quarta-feira, 28 de julho de 2021

HOMILIA PARA O DIA 01 DE AGOSTO DE 2021 - 18º COMUM - ANO B

 

MUITO ALÉM DE ALIMENTAR O CORPO

Faz parte das expectativas humanas e sociais contemporâneas o desejo de ver grandes espetáculos e sinais extraordinários como alternativa para satisfazer a curiosidade e muitas vezes para dar credibilidade a determinados fatos. Mas é também verdade que nem sempre os sinais espetaculares provam coisas grandiosas de acordo com o que os olhos veem.

E esse foi exatamente o questionamento feito por Jesus quando as pessoas correram de novo ao seu encontro e lhe pediram sinais fazendo referência ao maná que alimentou a nação de Israel quando atravessava o deserto.

A multidão que o seguia não havia entendido a importância da partilha, da solidariedade, do cuidado, do compromisso com a saciedade. Todos esses sinais que acompanharam a multiplicação dos pães levaram Jesus a fazer um esclarecimento sobre a necessidade do alimento. Sem diminuir a importância do que é perecível Jesus faz ver que é preciso ir muito além despertando-nos para aquilo que verdadeiramente interessa e que humaniza comprometendo-nos com os demais: “Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos. Esforçai-vos não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna”. Apresentando-se como verdadeira comida pede que aceitem os valores nutritivos desse novo e duradouro alimento que implica em saciar as distintas e muitas fomes que a humanidade, em todos os tempos, necessita e que podem ser descritas com as palavras: esperança, solidariedade, comunhão, fraternidade, acolhimento, justiça, paz, respeito, compaixão, cuidado e uma lista infinita de valores que dignificam a pessoa e as relações.

O valor nutritivo desse novo alimento leva as pessoas a viverem os conselhos dados por São Paulo na segunda leitura: “Eis, pois o que eu digo e atesto no Senhor: não continueis a viver como vivem os pagãos,
cuja inteligência os leva para o nada.
Renunciando à vossa existência passada, despojai-vos do homem velho, que se corrompe sob o efeito das paixões enganadoras, e renovai o vosso espírito e a vossa mentalidade. Revesti o homem novo, criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade”
. Ir ao encontro de Jesus implica uma transformação radical na forma de encarar a vida e as relações consigo mesmo, com Deus e com as outras criaturas.

Naturalmente nossa frágil existência nos empurra com facilidade para o velho estilo de vida onde prevalece o orgulho, o pecado, o egoísmo. A graça do batismo que recebemos permite que renovemos cotidianamente nossas escolhas como um trabalho contínuo que exige renovação constante.  

Em todos os tempos, aqueles que encontram Cristo, que escutam seu convite e aceitam sua proposta vão reconstruindo sua vida sob os valores que dele aprenderam e vão deixando diariamente para trás a velha pessoa com os seus costumes e mentalidade. O batismo não pode se resumir num evento folclórico ou simplesmente ritual, mas deve ser compreendido como uma porta que se abre e um compromisso que se firma para percorrer os caminhos de Deus com coerência pela vida a fora até chegarmos a estatura da maturidade de Cristo.

Nossa breve existência terrena é sempre um caminho marcado pela procura de realização, de felicidade verdadeira, temos fome de amor, de transcendência e procuramos mil maneiras para saciar essas fomes e não poucas vezes tropeçamos em nossas próprias buscas e na finitude de nossas respostas. A única forma de saciar nossa fome e dar pleno significado à nossa vida é colocar em prática o que rezamos no salmo:

Tudo aquilo que ouvimos e aprendemos,
e transmitiram para nós os nossos pais,
não haveremos de ocultar a nossos filhos,
mas à nova geração nós contaremos:
As grandezas do Senhor e seu poder.


sábado, 24 de julho de 2021

HOMILIA PARA O DIA 25 DE JULHO DE 2021 - 17º COMUM - ANO B

 

REPARTIR A SACIAR AS NECESSIDADES DE TODOS

A primeira leitura desse domingo tem como pano de fundo a situação em que vivia o povo no tempo do profeta Eliseu cerca de 850 anos antes do nascimento de Jesus. Em nome de relações comerciais, econômicas, políticas e militares os reis de Israel colocaram a sua população exposta a vulnerabilidade multiplicando as injustiças contra os mais fracos e pobres, levando também a multiplicação das infidelidades contra Deus e a aliança. Essa situação se repetiu com muita frequência entre o povo de Israel, sendo uma constante no tempo de Jesus. Convenhamos que também na atualidade em nome da economia, das relações comerciais, da manutenção de algum regime político grandes multidões se tornam vítimas da exploração em que alguns poucos e privilegiados levam vantagem em detrimento do sofrimento de outros e da exclusão de muitos.

Em ambos os casos e em todos os tempos aqueles que são fiéis a Deus e reconhecem sua ação no mundo são chamados a “levantar os olhos para enxergar a multidão que pede para ser saciada das muitas fomes”.

O profeta Eliseu recebeu os pães da oferenda e ordenou sua distribuição: “E Eliseu disse: 'Dá ao povo para que coma'. Mas o seu servo respondeu-lhe: 'Como vou distribuir tão pouco para cem pessoas?' Eliseu disse outra vez: 'Dá ao povo para que coma; pois assim diz o Senhor: 'Comerão e ainda sobrará. O homem distribuiu e ainda sobrou, conforme a palavra do Senhor”. A distribuição ordenada pelo profeta é uma maneira de mostrar a vontade de Deus que sugere erguer os olhos e ir ao encontro das pessoas com gestos de partilha, de comunhão e de generosidade.

A mesma atitude é repetida por Jesus: Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus. Levantando os olhos, e vendo que uma grande multidão estava vindo ao seu encontro. Jesus disse a Filipe: 'Onde vamos comprar pão para que eles possam comer? Disse isso para pô-lo à prova, pois ele mesmo sabia muito bem o que ia fazer”.

A lógica de Jesus é a mesma do profeta: enxergar o sofrimento, ir ao encontro, modificar os conceitos de propriedade e responsabilidade. Fazendo todos se sentar, Jesus sugere a ação de graças por aquilo que possuem e convida todos a partilha. Quando se substitui a ideia de acumular e guardar tudo pensando apenas em si mesmo, e se reconhece as necessidades  de todos o resultado é surpreendente: “Quando todos ficaram satisfeitos, Recolheram os pedaços e encheram doze cestos com as sobras dos cinco pães, deixadas pelos que haviam comido. Vendo o sinal que Jesus tinha realizado, aqueles homens exclamavam: 'Este é verdadeiramente o Profeta, aquele que deve vir ao mundo”.

A provocação que Jesus faz aos discípulos é repetida hoje a nós: todos somos convidados a libertar as pessoas das misérias e necessidades contemporâneas, a nos despirmos do egoísmo e assumir a lógica do serviço que facilite às pessoas passar da escravidão para a liberdade e faça nascer novas relações humanas e sociais.

Jesus nos propõe enxergar oportunidades em meio às crises, nos cinco pães e dois peixes na mão de um menino somos chamados a reconhecer a totalidade das oportunidades quando as pequenas forças de cada um são colocadas a disposição de todos.

E isso só vai acontecer quando formos capazes de seguir o conselho de São Paulo: “Com toda a humildade e mansidão, suportai-vos uns aos outros com paciência, no amor. Aplicai-vos a guardar a unidade do espírito pelo vínculo da paz. Há um só Corpo e um só Espírito, como também é uma só a esperança à qual fostes chamados. Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos,
age por meio de todos e permanece em todos”.

Peçamos a graça de aprender e pautar a nossa vida conforme rezamos no salmo: “Todos os olhos, ó Senhor, em vós esperam e vós lhes dais no tempo certo o alimento; vós abris a vossa mão prodigamente e saciais todo ser vivo com fartura”.

quarta-feira, 14 de julho de 2021

HOMILIA PARA O DIA 18 DE JULHO DE 2021 - 16º COMUM - ANO B

 

ANDAR NA PRESENÇA DO SENHOR

Não bastasse os riscos e perigos que as circunstâncias nos oferecem, são também incontáveis as situações nas quais nos vemos totalmente desamparados e traídos em nossa confiança. São amigos e familiares que causam desilusão e desnorteiam nossas relações; são colegas de trabalho e superiores nas nossas relações profissionais que agem praticando a política de levar vantagem; com muita frequência líderes religiosos a quem damos crédito como se fossem mensageiros do Deus vivo e de repente nos vemos enganados por eles; isso para não falar nas maracutaias de muitos políticos de todos os tempos e em quase todas as instâncias de poder. Todos de alguma forma deixam a desejar quando se trata da “pedagogia do cuidado”.

Pois ora, qualquer semelhança com o povo no tempo do profeta Jeremias não é mera coincidência. Os pastores de outrora perderam, dispersaram, maltrataram as ovelhas que não lhes pertencia. Em vez de agir como pastores não passaram de aventureiros que levaram em conta mais os interesses próprios dando margens a jogadas políticas. O profeta começa dando uma sentença: Ai dos pastores que deixam perder-se e dispersar-se o rebanho de minha  pastagem, diz o Senhor! Vós dispersastes o meu rebanho, e o afugentastes e não cuidastes dele”.

No evangelho que é a continuação do último domingo Jesus reúne os discípulos depois de uma primeira atividade missionária para a qual eles tinham sido enviados a anunciar para expulsar demônios e curar doentes. Para a reunião de balanço o Evangelho Jesus lhes disse: 'Vinde sozinhos para um lugar deserto, e descansai um pouco”. Não parece se tratar de um lugar geográfico, mas de estar na proximidade do mestre, ou seja, a missão precisa ser desenvolvida tendo sempre como referência a pessoa e a doutrina de Jesus. Próximos de Jesus eles recebem, mais uma vez o testemunho do  seu coração compassivo em relação ao seu rebanho: “Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor. Começou, pois, a ensinar-lhes muitas coisas”.

A missão dos discípulos e, portanto, também a nossa, não pode ser diferente daquela de Jesus. Reunir-se frequentemente em torno d’Ele, dialogar com Ele escutar os seus ensinamentos e confrontar a sua doutrina com a nossa ação de cotidiana. Longe de Jesus facilmente estaremos sujeitos a apresentar soluções parciais e que geram dependência e escravidão. Muitas vezes até somos funcionários eficientes, mas que continuamos a oferecer soluções pontuais. Longe de Jesus não são poucos os que se cansam e abandonam a atividade e o dinamismo da missão. Não nos esqueçamos, se perdermos a referência ao mestre perdemos também o sentido da missão.

E isto é o que garante São Paulo para os cristãos de Éfeso e por extensão também a nós: “Agora, em Jesus Cristo, vós que outrora estáveis longe, vos tornastes próximos, pelo sangue de Cristo. Ele, de fato, é a nossa paz: do que era dividido, ele fez uma unidade. Ele veio anunciar a paz a vós que estáveis longe, e a paz aos que estavam próximos. É graças a ele que uns e outros, em um só Espírito, temos acesso junto ao Pai”.

Nós sabemos que somos uma grande família, um corpo com uma grande diversidade de membros. A globalização aproxima as pessoas e permite partilhar muitas coisas nesta grande casa comum, entretanto ainda persistem muros construídos e em construção que impedem a fraternidade e a comunhão. Nós como discípulos de Jesus temos o dever de dar testemunho da paz e da unidade e lutar contra todas as barreiras que nos dividem. Que seja nossa regra de vida a oração da missa deste domingo: “para que repletos de fé esperança e caridade guardemos fielmente os vossos mandamentos”.

E conforme cantamos na Campanha da Fraternidade desse ano:


Venham todos, vocês, venham todos
Reunidos num só coração, (cf. At 4, 32)
De mãos dadas formando a aliança
Confirmados na mesma missão. (bis)

Em nome de Cristo, que é a nossa paz!
Em nome de Cristo, que a vida nos traz
Do que estava dividido
Unidade ele faz!
Do que estava dividido
Unidade ele faz! (cf. Ef 2, 14a)

Venham todos, vocês, testemunhas
Construamos a plena unidade
No diálogo comprometido
Com a paz e a fraternidade. (bis)


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quinta-feira, 8 de julho de 2021

HOMILIA PARA O DIA 11 DE JULHO DE 2021 - 15º COMUM - ANO B

 

A VERDADE E O AMOR SE ENCONTRARÃO

A oração que nos introduz na liturgia da Palavra desse domingo é uma espécie de síntese dos três textos que foram proclamados: “Ó Deus, que mostrais a luz da verdade aos que erram para retomarem o bom caminho, dai a todos os que professam a fé rejeitar o que não convém ao cristão, e abraçar tudo o que é digno desse nome”.

Ora o que significa ver a luz da verdade senão compreender a Palavra de Deus com suas promessas e indicações para a vida. O profeta Amós, por volta de 700 anos antes de Cristo já provou a incompreensão daqueles que preferiam andar e manter as pessoas nas trevas do erro, Ele, no entanto, declarou com segurança para que veio e por que veio: “não sou profeta nem sou filho de profeta; sou pastor de gado e cultivo sicômoros. O Senhor chamou-me, quando eu tangia o rebanho, e o Senhor me disse: 'Vai profetizar para Israel, meu povo”. Convicto do chamado que havia recebido e da missão que lhe fora pedida agiu com a liberdade e a firmeza de profeta não se deixando amordaçar nem pelos interesses e vantagens pessoais que poderia usufruir se tivesse negado a responsabilidade.

São Paulo, descreve aos efésios a ação de Deus em favor das pessoas: “Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Ele nos abençoou com toda a bênção do seu Espírito em virtude de nossa união com Cristo, no céu. Ele nos predestinou para sermos seus filhos adotivos… Pelo seu sangue, nós somos libertados. Nele também vós ouvistes a palavra da verdade, o evangelho que vos salva”. Aceitar e colocar Cristo como centro de nossas vidas implica manter a liberdade inclusive dos nossos interesses mesquinhos e da política de “levar vantagem”.

No evangelho Jesus é muito objetivo no mandato que dá aos discípulos quando se trata de rejeitar tudo o que não convém ao cristão: “Jesus chamou os doze, e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros. Recomendou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não ser um cajado; nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura. Mandou que andassem de sandálias e que não levassem duas túnicas”. Estes objetos que aparentemente são insignificantes, na verdade são mecanismos de escravidão que nos impedem de abraçar tudo o que é digno da condição de seguidores d’Ele. O seguidor de Jesus oferece sua vida testemunhando sobriedade, pobreza, servindo na alegria e na caridade. O verdadeiro discípulo não faz imposições antes faz proposições chamando a todos para a responsabilidade.

A missão não é reservada a um grupo de especialistas e iluminados os doze significam a totalidade daqueles que creem e são chamados a viver na luz da verdade e no caminho da liberdade, para dar conta dessa tarefa nós rezamos cantando: Mostrai-nos, ó Senhor, vossa bondade, e a vossa salvação nos concedei”.

 

quinta-feira, 1 de julho de 2021

HOMILIA PARA O DIA 04 DE JULHO DE 2021 - COMBATI O BOM COMBATE DA FÉ. SÃO PEDRO E SÃO PAULO. ANO B

 

ACREDITAR COM OS FATOS

Isaac Newton foi um físico, matemático, astrônomo, teólogo que viveu no século XVIII, é dele a frase: “Se cheguei até aqui foi porque me apoiei nos ombros de gigantes”. Esta citação é regularmente repetida por pessoas que querem justificar o sucesso dos seus empreendimentos atribuindo os méritos a terceiros que participaram como anônimos das conquistas que estão sendo celebradas.

Hoje celebramos São Pedro e São Paulo a quem denominamos colunas da Igreja. O Papa Francisco na homilia para essa solenidade falou: Queridos irmãos e irmãs, a Igreja olha para estes dois gigantes da fé e vê dois Apóstolos que transmitiram a força do Evangelho ao mundo, porque antes foram libertados pelo encontro com Cristo”. Na celebração do dia de São Pedro e São Paulo, Francisco recordou diversos momentos nos quais Pedro experimentou o sabor da derrota. O mesmo aconteceu com Paulo que experimentou a própria libertação depois de ter caído do cavalo e de vivenciar com frequência um espinho na carne.

Nos dois casos Jesus os amou desinteressadamente, apostou neles, os encorajou a não desistir e dar a vida pelos irmãos. E de fato ambos fizeram isso Pedro não fez discurso sobre ser missionário; ele agiu como missionário, Paulo não foi um brilhante escritor, antes enviou cartas que permitiam vivenciar e testemunhar aquilo que acreditava.

Nós também, ao longo da vida somos libertados de muitas amarras e sempre temos a necessidade de nos sentir libertos de todo medo que paralisa e nos torna inseguros e fechados em nós mesmos. Sempre e de novo precisamos ser libertos para não ficar paralisados quando nossas atividades e empreendimentos forem mal sucedidos.

Precisamos nos libertar das nossas falsas seguranças, da hipocrisia da nossa exterioridade, da tentação de impor sempre as nossas ideias. Precisamos nos libertar de uma observância religiosa que nos torna rígidos e inflexíveis. Também a nós Jesus da uma missão como a de Pedro: Chaves para abrir portas e construir pontes que nos levem a ligar e desatar os nós e as correntes de nossas vidas.

Ao longo da história, nós e a Igreja vivenciamos de sobra experiências nas quais temos vontade  de desistir de tudo, porém somos convidados a perceber que se chegamos até aqui é porque nos apoiamos em ombros de gigantes, que nesse caso são as colunas da Igreja.

Não sem razão a Igreja reza no início da missa: “Concedei à vossa Igreja seguir em tudo os ensinamentos dos apóstolos que nos deram as primícias da fé".