A MINHA ALMA
TEM SEDE DE DEUS!
Conta a história que o rei
Dom João V, teria estabelecido o preço de seis vinténs para uma saca de açúcar.
Valor que foi considerado irrisório pelos produtores da época que nessas circunstâncias
preferiram consumir o açúcar em vez de comercializar. Neste contexto surgiu o
provérbio: “Mais vale um gosto do que
seis vinténs”. Pois é sobre o prazer de fazer alguma atividade, a alegria e
a determinação para realizar tarefas e projetos que trata a Palavra de Deus que
ouvimos nesse domingo.
De outra maneira se pode
dizer que a liturgia faz um convite para experimentar a loucura da cruz, cujo
resultado será sempre a sensação de dever cumprido e de uma vida realizada no
amor e por amor.
Na primeira leitura Jeremias
faz um desabafo referindo-se ao fato de ter sido incompreendido na função de
profeta. Se dependesse dos resultados e da aceitação tudo teria sido em vão.
Ele se apresenta inicialmente como alguém revoltado contra Deus e disposto a
abandonar tudo. Porém, o seu comprometimento e a certeza que ele tem de não
estar trabalhando em vão não lhe permitem “jogar a toalha”, ou “pendurar a
chuteira” como se diz hoje: “Todas
as vezes que falo, levanto a voz, clamando contra a maldade; a
palavra do Senhor tornou-se para mim fonte de vergonha e de chacota o
dia inteiro. Tornei-me alvo de riso o dia inteiro. Não quero mais
lembrar-me disso nem falar mais em nome dele".
Entretanto suas convicções são muito maiores que a revolta: “Seduziste-me, Senhor, e deixei-me seduzir;
foste mais forte, tiveste mais poder”. Esta pode ser também na atualidade
a certeza daqueles que aceitam a proposta e o convite de Deus vivendo com
determinação e coragem os valores do Reino. Para quem se compromete com a
Palavra de Deus verá que o coração arde de paixão pela causa e não se amedronta
de colocar os pés na estrada. Não são as dificuldades que devem nos abater, mas
a coragem que deve nos sustentar quando se trata de superar os percalços que a
vida nos oferece.
Na mesma direção São Paulo
recorda aos cristãos de Roma que entregar-se sem reservas nas mãos de Deus é a
melhor e mais agradável oferenda que uma pessoa pode oferecer àquele que nos
chamou para sair das trevas em direção a uma luz admirável: “Não vos
conformeis com o mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de
pensar e de julgar, para que possais distinguir o que é da vontade de Deus”. Viver em Deus e para Deus é muito mais do que
milhões em ouro e prata, sem ser jocoso: “Mais
vale um gosto do que seis vinténs”!
No Evangelho Jesus dialoga
com os discípulos na mesma direção do profeta e de Paulo: “Jesus começou a mostrar a seus
discípulos que devia ir a Jerusalém e sofrer muito...”
Pedro, que sempre falava em nome de todos, não tinha entendido o anuncio do
mestre e nesse texto age como o demônio descrito em outra passagem sempre querendo
desviar Jesus da missão que havia assumido. Com firmeza Jesus repreende Pedro e
estende o convite a todos: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome
a sua cruz e me siga. Pois, quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la; e quem
perder a sua vida por causa de mim, vai encontrá-la. De fato, que adianta ao
homem ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua vida”. Ontem, como hoje aceitar a proposta do Evangelho
consiste mais em sair de si mesmo, das suas verdades e possibilidades de sucesso
para transformar a sua vida em doação e serviço generoso aos irmãos e irmãs.
Como palavra de conclusão a liturgia de hoje nos faz repetir com Jeremias: “Seduziste-me Senhor e eu me deixei seduzir”.
Ou então vale muito mais fazer aquilo que nos traz realização pessoal do que
abocanhar e acumular muito dinheiro, patrimônio, riquezas e viver em função de
cuidar das coisas em lugar da gente.
Não tenhamos medo de rezar com o salmista:
A minh'alma tem sede de vós,
como a terra sedenta, ó meu Deus!