quinta-feira, 27 de agosto de 2020

HOMILIA PARA O DIA 30 DE AGOSTO DE 2020 - 22º COMUM - ANO A

 

SEDUZISTE-ME SENHOR

Provações, dificuldades, contrariedades, desilusão e uma lista infinita de sofrimentos fazem parte do nosso cotidiano. Muitas vezes a gente se empenha de corpo e alma em alguma tarefa ou empreendimento e de repente parece que todos os esforços foram em vão e todas as nossas boas intenções vão por água abaixo. Temos a impressão que estamos sozinhos e com vontade de desistir de tudo e de todos.

Pois é esse o sentimento do profeta Jeremias narrado na primeira leitura: Sentiu o chamado para a profecia desde muito cedo, abraçou a causa e exerceu de modo apaixonado e com todas as suas forças. No texto de hoje ele se descreve como alguém que foi “iludido” por Deus: Seduziste-me, Senhor, e deixei-me seduzir; foste mais forte, tiveste mais poder. Tornei-me alvo de irrisão o dia inteiro, todos zombam de mim. Todas as vezes que falo, levanto a voz, clamando contra a maldade e invocando calamidades; a palavra do Senhor tornou-se para mim fonte de vergonha e de chacota o dia inteiro”.

Sua fala reflete a de alguém desiludido entregue aos insultos e zombaria dos adversários diante dessa realidade está decidido a abandonar tudo: Não quero mais lembrar-me disso nem falar mais em nome dele”.

Entretanto a paixão pela causa a que ele se dedicou, a força do chamado que Deus lhe dirige não lhe permitem que desista das suas boas obras, ainda que estas lhe custem sofrimento e dor: Senti, então, dentro de mim um fogo ardente”.

De alguma maneira, a história de Jeremias é a história de todos aqueles que Deus chama para ser profeta e para isso ter a coragem de enfrentar injustiça, opressão, interesses egoístas. Aceitar a Palavra de Deus e deixar-se seduzir por ele não é um caminho de glórias, de facilidade, de aplausos e triunfos.

Exatamente o que aconteceu com Jeremias se repete muito mais tarde com Jesus. Jesus começou a mostrar a seus discípulos que devia ir à Jerusalém e sofrer muito da parte dos anciãos, dos sumos sacerdotes e dos mestres da Lei.” Jesus tem consciência que sua missão é difícil e exigente, mas com a mesma convicção do profeta não se deixa abater nem tampouco sofrer influências para mudar seus planos. Quando Pedro lhe propõe uma alternativa mais cômoda Ele recusa com firmeza: “Tu és para mim uma pedra de tropeço, porque não pensas as coisas de Deus, mas sim as coisas dos homens!”

E na sequência Jesus dirige um convite provocativo para todos os que sentem a Palavra de Deus arder no seu coração: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, vai encontrá-la. De fato, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua vida? O que poderá alguém dar em troca de sua vida.”

Então, também para os cristãos na atualidade o desafio é desconsiderar as preocupações que os fazem olhar apenas para o seu interior, para as próprias necessidades, vantagens, sonhos e projetos pessoais. Desconsiderar segurança, bem estar, êxito, triunfo, aplausos e fazer de sua existência um dom generoso às pessoas e a Deus.

O verdadeiro discípulo de Jesus é capaz de agir como recomenda São Paulo na segunda leitura: Não vos conformeis com o mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de pensar e de julgar, para que possais distinguir o que é da vontade de Deus, isto é, o que é bom, o que lhe agrada, o que é perfeito”.

Rezemos para que nossa vida seja verdadeiramente dedicada ao serviço da vida cuidando das pessoas e da nossa casa comum.

 

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

HOMILIA PARA O DIA 23 DE AGOSTO DE 2020 - 21º COMUM - ANO A

 

COMPLETAI EM MIM A OBRA COMEÇADA

O Salmo que rezamos neste domingo é uma espécie de agradecimento pela ação de Deus no mundo que se realiza na história e por meio das pessoas em todos os tempos: Ó Senhor, de coração eu vos dou graças, porque ouvistes as palavras dos meus lábios! Eu agradeço vosso amor, vossa verdade, porque fizestes muito mais que prometestes; naquele dia em que gritei, vós me escutastes e aumentastes o vigor da minha alma. Ó Senhor, vossa bondade é para sempre! Eu vos peço: não deixeis inacabada, esta obra que fizeram vossas mãos”.

A obra começada por Deus não é outra senão a comunidade daqueles que reconhecem Jesus como o seu enviado, aqueles que Pedro, por sua palavra e ação desligou dos pecados e da fragilidade do mundo para ligá-los ao Pai em Jesus Cristo a quem ele declara ser o Filho do Deus Vivo.

A tarefa que Jesus confiou a Pedro, como prêmio e responsabilidade por sua corajosa resposta, é o cerne da missão da Igreja e de todos os que aceitam que Jesus é o enviado do Pai. Todos, indistintamente, são chamados a dar testemunho de tudo o que acreditam sendo capazes de adaptar os ensinamentos de Jesus aos desafios do mundo e de acolher na comunidade todos os que também aguardam a manifestação do Filho de Deus.

Declarar que se aceita Jesus como Messias implica fazer correto uso das chaves, para não correr o risco de perder a confiança como aconteceu com o administrador infiel narrado pelo profeta Isaias na primeira leitura: Eu vou te destituir do posto que ocupas
e demitir-te do teu cargo”.
Ter nas mãos as chaves implica na capacidade de abrir as portas para acolher e cuidar garantindo com solicitude, com amor e justiça o acesso de todos aos bens e serviços que Deus disponibiliza para a humanidade.

Entregar-se confiantes nas mãos de Deus e permitir que o espanto em relação ao mistério transformem as nossas vidas num hino de amor a Deus libertador conforme afirma São Paulo na carta aos romanos é o convite feito para todos: “Na verdade, tudo é dele, por ele, e para ele. A ele, a glória para sempre. Amém!”.

Em resumo, reconhecer quem é Jesus implica compreender o significado que tem a nossa vida na relação com as propostas do Reino e os valores que a pessoa de Jesus Cristo trouxe para a humanidade. À medida que tivermos a coragem de Pedro, poderemos receber o mesmo elogio dado a Pedro: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu”.

 

 

 

 

quinta-feira, 13 de agosto de 2020

HOMILIA PARA O DIA 16 DE AGOSTO DE 2020 - ASSUNÇÃO DE MARIA - ANO A

 

ATÉ QUE CRISTO SE FORME

Esta semana, numa das publicações de redes sociais, vi uma matéria que me inspirou a homilia deste domingo. Na cena o filho proprietário de uma empresa de médio porte, fez um grande e bom negócio. Para a inauguração do evento ele não convidou nenhuma autoridade importante, pelo contrário, chamou sua mãe, mulher agricultora, que recebeu as chaves e abriu as portas do novo empreendimento.

Pois é inspirado nessa imagem que me parece importante celebrar a Solenidade da Assunção de Maria ao Céu. Quem é grande, é rei, vencedor da morte é o Filho de Maria, mas é óbvio que ele não esqueceria aquela que “guardava e meditava todas essas coisas no seu coração”, mesmo quando uma “espada de dor lhe transpassava até a alma”.

Sem muitas delongas, é nesse sentido que a Igreja convida a colocar Maria como Mãe, Modelo e advogada nossa.  A bem da verdade, nós não rezamos para Maria, mas rezamos com Ela por Jesus ao Pai. Ela é nossa advogada e dá sua vida para nos defender, como se lê na leitura do Apocalipse neste domingo: “Então apareceu no céu um grande sinal:
uma mulher vestida de sol, tendo a lua debaixo dos pés e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas. Estava grávida e gritava em dores de parto, atormentada para dar à luz... o Filho foi levado para junto de Deus e do seu trono. A mulher fugiu para o deserto, onde Deus lhe tinha preparado um lugar. Ouvi então uma voz forte no céu, proclamando: Agora se realizou a salvação, a força e a realeza do nosso Deus, e o poder do seu Cristo".

O poder do seu Cristo é o que Paulo descreve na segunda leitura: “Com efeito, por um homem veio a morte e é também por um homem que vem a ressurreição dos mortos... E, quando todas as coisas estiverem submetidas a ele, então o próprio Filho se submeterá àquele que lhe submeteu todas as coisas, para que Deus seja tudo em todos”.

E para que Deus seja tudo em todos, precisamos de muitas Marias, que sejam merecedoras da saudação do Anjo: “Maria Deus está contente com você...” Em resposta, Ela imediatamente colocou os pés na estrada para ajudar a prima Isabel. O resultado não poderia ser outro, senão o reconhecimento público que na figura de Maria se revelava a ação de Deus: “Bem-aventurada Aquela que acreditou, porque será cumprido, o que o Senhor lhe prometeu".

E eis que chega o merecido dia no qual o Filho, junto de Deus e do seu trono, coloca a coroa de 12 estrelas sobre a cabeça da Mãe e simbolicamente sobre os pés daquela que caminhou com ele nesta conquista, toda dor e tristeza do mundo simbolizados na serpente e na escuridão do pecado.

Ontem como hoje todos podem rezar de novo: “A minha alma engrandece o Senhor, e se alegrou o meu espírito em Deus, meu Salvador, pois, ele viu a pequenez de sua serva, eis que agora as gerações hão de chamar-me de bendita. O Poderoso fez por mim maravilhas e Santo é o seu nome! Seu amor, de geração em geração,
chega a todos que o respeitam. Demonstrou o poder de seu braço,
dispersou os orgulhosos. Derrubou os poderosos de seus tronos
e os humildes exaltou. De bens saciou os famintos despediu, sem nada, os ricos. Acolheu Israel, seu servidor, fiel ao seu amor, como havia prometido aos nossos pais, em favor de Abraão e de seus filhos, para sempre".

E proclamar sem medo como rezamos no salmo: “À vossa direita se encontra a rainha, com veste esplendente de ouro de Ofir”.

 

sexta-feira, 7 de agosto de 2020

HOMILIA PARA O DIA 09 DE AGOSTO DE 2020 - 19º COMUM - ANO A

 

O SENHO NOS DARÁ TUDO O QUE É BOM

As palavras e o pensamento do Papa Francisco são repetidos exaustivamente no cotidiano de nossas comunidades. Igreja em saída é uma das expressões muito queridas e que se torna quase banalizada pelo excesso de repetição. O Evangelho deste domingo nos ajuda melhor entender o significado e a importância que a expressão pode ter para o nosso tempo e nosso jeito de ser Igreja.

Jesus ordena que os discípulos se dirijam para o outro lado do mar, nesta travessia a Ele não está fisicamente presente e o grupo é sacudido pelas ondas do mar. Ora, também nossas comunidades, levando em conta a intuição do Papa Francisco, são um barco singrando os mares bravios com todo tipo de tempestade e provação. Mas todos são chamados a ir para o outro lado, ou seja, ir ao encontro daqueles que não fazem parte do nosso grupo, buscar os que estão perdidos e afastados. Mesmo que isso possa machucar a Igreja e desestabilizar o barco que normalmente na veja em ondas tranquilas.

A primeira leitura é um convite para as comunidades reencontrar a origem da sua fé e do seu compromisso. Isso significa enfrentar as tempestades que se abatem violentamente contra essa peregrinação. Note-se o relato que o autor do livro faz sobre o profeta Elias: Naqueles dias, ao chegar a Horeb, o monte de Deus, o profeta Elias, entrou numa gruta, onde passou a noite.E eis que a palavra do Senhor lhe foi dirigida nestes termos:Sai e permanece sobre o monte diante do Senhor, porque o Senhor vai passar'... veio um vento impetuoso e forte... Mas o Senhor não estava no vento. Depois do vento houve um terremoto. Mas o Senhor não estava no terremoto. Passado o terremoto, veio um fogo. Mas o Senhor não estava no fogo. E depois do fogo ouviu-se um murmúrio de uma leve brisa”. Isso significa dizer que Deus se dá a conhecer na simplicidade, na intimidade, na humildade, no silêncio. Deus não precisa de sinais espetaculares, curas, milagres e obras portentosas.

Não perceber o amor de Deus no cotidiano e nas oportunidades singelas da missão é o mesmo que instalar-se numa autossuficiência de quem não quer perceber o ritmo de Deus, nem tampouco descobrir os novos desafios para cada fase da vida.

Na arriscada e difícil travessia ao encontro daqueles que não estão no mesmo barco tanto os discípulos de ontem, como os fieis contemporâneos podem ter a certeza que Deus está com eles e acalma as ondas bravias. Crer na sua presença garante a possibilidade de caminhar em segurança sobre tudo aquilo que causa pânico e medo. A desconfiança de Pedro lhe fez afundar: “Senhor, se és tu, manda-me ir ao teu encontro, caminhando sobre a água.' E Jesus respondeu: 'Vem! Mas, quando sentiu o vento, ficou com medo e começando a afundar, gritou: 'Senhor, salva-me!' Jesus logo estendeu a mão, segurou Pedro, e lhe disse: 'Homem fraco na fé, por que duvidaste?'

Em meio às turbulências do cotidiano, Jesus continua reanimando a todos com as palavras: Coragem! Sou eu. Não tenhais medo”.

O mandato que Jesus deu aos discípulos de outrora se repete e desafia a responder se diante das adversidades do tempo presente estamos dispostos a embarcar para a outra margem ao encontro daqueles que ainda não caminham conosco? Somos desafiados a ir ao encontro daqueles que tem sede de amor e de esperança, de modo que eles percebam na Igreja destes tempos um sinal coerente que os faça acreditar na força transformadora do Reino. A proposta não é solução fácil e na qual se recebe aplausos, antes é desafiador e exige coragem. Que a oração de todos e a Palavra proclamada sejam sustento e alento nos mares revoltos. Que sejamos capazes de levar a sério o que rezamos no salmo: Mostrai-nos, ó Senhor, vossa bondade, e a vossa salvação nos concedei”.