
A terceira arte do professor educador reside na capacidade de organização, e neste sentido também ele é digno de ser imitado. A organização é o que se pode chamar de princípio de clareza entre aquilo que sabe e o que sabe fazer e dizer.
Seria também ilusório tratar a educação só a partir dos aspectos pragmáticos e presentistas, ou seja, o processo se dá no presente, mas com um olhar no horizonte e neste sentido o educador é um semeador de utopias. Nesta direção se expressa a escritora mexicana Monique Zepeda:
A escolha de ser professor supõe sonhos e riscos. O sonho de moldar o outro, quase criá-lo segundo o próprio desejo, transformando-o para que se pareça o mais possível a uma imagem ideal de ser humano, (...) para que chegue mais longe do que ele próprio tem chegado, para que alcance o que ainda não conseguiu (...) O risco de desconhecer que o desejo é motor de toda a ação pedagógica; o perigo de atuar com os olhos fechados. Existe o sonho de uma comunicação fluída com os alunos e o temível desencanto de não consegui-lo (Apud Juliatto, 2010, p. 69).
Educar para a utopia é muito diferente de formar a partir do viés ideológico, quem, verdadeiramente educa, assim o faz, bem sabendo em que direção faz. O que na linguagem de Rubem Alves consiste em plantar esperanças. Essa realidade faz do educador  um sedutor, e aquele que seduz também encanta e vai alimentando a dimensão espiritual e mística que acompanha o ato de educar.
Educar com a perspectiva de transformar o homem e a sociedade implica dar vazão à sensibilidade social  capaz de olhar com carinho para os mais necessitados seja econômico seja necessitado de solidariedade, neste sentido cabe o provérbio Hindu: “É quando o discípulo está pronto que o mestre aparece”.
O que se chama em outra linguagem de professores marcantes é que se denomina aqui de modelos e isso não exatamente porque sabem muito, dominam todas as técnicas pedagógicas ou conhecem todo o conteúdo, mas pelo contrário são educadores que cultivam o entusiasmo, a alegria e o otimismo.
Não sem razão retornamos ao início da Filosofia Grega quando o velho e sábio Sócrates  compara a função de ensinar ao trabalho da parteira. Ou seja o mestre facilita o crescimento do amor pelo saber e incentiva relações que facilitem o “dar a luz”. Na esteira da clássica afirmação socrática “Só sei que nada sei” destaca-se Picasso ao dizer: “Meu orgulho aos 80 anos é saber a metade do que pensava saber aos 20 anos...”.
Nada nem ninguém diz Paulo Freire pode sepultar o sonho de novos tempos para a educação e isso se pode compreender na afirmação: “divinizar ou diabolizar a tecnologia ou a ciência é uma forma altamente negativa e perigosa de pensar errado”(Freire, 2001, p. 37). Ao lado da tecnologia e das novas formas de ensinar o educador é desafiado a associar a sensibilidade para tratar as pessoas.
Na arte de educar alguns perigos são iminentes e um deles deixar-se dominar pelo dogmatismo, ou seja por certezas absolutas, do outro lado está o relativismo, posição que considera tudo como certo e correto dependendo do interesse e da ocasião. Nem tampouco pode se deixar envolver pelo ceticismo o qual reduz ao niilismo e incapacidade de saber e conhecer qualquer coisa.
Não se pode pensar educação sem compreender a missão da instituição e a filosofia que ela cultiva, ou seja, qual a ideia de ser humano é cultivada no seu interior. Muitas questões não tem necessidade de ser tratada, basta que sejam executadas. Entre elas o senso de justiça, que fala muito mais forte o fato de o professor ser uma pessoa justa do que todos os demais discursos.
Educar é uma questão de apontar para o bom, o bem o justo e o correto e isso se faz não exatamente pela titulação, como se expressa o reitor da PUCPR  “nós formamos o cidadão para ser bom profissional e para ser  gente boa” (Juliatto). Ou com outra formulação “As palavras serão vãs se o aluno não perceber, na vida do mestre, dentro e fora da universidade, o exemplo que arrasta” (apud, Juliatto,  2010, p. 87).
Com todas essas afirmações não há como fugir da compreensão de que a espiritualidade precisa fazer parte da atmosfera da educação. Aqui entra o desejo de Kant, que a educação produza pessoas civilizadas. Deixar de cultivar Deus e a concepção de pessoa ética e transcendente é deformar a educação.  Sem ilusão, abrir-se ao transcendente não pode ser entendido como negação da racionalidade pelo contrário esta abertura significa a expressão da capacidade mistagógica do próprio educador.
A mistagogia do educador está muito mais presente no modo como ele encara a vida do que nas distintas maneiras de como pode falar sobre ela. Neste sentido cabe a expressão de Einstein:
Não é suficiente ensinar ao homem uma especialidade. Através dela ele poderá tornar-se um tipo de máquina útil, mas não uma personalidade  harmoniosamente desenvolvida. É essencial que o estudante tenha uma compreensão e um sentimento vivo em relação aos valores. Ele deve adquirir um senso vivo do belo e do moralmente bom  (Apud Juliatto, 2010, p.92).


[1] JULIATTO, Clemente Ivo. Parceiros Educadores, Curitiba: Champagnat, 2010,  p. 55 – 91.
[2] FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2011. P.37
[3] Filósofo e epistemólogo Francês falecido no ano 2000.

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