segunda-feira, 4 de outubro de 2010

APRENDER A APRENDER


 

TECNOLOGIA E APRENDIZAGEM COLABORATIVA[1]

Elcio Alberton[2]

            Que o século XXI se apresenta como assustador e totalmente novo não parece ser novidade e não são poucos os pesquisadores que fazem tal constatação. O resultado das profundas mudanças é sentida por todos os segmentos da sociedade e a educação está fadada a fazer parte desta cultura “planetária, mundial e globalizante”. A metamorfose que vai sendo experimentada aponta para o advento de uma nova sociedade que pode ser caracterizada pelo conhecimento e pela globalização.
Dentre as verdades que este novo modo de ser e fazer imprime em cada sociedade, cultura ou pessoa está a necessidade de contínuo aprendizado para o qual não parece haver alternativa que não permanecer conectado ou reconectar-se cotidianamente. Situação que, de alguma maneira, implica em reunir o que havia sido fragmentado, reassumir o todo e enxergar globalmente.
As boas práticas educacionais, que sempre deram certo em  todos os níveis de ensino, particularmente nas universidades, estão desafiadas a inteirar-se da dinâmica, ou integrar-se na dinâmica da globalização com o consequente uso dos recursos tecnológicos que “ditam” ou “determinam” outros comportamentos e não permitem a manutenção dos paradigmas.
O próprio papel das Instituições de ensino superior e da educação superior sofre a quebra de paradigmas diante da quase impossibilidade de realizar um processo de ensino-aprendizagem em desconexão com as mudanças provocadas pelo advento das novas tecnologias. Isto implica compreender e aderir a uma constante reatualização que vai dando lugar a homogeneidade do que se poderia chamar como “vida útil” do profissional da educação.
A ideia de “ser completo” ronda o SER das instituições com a mesma intensidade que elas experimentam a impossibilidade de alcançar esta utópica condição. Tal confronto de realidades ou de identidades vai se tornando um fenômeno gerador de crises. Já não existe mais um tempo para concluir uma tarefa, uma formação, uma licenciatura, sob o ponto de vista que não existe um tempo no qual o acadêmico esteja formado, pronto, acabado, apto para exercer a profissão. Repensar a prática pedagógica é uma exigência que pode ser parafraseada com a máxima do pequeno príncipe: “tu te tornas eternamente responsável por aquele que cativas”, isto significa admitir que o aluno continuasse sendo um aprendiz em construção e que o professor nunca alcançou o limite de “ensinar tudo a todos”.
A condição de eterno aprendente parece ser a única possível para os assim chamados “egressos” no sentido que a “saída” do campo da aprendizagem nunca acontece de modo definitivo. A globalização, por meio da rede de informações desafia professores e alunos a permanecer em cotidiana busca de novos saberes, novas metodologias, outros recursos, e verdades mais adequadas para cada contexto.
Uma das primeiras condições do dueto docente-discente será a de abertura para a inovação, investigação, pesquisação, articulação, parceiros no processo que se chama colaborativo. Não existe mais um professor dono da verdade e detentor de todos os saberes e informações. No máximo o professor poderá se qualificar como um instrumento, no sentido positivo da palavra, que facilitará a abertura de novos caminhos para a produção de conhecimento que cada vez mais é uma “arte coletiva”.
Sem meias palavras o outro lado (discente) se encontra na mesma “encruzilhada” do saber posto que já não se conceba um acadêmico “passivo, ouvinte, leitor, decorador, repetidor”. Este na mesma ou maior proporção que o professor está desafiado a crescer em criatividade, criticidade, aperfeiçoando-se na condição de pesquisador e produtor de saberes. Isto implica em aceitar que o dueto (docente-discente) precisa aprender a aprender e aprender o que fazer com o aprendizado que o leve para novos caminhos cujo horizonte seja um mundo sustentável e não a mera preparação para o mercado.
A globalização, como resultado do avanço tecnológico aponta para uma metamorfose onde o foco não está mais reduzido ao ensino, mas à aprendizagem. Como já se disse, não simplesmente em vista de responder às exigências do mercado, mas tendo em mente a transformação própria e da sociedade a ponto de ser compatível com o desenvolvimento tecnológico. Claro está e perceptível a olhos laicos que a simples adoção de práticas tecnológicas “mecaniza o coração do pobre homem”. É imperativo aliar a adoção de novas tecnologias a princípios éticos sob pena de alicerçar a sociedade emergente em resultados agressivos, racionais e desumanos como o consequente agravamento das injustiças sociais e processo de exclusão, beirando-se a constatação de Tomas Hobes: “homo homini lupus est”.
Ter em conta o ser humano antes e acima de qualquer tecnologia é uma condição que impedirá a instrumentalização e fará o homem Senhor da  técnica e não o contrário. O uso dos recursos tecnológicos é absolutamente necessário sob pena de estar excluído da sociedade digital e merecer o qualificativo “dinossauro digital”, todavia, a tecnologia precisa ser contemplada sem a permissão que ela determine o agir humano e subjugue a ética e as relações de cooperação e de solidariedade.
Claro está que a sociedade tecnológica impôs a quebra do paradigma da “profissão professor” na medida em que rompeu com os conceitos de transmissão de informações, memorização de supostos aprendizados, resultados competitivos e formadores de pessoas individualistas e concorrentes colocando em seu lugar, não numa mera inversão de papéis, mas numa construção coletiva de saberes socializados que não podem ser mensurados pela quantidade de informações repassadas, objetivos propostos e conteúdos memorizados.
As exigências tecnológicas aplicadas a educação exigem um deslocamento de eixo, indo do polo restrito da “ensinagem” para a “aprendizagem”.  A globalização associou aos modos oral e escrito de apresentar os saberes, a “digitalidade”, por conta da sua condição esta última quase que impõe ser reconhecida como   quem tem supremacia em relação às outras duas e isto pelo simples fato da velocidade com qual se apresenta.
É importante deixar claro que o saber apresentado pelo modo digital não se resume a uso de equipamentos, mas a produção de novos comportamentos, nova racionalidade, novos estímulos.  Compreender esta verdade implica aceitar e usar com critérios humanos os recursos tecnológicos considerando a possibilidade de “presença real” mesmo na virtualidade do aprendizado de modo que os “encontros virtuais” se transformem em reais possibilidades de interação entre o indivíduo e o coletivo. Uma ideia que não pode ser subestimada pelo docente imerso no uso das tecnologias do saber implica em ter absolutamente clara que a adoção de práticas tecnológicas não cria novas necessidades, mas responde às necessidades que a sociedade já havia criado. Isto significa compreender que a lógica do consumo não pode se sobrepor á lógica da necessidade, ou seja, que o consumo não é criador de necessidades, mas que as necessidades criam o consumo.
Daí que parece importante recuperar o conceito, já trabalhado com o dueto (docente-discente), que a  globalização deve superar a prática de “codificador X decodificador” de informações que eram tidas como saberes repassado e supostamente aprendido, por uma reflexão crítica do papel da informática com os consequentes benefícios que a era digital pode trazer para o aluno. Neste sentido a sala de aula passa a ser compreendida exatamente naquilo que ela é: “Um lugar” e certamente pode ser chamar de lugar privilegiado de encontro dos saberes no sentido em que ali se cruzam na plenitude do processo de relacionamento, o professor e o aluno, ambos, sujeitos e produtores de distintos saberes.
A tecnologia digital pode ser parafraseada como sendo o inconsciente de cada individuo no sentido que ele é atemporal assim como os bites que tem seu próprio tempo seu espaço e sua forma de exposição, a isto pode se denominar de momento revolucionário do aprendizado. No uso adequado das tecnologias de informação os alunos vão se constituindo em descobridores e transformadores de produtos e talentos o que se pode chamar de “portadores de Inteligências múltiplas”.
O professor adaptado às tecnologias será capaz de levar em conta o que se chamou de Inteligências múltiplas, e que segundo Gardner se constitui de oito elementos: “espacial, interpessoal, intrapessoal, cinestésico-corporal, linguística, lógico-matemática, musical e naturalista”. Ter presente que cada uma destas competências ainda está como que transversadas por outras habilidades ou exigências: “Comunicação, colaboração e criatividade”.  No texto que trata da tecnologia e inovação os autores falam da necessidade de estabelecer o processo de adequação tecnológica a partir de uma decisão política e que faça parte da missão e da visão da instituição, aqui  se reforça a necessidade de que as novas práticas pedagógicas sejam uma escolha das universidades.
Esta nova prática, ou melhor, este novo jeito de ser professor exige redimensionamentos, porque não dizer estabelecimentos de novas balizas para o aprendizado os quais se darão por meio da abertura de novas formas de contatos entre professores e alunos. As tecnologias digitais romperam as barreiras de espaço e tempo, deste mesmo modo há que ser a decisão das pessoas no sentido de derrubar as barreiras  da sala de aula, do quadro de giz, e do livro texto com  criatividade e abertura para a transformação das realidades.
A era digital quebra os paradigmas burocráticos, hierárquicos, departamentalizados, mantido por rígidos controles comportamentais estabelecendo princípios de descentralização no qual as regras e os princípios sejam discutidos coletivamente. Tal realidade somente será possível se a aprendizagem propriamente dita partir das necessidades e expectativas que o aluno traz para dentro do contexto escolar, deste modo ela será “instigante, desafiadora, significativa, problematizadora e capaz de apontar soluções”.  Em resumo trata-se de uma nova ação docente na qual “a relação professor aluno contempla a inter-relação, e a interdependência dos seres humanos, que deverão ser solidários ao buscar caminhos felizes para uma vida sadia e sustentável”.
A aprendizagem colaborativa se confirma na medida em que todos estiverem convencidos que o aprendizado nunca está acabado se confirmando o que já dizia Sêneca: “Penso que muitos já poderiam ter chegado à sabedoria, se não estivessem convencido de já haver chegado”. Daí se pode afirmar que esta forma de estudar se sustenta em quatro pilares.
1)                 Aprender a conhecer
2)                 Aprender a fazer
3)                 Aprender a viver juntos
4)                 Aprender a ser

Em se tratando de aprender a conhecer a primeira e clara atitude consiste na capacidade de acessar, investigar, ter curiosidade em outras palavras pesquisar e como conclusão  produzir conhecimentos. Na medida em que aprender a conhecer o pesquisador aprende também a fazer e isto está longe de apenas preparar para o mercado, se trata de desenvolver aptidões às quais não se limitam ao uso de recursos tecnológicos que muitas vezes o mantém agindo na dicotomia teoria  e prática. Quem aprende a viver juntos, compreende muito melhor que “nenhum homem é uma ilha” e que a sobrevivência de ambos dependerá da compreensão de sustentabilidade que todos forem capazes de desenvolver.

O que aprende a viver junto compreendeu a indignação de Luther King: “Nós vivemos juntos como seres humanos racionais ou morremos juntos como idiotas”. A incapacidade de compreender que o ser humano não pode ser transformado em máquina já vem sendo questionada de longa data. Chaplin já afirmava: “Não sois máquinas, homens é que sois”. Na década de 1970, Peninha compôs e cantou: “Máquinas”. Hoje a sociedade está suficientemente convencida que o simples avanço tecnológico não é sinônimo de melhor qualidade de vida, ao contrário estes desafiam o homem a construir relações de solidariedade e cooperação.

Neste ponto toda a sociedade e em particular a escola é convidada a rever seu processo pedagógico facilitando para toda a comunidade escolar um processo de reflexão e aprendizado capaz de superar conflitos e respeitar as distintas opiniões. Aprender a ser consiste na capacidade de produzir e formular seus próprios juízos os quais irão colaborar com a superação da desumanização recriando a afetividade o companheirismo embrutecedor que não é sinônimo de displicência. Parafraseando Che Guevara: “hay que endurecer pero sin perder la ternura jamás”. A fim de não ser engolido pela obtenção do ter em detrimento de ser a escola é desafiada a superar as possibilidades de bullyng cujas  dimensões são alarmantes na atualidade, as quais transformam os alunos em “lobo de si mesmos”.

A preparação da pessoa do professor capaz de responder criativa e criticamente, com autonomia e transformadores da realidade pode ser denominado como processo de mistagogia da docência. Nesta perspectiva as escolas podem servir-se da tecnologia sem correr o risco de menosprezar a cidadania. Ou como escreveu Chalita o educando:

 

Precisa de alma, de alguém capaz de auxiliá-lo na arte de gerenciar sonhos ou ainda: o mundo precisa de educadores por meio dos quais as crianças possam desenvolver e compartilhar o afeto e a esperança pela vida e pelo ser humano com criatividade, com pensamento crítico. Com uma cultura de saberes que se relacionam e são necessários (CHALITA, 2006, p11).

Esta maneira de ver a educação é o que se pode chamar de paradigma inovador ou emergente o qual instiga a estabelecer um sistemático processo de renovação das práticas que superem o conceito de que no processo de conhecimento aconteça a polarização entre o que sabe é pode ser considerado sujeito e o que não sabe e está na condição de objeto.  Desta compreensão se delineia que a educação é um processo de ensino com pesquisa em vista da transformação social e das relações a procura da unidade do conhecimento em detrimento da fragmentação que normalmente grassa nossas escolas.
O que chamamos aqui de novos paradigmas consiste em ir muito além das práticas de transmissão de saberes, ou melhor, de informações, que se fosse necessário falar na linguagem digital se poderia dizer que se tratava da moderna prática do “CTRL C – CTRL V”.  Estabelecer novos paradigmas para a educação consiste em adotar as práticas de elaboração e reelaboração dos conhecimentos  que na linguagem tecnológica se pode aplicar às páginas “WIKI” ou fóruns de discussão e produção de saberes. O aprendiz em lugar de ser um receptor passivo tem como pressuposto  o gosto pela dúvida, pela investigação e pelo consequente prazer da descoberta.
O ensino com pesquisa certamente não transforma somente o aluno que aos poucos vai se tornando um parceiro na formulação de novas possibilidades de socialização dos saberes. Na medida em que isto se realiza o educando será capaz de produzir páginas de domínio, blogs, e adentrar para o mundo virtual do conhecimento. E aí os professores se reconhecem progressistas não simplesmente por estes avanços tecnológicos estarem ao alcance de todos, mas, sobretudo, porque a comunidade escolar é capaz de se posicionar com clareza diante dos desvios éticos e injustiças sociais. Esta realidade implica por parte de ambos os envolvidos no processo o desenvolvimento de uma fé profunda e duradoura.
A superação dos conceitos fragmentados de saber abre para a perspectiva da totalidade que faz compreender a vida e a existência do ser humano como uma das dimensões da sustentabilidade e da necessidade de preservar para se auto-preservar. Daí compreender que não basta ser professor conteúdista  e especialista em determinadas disciplinas ou mesmo ter boa prática didática, o ser do professor implica em compreender que seu trabalho e seu ser são um todo complexo de relações que necessariamente tem a ver com relacionar, simular, inventar.
Educar com visão de totalidade consiste em desenvolver todas as dimensões do ser pessoa, isto é, o seu lado racional e o emocional, isto se pode parafrasear com o uso das tecnologias de educação no que concerne  a bem utilizar os recursos de hardware e software. Por esta ótica fica cada vez mais claro que o processo de conhecer se dá de modo mais pleno e adequado sempre que ele focar na maior necessidade do ser humano: realizar-se plenamente como criatura.
Já parece estar claro sob esta ótica que as tecnologias vão sendo disponibilizadas tendo como meta a aprendizagem colaborativa, sendo facilitadoras do desenvolvimento das aptidões. O uso das tecnologias vai aparecendo como instrumento de interação e exercitador  de habilidades. Os serviços eletrônicos de troca de saberes, embora não tenham sido criados precisamente com vistas á educação se prestam para estimular as relações de saber e de cooperação. A transformação dos grupos físicos de estudo pode ser reorganizado em grupos de discussão online com significativos ganhos para todos. Entre as vantagens do processo há que se considerar a imensurável gama de saberes e informações disponíveis em um CLIC.
O processo de comunicação antes restrito à sala de aula alcança o mundo virtual e toda a vida acadêmica ganha em agilidade e praticidade. Todavia nunca é demais reforçar que o recurso por si só não garante a inovação, ele depende de um projeto bem arquitetado  e alimentado por todos na escola estabelecendo o que já foi chamado de processo de “aprender a aprender”.
Sempre que os recursos tecnológicos forem colocados como uma política institucional de promover o SER do professor e do aluno, eles estarão na condição de encorajadores de contatos promotores de cooperação facilitando o que se chama aprendizagem colaborativa. A interação online permite feed back independente dos encontros presenciais, do mesmo modo o processo avaliativo pode ser ricamente ampliado.
O auxílio da informática é um estimulador no aproveitamento do tempo na medida em que ele for utilizado adequadamente com objetivos e clareza de sua função. Além do mais os recursos virtuais são hoje uma alternativa plausível para promover a sustentabilidade.  Um recurso tecnológico permite disponibilizar para um número muito maior grande quantidade de informação à custos significativamente reduzidos sem contar na importância da socialização universal, quando se trata do uso da rede mundial de computadores.
A produção de saberes que os recursos tecnológicos viabilizam faz com que se possa superar a velha máxima que consistia em “escutar, ler, decorar e repetir”. A consulta ao infinito universo virtual permite avanços no conhecimento auxiliando a compreensão de instrumentos cooperativos do saber. Tudo isso sempre respeitando o princípio básico sobre o qual já se falou abundantemente que consiste em não substituir a pessoa pelo equipamento.
Estamos tratando da aprendizagem no contexto das profundas transformações por que passa a humanidade, neste contexto o uso das tecnologias na educação é provocador de uma verdadeira metamorfose em relação à qual nenhum professor pode se comportar como uma ilha no meio da opção da instituição ou passar a utilizá-las indiscriminadamente quando não fizerem parte da visão da mesma. Dito isto se retoma a compreensão de que a aprendizagem colaborativa via recursos tecnológicos demanda postura cooperativa.
Provocar o aluno com o intuito que ele se torne um produtor de conhecimento valoriza-o tanto mais na medida em que vai se dando a compreensão do processo ensino-aprendizagem. Os alunos se tornam elementos ativos e responsáveis pelo desenvolvimento do processo estabelecendo sempre relação de entre ajuda o qual acontece com a plena consciência de que os saberes são provisórios, ou melhor, não se constituem respostas únicas e acabadas ou verdades absolutas.
Uma das mais esfarrapadas desculpas para se eximir do uso de tecnologias reside na afirmação de que os alunos ou a escola não tenham acesso e algumas vezes não tenham domínio de recursos informatizados. Quase não há espaço público que se possa qualificar de excluído digital e até nas famílias de mais baixa renda o acesso às tecnologias de informação é uma realidade plausível.
O desafio consiste, como já foi dito, em garantir a produção de modo técnico e que supere as práticas memorizadoras que se vem repetindo desde a Ratio Studiorum com toda a prática pedagógica jesuítica adotada nos anos 1600. Bastante claro está o estabelecimento de uma prática dialógica que facilite uma avaliação processual ao mesmo tempo crítica, coletiva e reflexiva.
Desenvolver no aluno o gosto e a capacidade de defender suas ideias fará dele um “vendedor de sonhos” que ultrapassa os conteúdos propriamente ditos e os constituem cidadãos mais do que conhecedores de matérias.
Antes de Paulo Freire e mesmo contemporâneo a ele, outros manifestaram a necessidade de fazer da aprendizagem um processo de trocas, aqui, mantendo as citações do texto que se está comentando repetimos a frase freiriana: “Uns ensinam e ao fazê-lo aprendem. Outros aprendem e, ao fazê-lo ensinam”. Certamente aqui se dá a construção de um processo que pode ser denominado com as palavras do Saint Exupery: “é preciso cativar”. O sucesso deste modo de desenvolver a aprendizagem consiste em criar uma relação amorosa pela produção e partilha coletiva dos saberes.
Na atualidade um dos instrumentos importantes para promover o gosto pela socialização implica em facilitar aos alunos a criação de páginas de internet, blogs e outros recursos de aprendizado colaborativo. E aqui volta a se dar uma quebra de paradigmas: Será que perderemos muito tempo? Cabe perguntar se os professores que continuam ocupando todo o tempo com aulas expositivas e transmissão de conteúdos realmente facilitaram para que seus alunos efetivamente aprendessem?
Quando falamos que a o uso da tecnologia suplanta a prática de avaliação tradicional ficou também claro que não se disse “não” a toda e qualquer forma de avaliação. Esta deve ser instigada no sentido de desenvolver competências e autonomia, em resumo, o foco da ação passa do processo dito “ensinagem” para a “aprendizagem”.
A guisa de conclusão resta ter claro que a quebra de paradigmas com o estabelecimento de novos referências consiste em renovar constantemente o que pode ser chamado de “contrato didático”.









[1] Comentários ao texto Projetos de aprendizagem colaborativa num paradigma emergente da Prof. Dra. Marilda Aparecida Behrens
[2] Licenciado em Filosofia, Especialista em Teologia Pastoral e Gestão Educacional, Mestrando em Educação pela PUCPR. Funcionário da Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná - Professor formador no programa PROINFANTIL, Professor na UNOESC – Campus de Joaçaba – SC.   Email: professor.elcio@hotmail.com

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

METODOLOGIA DO ENSINO SUPERIOR


PROFISSÃO: PROFESSOR!

Na complexidade das transformações por que passa a sociedade contemporânea uma das questões delicadas que se encontra é a questão das identidades. Não poderia ser diferente no que se refere à questão da docência e da profissão docente. Na arte de ensinar e aprender cada vez mais estão imersos profissionais de distintas áreas de saberes e realizações pessoais, todavia, a identificação com a condição docente é uma constante em todos aqueles que a ela se dedicam mesmo que apenas  algumas horas semanais.
Mas afinal de contas, quando e como se faz um professor? Diversos estudiosos procuram responder a esta intrigante pergunta, não sem antes estar convencidos que o professor se faz no cotidiano  da docência.
Deste modo parece bom reconhecer que:
(...) o professor universitário aprende a sê-lo mediante um processo de socialização em parte intuitiva, autodidata ou (...) seguindo a rotina dos outros. Isso se explica sem dúvida devido a inexistência de uma formação específica como professor universitário. Nesse processo, joga um papel mais ou menos importante sua própria experiência como aluno, o modelo de ensino que predomina no sistema universitário e as relações de seus alunos, embora não há que se descartar a capacidade autodidata do professorado. Mas ela é insuficiente. (Benedito 1995,p.131).

Cada vez está patenteado que o professor tem uma tarefa imprescindível no processo de aprendizado o que significa admitir que enquanto o aluno não aprendeu o professor não ensinou. Uma das condições sine qua non, pode haver aprendizado com qualidade consiste em rever e refazer solidariamente o planejamento superando a prática de receber planos prontos para serem executados.
Quando se fala de docência no ensino superior é necessário ter presente que o processo de aprendizagem traz no seu bojo a resposta a uma das mais intrigantes perguntas que o ser humano se faz: POR QUÊ?  E neste caso porque ensinar, ou porque aprender. Neste sentido é possível se dizer que o processo ultrapassa de longe a sala de aula e o faz na medida em que esta pergunta vai sendo respondida e discutida em quase todas as instâncias das relações sociais.
Certo está que o docente traz no seu fazer de professor uma preocupação com a didática sobre tudo levando em consideração a expansão quantitativa da educação superior que estabelece uma séria concorrência na oferta de ensino. Também sob esta ótica começa a aparecer aquele que é reconhecido como professor globalizado.
O professor que quer se adequar aos novos tempos necessita estar em dia com a tecnologia sem temer ou de fato correr o risco de ser substituído por ela. Esta ameaça, se é que se pode chamar assim estará tanto mais distanciada quanto mais encontrar o professor num constante processo de requalificação para o trabalho.
Neste sentido é preciso reler com olhar não estanque a prerrogativa proposta pela LDBEN 9394 de 1996, à qual prevê que:
A preparação para o exercício do magistério superior far-se-a em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.
Parágrafo único: O notório saber reconhecido por universidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título acadêmico (art. 66).

Esta exigência certamente não é mais do que aquilo que se pode chamar de Formação inicial e por conta desta exigência a disciplina de “formação para o ensino superior” foi inclusa nos projetos dos cursos de pós-graduação, claro que ainda longe de ser suficiente para a demanda à qual se destina.
Os cursos de licenciatura  foram instituídos no Brasil em 1934, com a obrigação reconhecida do estado de oferecer educação para todos em todos os lugares. Em virtude desta necessidade criada pela sociedade o poder instituído se sentiu na obrigatoriedade de oferecer condições adequadas para que o processo fosse realizado. Neste contexto se recupera o conceito de didática aplicado ao mundo grego, segundo o qual a arte da ensinar e aprender se dava numa relação estreita entre professor – aluno, ou o mais velho com o mais jovem.
O método pedagógico dos Jesuítas, também conhecido como “Ratio Studiorum” já aplicou esta técnica no final do século XVII, entretanto estava longe de alcançar a massa sobrante que se constituía na sociedade de outrora por conta do final do Feudalismo e inicio da industrialização. Foi Comênio com sua Didática Magna, quem faz uma das afirmações mais contundentes sobre a necessidade de ampliar o conceito de ensinar.

Processo seguro e excelente de instruir, em todas as comunidades de qualquer reino cristão, cidades, aldeias, escolas tais que toda a juventude de um e de outro sexo sem excetuar ninguém em parte alguma, possa ser formada nos estudos, educada nos bons costumes, impregnada de piedade, e, desta maneira, possa ser nos anos da puberdade, instruída em tudo o que diz respeito à vida presente e à futura, com economia de tempo e de fadiga, com agrado e com solidez. (Comênio, 1985, p. 43).

O método de Comenio propõe uma formação progressiva e ordenada na qual também seja dada atenção aos conteúdos. Sob esta ótica a didática deixa de ser ‘teológica’ isso é submissa à teologia e à igreja, para ser sociológica. Aqui aparece pela primeira vez a relação professor aluno, centrando a preocupação no último, condição que virá a ser reforçada com o movimento da escola nova.
As posições de Comênio constituem o que se pode chamar de primeira revolução pedagógica. No século XVIII temos uma segunda revolução, desta vez patrocinada pela doutrina de Rosseau com o seu novo conceito de infância e a importância que se deve dar ao método, que segundo ele deveria facilitar que a educação fosse um exercício “sem pressa e sem livros” (Castro 1990, p.19).
No século XIX temos a figura de Herbart com a sua pedagogia científica, a qual estabelece passos formais de aprendizagem – o que se pode qualificar de método – o qual tem sua sustentação na preparação da aula. Daí se chegou à escola nova no inicio do século XX, movimento, como já se disse, em que o aluno é o centro e o objetivo da educação é que o aluno aprenda. A pouca clareza do processo que  a escola nova quis estabelecer, somada às resistências do tempo e das outras instituições envolvidas no processo levou a descambar para a culpabilização do educando pelo fracasso escolar.
Esta realidade se deve á compreensão que a escola estava disponível, o professor disponível, o papel foi cumprido se alguém não alcançou o objetivo o problema está naquele que se fez deficitário. A falta de condições dos professores e da escola  não foi uma questão a ser discutida. O papel da docência foi reduzido ao serviço da transmissão de saberes e o professor acabou sendo lido como um indivíduo que nasceu pronto a quem no máximo foi dado depois uma série de informações conteúdisticas.
Ontem como hoje o risco que se corre ao se tratar da formação de docentes é cair na prevalência dos métodos e das técnicas em lugar da compreensão alargada do que seja pedagogia. Esta prática é muito próxima e aparece com sutileza desleal nos cursos técnicos e tecnólogos quanto com facilidade se reduzem à preparação para o mercado de trabalho.
A saída, ou pelo menos a alternativa parece não ser adquirir técnicas para ensinar bem, será importante quebrar os paradigmas ou superar os mitos que a docência em ensino superior se reduza a:
a)    Uma disciplina na grade curricular;
b)    Uma pedagogia restrita à crianças e adolescentes;
c)    Docência restrita ao espaço escolar;
d)   Didática como um corpo curricular de disciplinas.
É certo, como já se afirmou acima que estamos vivendo um complexidade metamorfósica que põe em dúvida todas as verdades absolutas, porque não seria também em relação à didática?
Posto isso é importante considerar que a docência no ensino superior deva levar em conta que o ensino se modifica na relação e por isso mesmo tem uma estreita dependência do contexto em que está inserido e por isso não poder ser regrado no sentido de permanecer engessado. (História do homem que viajou...).
Quando se fala em didática, ou metodologia do ensino superior será necessário compreender que se trata de todo o funcionamento do processo e não pode ser reduzido a meras técnicas de ensinagem. O ensino é um processo complexo imerso na complexidade.
Pois bem se a escola é um ser social e inserido no mundo maior das relações não se pode pensar a docência fora ou desligada da prática social, isto implica reconhecer que o ensinar e  aprender tem sempre uma perspectiva pública.
Pelo menos nove indicativos são necessários na arte da docência quando se pensa a didática e a pedagogia para além dela mesma:
1)                 A didática vista sob o ângulo epistemológico – abertas às distintas abordagens (crítica, histórica, sociológica, psicológica, e das práticas educativas).Esta visão facilitará aos professores a busca de respostas a questionamentos sobre distintas áreas que antes se quer eram considerados.
2)                 Didática como docência e pesquisa – o professor se faz fazendo, assim pensava Comênio, porém o que não é adequado seria reduzir o “fazendo” a simples atividade do “agir” do professor sem considerar a pesquisa como uma das partes do trabalho do professor.
3)                 Espaço para outras teorias – no ensinar – aprender será sempre uma relação muito estreita e de contribuição com as  diversas ciências.
4)                 Didática é mais do que metodologias de ensino, é relação comunicacional que conduz para a produção do conhecimento o qual se da sob a ótica emancipatória.
5)                  Supõe que os resultados de ensino se deem no contexto das políticas educacionais com amplo conhecimento da educação em todas as suas relações.
6)                 A avaliação antes de ser excludente será inclusiva, na medida em que se realiza mediante novas propostas de avaliação.
7)                 O professor se faz fazendo-se num constante processo de acrisolamento face às exigências da formação continuada que o transformam num professor reflexivo.
8)                 Entre ensinar e aprender se estabelece uma relação que é muito maior do que o conhecimento dos conteúdos, mas que consiste em aprender a aprender.
9)                 Inclusão de novas formas de produção do saber que vão sendo mensuradas na relação com outras áreas do conhecimento.
Estes indicativos são o que se pode chamar de multirreferencialidade na medida em que alargam a prática e a teoria estabelecendo entre ambas uma relação de complementariedade.

Daí que será importante estabelecer uma análise da escola e da cultura escolar que se apresenta, como já se disse, “presentista, conformista, conservadora de hábitos, de ideias e de valores legitimados pela cultura dominante” (Perez-Gomez, 1995, p340).
Tanto quanto a escola for capaz de superar este paradigma ela será também capaz superar a visão estreita do conceito dado á didática como normas e regras de ensinagem e transmissão de informações. “O alargamento intencional da compreensão do processo de se construir continuamente como professor, do processo coletivo e do aluno como parceiro é elemento essencial à reflexão  dos docentes”(Pimenta 2002, p 58).
Feitas estas considerações é possível compreender com melhor clareza que o papel da didática na docência é muito mais do que normatizar o fazer do professor indo na direção da disponibilização de conhecimentos pedagógicos. Esta realidade terá em alta estima a relação professor aluno, como já se disse na condição de parceiros.
Um dos desafios sobre o qual está clara a nossa exposição consiste ‘desconfundir’ o reduzido conceito de que didática se limita a técnicas de transmissão de conhecimento.
A arte da docência no ensino superior terá em alta estima e com bastante clareza a compreensão de didática como umas das disciplinas que se ocupa da educação desde o seu ponto de vista das relações e dos contextos em que ela está inserida.
Quanto mais clara for a compreensão de que ser professor no ensino superior é uma condição de identidade e não de detenção dos saberes mais será possível compreender que
A educação está presente em casa, na rua, na igreja, nas mídias em geral e todos nos envolvemos com ela, seja para aprender, para ensinar e para aprender a ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para coviver todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias, não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é único lugar em que ela acontece; o ensino escolar não é a única prática, e o professor profissional não é o seu único praticante.

Deste modo é claro que as ações pedagógicas estão no cotidiano e superam os limites tecnicistas ou meramente tecnológicos. A pedagogia diz respeito muito mais do que as aspectos metodológicos Ela é um campo de conhecimentos sobre a problemática educativa na sua totalidade e historicidade e, ao mesmo tempo, uma diretriz orientadora da ação educativa. O Pedagógico refere-se a finalidade da ação educativa, implicando objetivos sociopolíticos a partir dos quais se estabelecem formas organizativas e metodológicas da ação educativa.

Neste sentido a pedagogia pode ser entendida como ciência que se faz sobre a atividade transformadora renovando-se na teoria e na prática. Assim a finalidade da didática consiste em transformar a educação em conteúdo formativo o que possibilita tornar agradável o ato de ensinar. Quando isso acontece o aluno passa a ser o sujeito do processo fazendo parte deste modo crítico de desenvolver a prática educativa.

Desde o alargamento dos conceitos supracitados é possível conceber e experimentar algumas tendências no processo das metodologias do ensino superior:
1)                 Substituição dos conteúdos técnicos por fundamentos históricos e sociológicos;
2)                 Programa de análise das diferentes concepções ideológicas;
3)                 Abordagem cultural, reflexão sobre temas e problemas;
4)                 As novas maneiras de ensinar estão ligadas ás novas maneiras de aprender;
5)                 Sala de aula é apenas um objeto a mais no processo que é muito mais amplo.

Por causa desta compreensão também fica compreensível a posição de Pimenta 2002:
Em nosso entendimento, nos processos de formação de professores, é preciso considerar a importância dos saberes das áreas de conhecimento (ninguém ensina o que não sabe), dos saberes pedagógicos (pois o ensino é uma prática educativa que tem diferentes e diversas direções de sentido na formação do humano), dos saberes didáticos (que tratam da articulação da teoria da educação e da teoria de ensino para ensinar nas situações contextualizadas), dos saberes da experiência do sujeito professor (que dizem do modo como nos apropriamos do ser professor em nossa vida). (p 71).

Cada vez fica mais claro o conceito que a docência no ensino superior consiste num dueto inseparável entre ser e fazer que aos poucos colabore na  construção da identidade na significação social da profissão. Entre os instrumentos importantes, naturalmente, está a escola que pode ser compreendida como medianeira deste relacionamento entre aprendizagem, ensinagem, conhecimento.
Cada professor traz dentro de si o que se pode chamar de professores marcantes e na medida em que cresce a sua condição docente passa do professor que vê (viu)para o professor que é ou que quer ser e será. Para isso não basta obviamente a experiência, mas esta é um elemento importante.
O professor que cada um quer ser e será requer igualmente a 

Preparação científica técnica e social. De modo que a finalidade da educação escolar na sociedade tecnológica, multimídia e globalizada, é possibilitar que os alunos trabalhem os conhecimentos científicos e tecnológicos desenvolvendo habilidades para operá-los, revê-los e reconstruí-los com sabedoria. (PIMENTA 2002, p 81).

A arte de educar consiste então cada vez mais na capacidade de integrar os conhecimentos ao contexto e construir saberes a partir das necessidades por isso é importante conhecer a pedagogia como instrumento para realizar as análises que contribuirão para a reconstrução cotidiana da identidade docente.
O docência no ensino superior, na medida em que se estabelece como processo de ser e fazer permite ao docente ser muito mais do que executor de decisões alheias sendo também este  um dos saberes do ser professor:

(...) apresentadores do mundo, agentes da transformação pessoal, responsáveis por encaminhamentos significativos, por revelações, por descobertas decisivas, por ser paradigmas, por momentos importantes. Suas significâncias éticas, suas exigências e expectativas, sua compreensão do real interesse de cada aluno depoente permeiam todos os parágrafos. (Castanho 2001, p.155).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, Coleção Primeiros Passos, 28o ed., 1993.
CASTANHO, Sergio e CASTANHO, Maria Eugênia. Temas e textos em metodologia do ensino superior, Campinas, Papirus, 2001.
CASTRO, Amélia A. A trajetória histórica da didática. Idéias, São Paulo: Fundação para o desenvolvimento da educação, n° 11, p17-27,1991.
COMENIO, João Amós. Didática Magna: tratado da arte de ensinar tudo a todos. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1985.
PIMENTA, Selma Garrido e ANASTASIOU, Léa das Graças Camargo. Docência no ensino superior, São  Paulo, Cortez, 2002.

HOMILIA PARA O DIA 03 DE OUTUBRO DE 2010

27° DOMINGO DO TEMPO COMUM
Leituras: Habacuc 1, 2-3;2,2-4; Salmo 94
 2Timóteo 1,6-8.13-14; Lucas 17,5-10.
Hoje é uma data histórica para o povo Brasileiro. O processo eleitoral que culmina com a escolha dos novos governantes para o próximo quadriênio nos colocou diante de inúmeras e diferentes escolhas. Se tivéssemos que responder por que voto neste ou naquele candidato, muitos de nós iríamos dizer: “Porque tenho fé que ele será o melhor para o cargo pretendido”. Mas o que significa mesmo ter fé? Quais as implicações que a fé exige de nós? A história está repleta de testemunhos de fé e modelos a quem podemos imitar.  Dentre eles a figura de Maria, mãe de Jesus. Seu estilo de vida, sua coragem e determinação, os exemplos de piedade, a doutrina da Igreja ao longo dos séculos, tudo nos aponta para uma pessoa de Fé.
As leituras deste domingo nos ajudam melhor compreender o significado deste sentimento que muitas vezes manifestamos sem, no entanto, ter suficiente clareza sobre suas implicações no nosso dia a dia. Assim a primeira leitura descreve um tempo de sofrimento e provações e a resposta do Senhor não poderia ser outra tudo “tende para um desfecho e não falhará; se demorar espera, pois ele virá com certeza e não tardará”. São Paulo recomenda “caríssimo, exorto a reavivar a  chama do dom de Deus que recebeste, pois ele nos deu um espírito de fortaleza”. Tal é a força da fé que Jesus usa uma comparação impossível de acontecer: “se tiveres fé como um grão de mostarda até no meio do mar a figueira pode dar frutos”, isto é o mesmo que dizer: até o impossível vai acontecer!.
Como lição destas leituras podemos concluir que cultivar a Fé significa total liberdade diante das escolhas fundamentais que fazemos, coragem para levá-las adiante por mais difíceis que elas possam parecer, ou por maiores que forem as exigências que se apresentarem ao longo do tempo. A fé é um processo de amadurecimento e isto é muito diferente do que apostar nisso ou naquilo e até mesmo fazer novenas, promessas, dar esmolas como que numa espécie de troca de favores com Deus.
Para quem tem fé a primeira atitude certamente será de agradecimento, por meio dela já podemos experimentar um sem número de realizações, de graça sobre graça, por ela entendemos que nunca estamos numa estrada como aventureiros, mas sempre acompanhados e fortalecidos pelo Espírito daquele que nos consagrou desde o batismo. A Eucaristia que celebramos, neste encontro fraterno, não realiza em nós um passe de mágica, mas nos encaminha para a compreensão e realização do Dom de Deus que há em nos.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

NOTAS PARA ESTUDO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA
Campus de Joaçaba - Curso de Artes Cênicas
Componente Curricular: história da Educação
Educador: Professor Elcio Alberton


“Professor não é quem ensina, mas quem de repente aprende”. João Guimarães Rosa/ Grande Sertão: Veredas


HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

1.                Introdução
A história da Educação e da ciência da educação encontra sua justificativa na medida em que a questão é posta sob o ponto de vista da mística e da cultura. Assim mesmo a história da educação e da ciência da educação deve ser colocada também sob a ótica sociológica.
A estrutura científica da exposição histórico pedagógica precisa contemplar tanto o contemporâneo quanto o pedagógico. E neste sentido a história da educação está impregnada da história da pedagogia na sua íntima relação com a ciência e a arte de educar.
O valor da história da educação e da ciência mantém estreita relação com os problemas que se apresentam ao longo da prática pedagógica.  A ciência sistemática da educação, além de examinar as questões pedagógicas do passado, confirma as ideias em questão e recebe preciosas indicações para detectar novos problemas e novas soluções.
Esta relação é o que se pode chamar de Filosofia da Educação, no sentido que a pedagogia histórica pressupõe pontos de vista e critérios para apreciar o que seja mais importante ao longo do tempo. Desta afirmação se pode deduzir também que as investigações histórico-pedagógica perseguem o desenvolvimento da ciência sistemática da educação.
Pensar o passado não é mera questão saudosista, nem tampouco mera curiosidade. O ontem não está morto, no sentido que nele estão as raízes do presente e é sob esta ótica que a história da educação merece ser estudada.
Para estudar história há que se levar em conta pelo menos dois modos de estudá-la. Um primeiro vista sob a ótica cronológica, linear da sucessão dos fatos, uma segunda que se pode chamar de história crítica, a qual consiste em ver os fatos na sua relação com o contexto no qual se sucederam. Como disse Eduardo Galeano: “A história é um profeta com olhar voltado para trás: pelo que foi e contra o que foi, anuncia o que será”.
Desse modo, estudar história implica em recontar mais do que os fatos, mas consiste em recontá-los à luz dos envolvimentos que cada fato se via envolto. No que se refere especificamente á história da educação é preciso ter presente que esta prática somente foi algo trabalhado de modo sistemático a partir do século XIX.
2.                A disciplina de História da Educação
Enquanto matéria a ser aprendida trata de facilitar o conhecimento dentro do âmbito da história especialmente das ideias e resultados pedagógicos, das organizações, leis e decretos que regulam a teoria e arte de educar. Quem obviamente tem a responsabilidade de empreender este caminho são as escolas e universidades.
Por outro lado os escritos pedagógicos de cada época merecem ser estudados também como complemento dos costumes educativos. Eles transpassam as fronteiras estreitas da pátria sendo influenciadas pelas diversas culturas e tempos.
As particularidades de cada tempo e cada cultura muito têm a ver com o modo de educar na própria cultura, na época e nos tempos e culturas posteriores. Assim, por exemplo, não se pode tratar da história da educação sem levar em conta a concepção cristã-católica do mundo ocidental com sua força simbólica nos dois últimos milênios da história da humanidade. Por outro lado não se pode estudar a educação no tempo sem levar em conta a história Greco-romana na relação com o saber e a ciência.

3.                Sociedades Tribais, Gregos e Romanos
Nas sociedades tribais, o aprendizado normalmente se dá e seu deu ao longo do tempo pela imitação dos gestos e atividades desenvolvidas pelos adultos. Esses por sua vez transmitiam seus saberes á descendência. Émile Durkhein, um dos principais sociólogos da educação, explica isto da seguinte maneira:

“Sob o regime tribal, a característica essencial da educação reside no fato de ser difusa e administrada indistintamente por todos os elementos do clã. Não há mestres determinados, nem inspetores especiais para a formação da juventude: esses papéis são desempenhados por todos os anciãos e pelo conjunto das gerações anteriores” (Brandão 1993 página 18).  

De modo muito claro esta é a prática das sociedades orientais monoteístas, incluindo aí o judaísmo primitivo e depois o Cristianismo. Na atualidade isso ainda acontece de modo explícito nas tribos indígenas por todos os continentes.
No Egito Antigo, o faraó, na condição de supremo sacerdote, filho do deus sol, era aquém detinha o saber e o conhecimento e estes ele passava a quem julgasse apto recebê-los. Isso implica na compreensão, se é que se pode falar de uma história da educação, que neste contexto a educação era uma reserva para poucos.
Foi com o surgimento da escrita, por volta de 4.000 A.C  que se pode dizer que os saberes ganharam o domínio público. Mesmo assim os hieróglifos, ou escrita pictográfica era restrita a pequenos grupos. Composta por cerca de 600 sinais era algo difícil de ser utilizado. Os egípcios usavam também madeira e papiro além dos escritos nas pedras, todavia, as inscrições tinham ainda o objetivo restrito de marcar e/ou identificar alguma situação ou lugar.
A popularização do saber, se é que pode se fazer essa afirmação, somente acontece mesmo com a invenção do alfabeto, ou seja, quando os sinais ganham sons que os identifiquem, isso acontece por volta de 1.500 A.C, daí que eles são reduzidos a pouco mais de 20 caracteres com pequenas variações. A cultura fenícia, que aproveitou a sua condição de bons navegadores, foi sem sombra de dúvida a principal responsável pelo avanço desse projeto.
Do mundo fenício o alfabeto fonográfico adentrou o mundo grego depois o império romano alcançando os nossos dias. Entretanto, nas civilizações orientais não se tem noticias que a educação tenha tido importância para além da compreensão dos livros sagrados e o enquadramento das pessoas nos sistemas religiosos e morais.
Desde muito cedo, por mais que a instrução fosse uma busca mais intensa, continuava estando ao alcance de umas poucas pessoas nascidas nas castas ditas superiores das sociedades.
Assim temos nos registros históricos, escolas egípcias que funcionavam juntos aos templos e em algumas casas. Neste ambiente predominava o processo de memorização – decorar – com o consequente uso dos castigos físicos. Isso não é sinônimo de dizer que a sociedade egípcia não tivesse alto nível cultural.
Os babilônicos tiveram em alta estima a casta sacerdotal a qual dominava a escrita cuneiforme cuja tarefa primordial consistia em copiar os textos religiosos. Estes detinham grandes bibliotecas e conheciam bastante bem a astrologia sem se descuidar de sabedoria prática, ao passo que os estudos científicos eram ofuscados pela prática da magia e adivinhação.
Na índia o saber também restrito ao mundo do sobrenatural e sua relação com o transcendente, tem maior importância para nossa cultura uma vez que sua religiosidade alcança os nossos tempos. A sabedoria Hindu tem sua inspiração nos livros sagrados dos quais o mais antigo é o RIG-VEDA[1]. Segundo estes os acontecimentos são manifestações das vontades dos Brahman ou essência de todas as coisas. Aí também as populações eram divididas em castas ou categorias a quem era permitido ter acesso aos distintos saberes. Da índia temos ainda os saberes budistas os quais valorizam muito a relação entre mestre e discípulo sendo ela de caráter basicamente espiritual.
A China cujo cerne cultural só recentemente foi aberto para o mundo  teve também na educação seu caráter conservador e voltado quase exclusivamente com a finalidade de transmitir a sabedoria dos livros clássicos embora refinada ao gosto dos sábios de outrora.  De grande importância nesta cultura foram os denominados livros canônicos cuja finalidade como o próprio nome indica, era mostrar um caminho. De qualquer modo há que se compreender que a finalidade da educação mantinha ainda o caráter de influenciar os comportamentos morais, sobretudo dos mais jovens seguindo sempre uma rigorosa e dogmática disciplina que tinha por base as técnicas de memorização.
O nomadismo Hebraico, cuja relato mais clássico se encontra na bíblia, não tinha outro lugar para a educação se não as sinagogas e a finalidade última da instrução era conhecer os preceitos religiosos, ou a vontade de Javé. Os documentos bíblicos, chamados manuscritos de Qunran[2], tem inestimável valor histórico no sentido que nos ajudam a compreender as raízes judaico-cristãs da nossa civilização. Dentre as ideias chaves da educação hebraica é importante destacar a importância dada ao conhecimento da lei. Basta ver o valor dos preceitos para o mundo judaico e as constantes disputas empreendidas pelos sábios na interpretação das escrituras com as posições de Jesus de Nazaré. Muitas das práticas legais de outrora continuam em plena vigência por grupos judaicos mais conservadores ainda na atualidade.
Da cultura oriental antiga passamos para o mundo grego e as primeiras civilizações europeias para onde vieram os costumes daqueles povos. Por volta do século V A.C. a região da Ásia Menor conheceu o apogeu da civilização com alta produção literária e filosófica à qual o mundo ocidental recebeu como herança.
No que concerne à política a Grécia antiga mostrou para o mundo o primeiro modelo de democracia, no sentido mesmo da palavra. Neste contexto os cidadãos se reuniam em assembleia na Polis, onde discutiam e tomavam as decisões que julgassem mais adequadas para o seu desenvolvimento. Não se pode desconsiderar o fato de ser uma democracia excludente, no sentido que dela participavam apenas os homens livres, o que significava dizer que não tinham direito as mulheres, as crianças, os jovens, os escravos feitos prisioneiros de guerra. Apenas aos cidadãos era dado o direito de viver no “ócio”, que consistia precisamente na dedicação ao estudo, à pesquisa, à filosofia, os demais deviam se ocupar do “negócio”. Este último consiste exatamente na dedicação ao trabalho. Esta constatação permite compreender que de qualquer modo a arte do saber sempre dependeu de outros que exerçam trabalhos braçais para que a primeira possa acontecer.
A Grécia antiga, embora gozasse de grande prestígio diante de todos os povos, nunca se constituiu numa nação propriamente dita. As diversas cidades estado, com grande frequência, se viam em disputas e rivalidades, em outros momentos  se uniam quando se tratava de defesa contra uma ameaça externa. Finalmente na famosa guerra entre espartanos e atenienses o imperador macedônico aproveita a fragilidade de ambas dominando-as e pouco depois estendendo seu poderio por toda a Ásia e África.
É do mundo grego que nos vem as primeiras e mais abalizadas explicações racionais dando inicio a nova forma de conhecimento não mais baseada em mitos e na religiosidade, mas agora no uso da razão. É também aí que encontramos as primeiras informações sobre um modo de aprender que tem início na infância. Surge o vocábulo PAIDÉIA, (paidós) inicialmente significando a arte de criar meninos, mais tarde o termo ganhou cidadania sendo compreendido como o conjunto de possibilidades para dominar os saberes. A Grécia pode ser considerada então o berço da pedagogia, no sentido mesmo de PAIDOGOGOS, aquele que conduz a criança.
Apesar de toda esta evolução ainda há que se compreender que a educação tinha uns poucos objetivos como também poucos destinatários. Merecem ser destacados os jovens de determinadas classes e com capacidade física para a guerra. Os cuidados com o corpo não tinham na ocasião nenhuma preocupação com a saúde ou a beleza propriamente, mas a condição de torná-los fortes e aptos para a guerra, desta condição surgiu o ideal de beleza grego.
A iniciação aos jogos que se dava sob a orientação do pedótriba, era reservada aos meninos, uma vez que as meninas permaneciam nas casas onde aprendiam os afazeres domésticos.
Até os 13 anos se dava um processo básico de educação no qual a grande maioria tinha acesso, a partir daí os mais pobres deveriam sair em busca de algum oficio, os mais abastados tinham o privilégio de continuar estudando, agora com dedicação às artes, à música, ao esporte, à geometria, astronomia e à filosofia. Com a aproximação da maioridade a educação ganha a dimensão cívica e de preparo militar.
Tudo isso não foi o bastante, aos poucos a civilização grega foi percebendo que não bastava o saber lutar, mas que as mudanças exigiam capacidade de convencimento pela palavra. Esta constatação mostra com clareza que a educação formal atendia os filhos das elites, num claro processo de exclusão, como se lê em Brandão 1993:

“As crianças devem, antes de tudo, aprender a nadar e a ler; em seguida, os pobres devem exercitar-se na agricultura ou em uma indústria qualquer, ao passo que os ricos devem se preocupar com a música e a equitação, e entregar-se à filosofia, à caça e à frequência aos ginásios” (p.40). A respeito desta concepção, Xenofonte, um historiador, poeta e filósofo militar grego, criticaria quase dois séculos depois ao afirmar: “Só os que podem criar seus filhos para não fazerem nada é que os enviam à escola; os que não podem, não enviam.” (p.40)

Com a queda das cidades estados gregos e sua incorporação pelas culturas macedônicas se dá igualmente uma junção de civilizações e o que era restrito a algumas faixas etárias ganha outras dimensões o ensino passa da Paidéia para a enciclopédico, tornando-se uma profissão. O primeiro a aparecer é o mestre em retórica, auxiliado pelos funcionários responsáveis pela organização dos documentos bem como pela realização das cópias. Com as constantes invasões e domínios estrangeiros muito desta história foi perdida e finalmente a concepção a respeito da valorização do corpo e do ideal de beleza perdeu-se completamente com o advento da cultura cristã ocidental que apresentou o corpo como empecilho para a vida espiritual, criando um dualismo não claramente compreendido até os nossos dias.
Com o advento do império romano, por volta do segundo século A.C. surge de modo definitivo o modelo urbano vigente até nossos dias (Urbs – cidade), e nela a divisão das classes constituída de Patrícios e Plebeus, estes últimos também homens livres, mas dedicados ao comércio e outros afazeres. No seu interior se encontram os chamados clientes que dependiam dos primeiros para as necessidades mais básicas constituindo-se aos poucos em braço escravo.
O poder do império romano durou até o quarto século depois de Cristo, tendo no seu interior distintas classes e privilégios. Não foram poucas as guerras e lutas internas pela disputa do poder, os escravos (prisioneiros políticos) experimentaram seu pior tempo e as mais duras labutas lhes eram confiadas. Os povos dominados eram reduzidos quase á condição de escravos devendo contribuir com altos impostos e sendo governados por súditos, algumas vezes membros do seu próprio povo, mas alinhados com o poder de Roma. Exemplo clássico são os relatos cristãos da comunidade de Jerusalém. Jesus Cristo, a rigor não foi condenado pelos Judeus, mas pelo poder de Roma, uma vez que arrebanhava seguidores entre as classes subalternas tornando-se um perigo para o regime instituído. Mais tarde com a chamada Pax Romana, o cristianismo se torna a religião oficial do estado e enquanto este dá sinais visíveis de desmantelamento da máquina burocrática a Igreja aparece como elemento de unidade e de certo modo sustentação do regime.
A pedagogia Romana tem alguns traços comuns com o mundo grego no sentido que também aqui o trabalho manual é desvalorizado enquanto o intelectual se constitui num privilégio da aristocracia que pode desfrutar do ócio. Por sua vez os educadores buscam formar o homem racional, porém, não ao modelo da filosofia grega. Enquanto lá a vertente filosófica conduzia à reflexão e ao questionamento aqui ela ganha uma conotação mais moralista, pragmática, voltada para o cotidiano prevalecendo a retórica sobre a filosofia propriamente dita. O Império Romano prima pela unidade política e união dos vários povos enquanto a Grécia se constituiu sempre nas chamadas cidades estados. Desta concepção surge o conceito de humanidade em equivalência à Paidéia, porém esta muito mais universal no sentido que não se restringe precisamente à educação, mas a formação do homem virtuoso. Aos poucos este ideal restringiu-se ao estudo das letras descuidando-se da ciência como tal.

4.     Do Cristianismo primitivo à Idade Média
A antiguidade cristã deu poucas e escassas contribuições para a história da educação, entretanto elas são preciosas para o desenvolvimento posterior. A história da educação na idade média pode ser  entendida a partir da sua excessiva preocupação com as questões ético religiosas. Toda a questão do conhecimento experimentou uma clara subordinação do mundo terreno ao sobrenatural, submissão moral dos seres humanos o claro contraste entre pobres e ricos, escravos e senhores, judeus, gregos e bárbaros parecia estar envolto na superior vontade de Cristo, isto é que todos fossem irmãos.
A clássica expressão de Santo Agostinho:

“Dois amores construíram duas cidades: o amor de si levado até o desprezo de Deus edificou a cidade terrestre, civitas terrena; o amor de Deus levado até o desprezo de si próprio ergue a cidade celeste; uma rende glória a si, a outra ao Senhor; uma busca uma glória vinda dos homens; para a outra, Deus, testemunha da consciência é a maior glória”

Manifesta a convicção que os cristãos tinham da importância da doutrina e do domínio cultural e intelectual da Igreja em florescimento crescente ao lado do império decadente. Os mosteiros se mantiveram e garantiram para a história um legado educacional com abundante fundamentação política, jurídica, moral, social e até econômica. Neste particular vale a leitura do Best seller da atualidade: “A sabedoria dos monges na arte de liderar pessoas”.
Do ponto de vista restrito da pedagogia há que se considerar que os monges, chamados copistas, ao enriquecer as bibliotecas com abundantes traduções de textos da literatura grega, também adaptaram o pensamento à concepção cristã da vida tendo como ponto de partida a autoridade divina à qual se aceita a partir da fé.
Os chamados padres da Igreja dedicaram toda a sua obra à defesa da fé com o expresso intuito de harmonizá-la com a razão de modo a compreender a natureza de Deus, da alma e dos valores morais. Na sequencia destes temos os chamados enciclopedistas cuja função foi estabelecer parâmetros de interpretação das verdades à luz da fé. Toda a influência da Igreja culmina com a Escolástica, modelo de escola na qual se ensina a filosofia e o homem é apresentado na condição de criatura divina, de passagem por esta terra cuja preocupação primeira será a salvação da alma incumbência que melhor seria desenvolvida com a ajuda dos mestres da Igreja. Desde o conceito que todo o saber tem uma dependência intrínseca da fé, a filosofia é chamada de serva da teologia.
Dentre os expoentes do período não se pode deixar de nominar também Santo Tomás de Aquino para quem Deus é o divino ordenador do mundo.

Da eternidade e necessidade do pensamento divino deriva a eternidade e necessidade do mundo e de tudo o que existe sobre a terra. Por isso, conhecer a ordem do todo é conhecer a ordem da parte e conhecer a ordem da parte é conhecer a ordem do todo, e sobretudo há conhecimento possível independente de Deus, é possível a verdade fora da revelação. Tudo é capaz de ser conhecido pelo homem, desde que tenha método, porque tudo está formatado na mesma chave racional, tudo tem um sentido holístico, nada sobra e nada é por acaso, assim como tudo tem uma finalidade predeterminada e não pode ser utilizada de qualquer maneira. Dirá Tomás de Aquino (1225-1274): Todo agente tem alguma intenção ou desejo de finalidade. E a todo desejo de finalidade precede algum conhecimento, que coloque diante de si a finalidade e dirija os meios ao fim. Assim como a flecha tende ao alvo pela direção que lhe imprime quem a lança, assim é o caso de todos os seres que obram por necessidade natural: sua operação está determinada pelo entendimento criador da natureza; por isso diz o filósofo (2 Phys. Text 75) que a obra da natureza é uma obra da inteligência. (Tomás de Aquino, Comentários às Sentenças de Pedro Lombardo. Distinção XXXV Questão 1 art 1.)

Somente no final da idade média  com o advento do iluminismo a hegemonia da Igreja fica ameaçada e o gosto pela razão se torna evidente. As universidades que haviam surgido como simples assembleias corporativas ganham credibilidade entre os intelectuais iluministas de quem partem críticas contundentes ao modo de ensinar aplicado pela escolástica. A chamada corrente pedagógica realista exerce forte influência sobre a filosofia aristotélico tomista. Além do método recebia crítica também a prática de ensinar tendo como língua oficial o Latim sobre o que diziam alguns estudiosos: “é preferível que os alunos aprendam a falar bem a sua língua antes de aprender muitas coisas em outro idioma”. Conceito que vai aparecer muito mais claro com a reforma luterana.
Na medida em que a Universidade ganha status de espaço da ciência e da cultura cresce também a complexidade estrutural e institucional. A primeira que se tem notícia está situada na região de Salerno, sul da Itália cuja fundação antecede o século X e nela é oferecido o curso de medicina, por volta do século XII temos a primeira universidade de teologia em Paris e depois a de Direito em Bolonha. Aos poucos estas instituições vão se pulverizando e o seu controle passa a ser disputado pelos reis e pela Igreja.
Nem precisa dizer que ainda neste período, por mais que a educação estivesse em ampla ascensão e expansão continuava restrita às classes dominantes e com objetivo de reforçar a posição de uns sobre outros. Mesmo com a mudança sofrida por conta da reforma religiosa a educação continua tendo clara distinção entre a que era oferecida às camadas trabalhadoras a quem era dada oportunidade de acesso a educação elementar e a que era disponibilizada para as classes mais abastadas. Nos escritos luteranos não faltam constatações a este respeito e se nos detivéssemos nas correntes pedagógicas de outrora poderíamos constatar essa realidade em toda a sua extensão. Basta citar aqui Comenius e a sua Didática Magna e depois em Arte de ensinar tudo a todos totalmente.
Em resposta ao protestantismo a Igreja Católica incentiva a criação de ordens religiosas dedicadas ao ensino, de onde temos os Jesuítas responsáveis primeiros pela educação no Brasil, cujo estudo será nossa meta nos próximos encontros.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação. São Paulo, moderna, 1996.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, Coleção Primeiros Passos, 28o ed., 1993.
MANACORDA, Mario Alighiero. História da Educação. São Paulo, Cortez, 2002.
SARTO, Luiz Sanches, Dicionário de Pedagogia. Rio de Janeiro, labor, 1936.


[1] Livro dos Hinos, é o Primeiro Veda e é, com certeza, o mais importante veda, pois todos os outros derivaram dele. Rig Veda é o Veda mais antigo e, ao mesmo tempo, o documento mais antigo da literatura hindu, composto de hinos, rituais e oferendas às divindades. Possui 1.028 hinos, sendo que a maioria se refere a oferendas de sacrifícios, algumas sem relação com o culto. Independentemente do valor interno, o Primeiro Veda é valiosíssimo pela sua antiguidade
[2] Khirbet Qumran, “ruína da mancha cinzenta”, é um sítio arqueológico localizado a uma milha da margem noroeste do Mar Morto, a 12 km de Jericó e a cerca de 22 quilômetros a leste de Jerusalém, em Israel.