DOS PRINCÍPIOS PRIMEIROS[1]
Carta apostólica em forma de Motu Próprio por meio da qual altera algumas normas contidas no
Can. 838 do Código de Direito Canônico.
O princípio primeiro do Concílio Ecumênico Vaticano II,
consiste em compreender que a vida litúrgica de um povo deve ser adaptada
segundo a compreensão deste mesmo povo, tal princípio atribuiu aos bispos uma
tarefa muito exigente, que consistiu em introduzir na língua pátria a língua
litúrgica e consequentemente preparar e aprovar as traduções dos livros
litúrgicos.
A Igreja Latina tinha consciência do exigente empenho que
esta adequação haveria de provocar com a consequente perda da originalidade da
sua língua materna celebrada ao longo dos séculos, não obstante abriu com
alegria as portas para novas versões da língua litúrgica a fim de melhor
celebrar os mistérios divinos.
Ao mesmo tempo, seguindo a opinião claramente expressa pelos
padres conciliares no que diz respeito ao uso da própria língua na liturgia, a
igreja também compreendia as dificuldades que esta matéria traria. De um lado
se fez necessário garantir o bem dos fiéis considerando sua idade, sua cultura
e o direito de celebrar de um modo consciente e participativo a divina liturgia
sem perder a unidade substancial do Rito Romano; por outro lado o idioma
materno de cada povo foi se tornando de maneira progressiva também uma língua
litúrgica que embora com cunho particular, manteve a beleza do Latim Litúrgico
mas foi se constituindo numa forma diferente de expressar os conceitos capazes
de nutrir a fé.
Considerando algumas leis litúrgicas, instruções, cartas
circulares, indicações e confirmações dos livros litúrgicos emitidos pela Sé
Apostólica desde os tempos do Concílio, como também leis que foram
estabelecidas antes e depois do concílio pelo Código de Direito Canônico. Os
critérios considerados apontam linhas gerais úteis e possíveis de serem
seguidas pelas Comissões litúrgicas como instrumentos adequados, de modo que na
grande variedade de línguas, a comunidade litúrgica possa se expressar de
maneira mais compreensível nas diferentes realidades, sem perder a integridade
e a fidelidade, especialmente na tradução de alguns textos de maior importância
bem como de alguns livros litúrgicos.
O texto litúrgico, enquanto sinal ritual é um meio de
comunicação oral. Porém, para os fiéis que celebram os ritos sagrados, a
palavra é também um mistério: a medida que as palavras são proclamadas, de modo
particular quando se lê a Sagrada Escritura, É Deus quem fala aos seus filhos e
filhas, no Evangelho é Cristo mesmo quem fala ao seu povo por meio daquele que
preside a celebração, e esta assembleia responde ao Senhor com suas preces no
Dom do Espírito Santo.
A finalidade da tradução dos textos litúrgicos e bíblicos,
para a liturgia da palavra é anunciar aos fiéis a Palavra da Salvação
obedecendo sempre a fé expressa na oração da Igreja ao seu Senhor. Diante desta
necessidade é necessário que seja comunicado com fidelidade para um determinado
povo, ou seja transmitido na sua própria língua, aquilo que a Igreja quis
comunicar por meio da língua latina. Embora a fidelidade de um texto não possa
ser sempre ajuizada na singularidade das palavras, mas dentro do seu contexto, que
implica todo o ato de comunicar de acordo com o gênero literário. Todavia
alguns termos particulares precisam ser considerados no contexto da integridade
da fé católica, portanto, cada tradução dos textos litúrgicos deve estar de
acordo com a santa doutrina.
Não é nenhuma surpresa que o exigente trabalho destes tempos
de adequação litúrgica trouxe muitas dificuldades entre as Conferências
Episcopais e a Santa Sé. De modo que as decisões do Concílio no que se refere
ao uso da própria língua na liturgia possa valer também para os tempos futuros,
faz-se necessário uma constante colaboração repleta de fidelidade recíproca,
vigilante e criativa entre as Conferências Episcopais e os Dicastérios da Cúria
Romana que tem a responsabilidade de promover a sagrada Liturgia, ou seja, a
Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos. De maneira que
para garantir a renovação integral da Vida litúrgica, torna-se oportuno que
alguns princípios transmitidos ao longo do tempo pelo Concílio sejam mais
claramente reafirmados e colocados em prática.
É necessário prestar atenção naquilo que é útil e benéfico
aos fiéis, sem esquecer a autonomia e o direito das Conferências Episcopais de
uma mesma língua e a relação com a Santa Sé de modo a salvaguardar a índole
própria de cada língua sem perder a fidelidade ao texto original e que os
livros litúrgicos traduzidos depois de adaptados sempre respeitem e façam
resplandecer a unidade do Rito Romano.
Para exprimir mais claramente a significativa colaboração
entre a Sé Apostólica e as Conferências Episcopais no serviço da liturgia que
prestam aos fiéis ouvindo o parecer da Comissão para os Bispos e peritos por
mim instituídos, disponho com a autoridade que me foi confiada, que a
disciplina canônica atualmente vigente no Can. 838 do CIC, seja expressa de
modo mais claro, e que esteja em melhor sintonia com as letras da Constituição
Sacrossanto Concílio particularmente no artigo 36, parágrafos 3 e 4 e nos
artigos 40 e 63, bem como no Motu Próprio
Sagrada Liturgia número IX e para que fique mais clara a competência da Santa
Sé naquilo que se refere a tradução dos livros litúrgicos e adaptações
profundas, entre as quais possam ser consideradas também novos textos a serem
introduzidos, estabelecidos e aprovados pelas Conferências Episcopais.
Desta maneira, o Can.
838 terá a seguinte redação:
Can. 838 – Parágrafo 1. A regulamentação da Sagrada Liturgia
depende unicamente da autoridade da Igreja, isto compete exclusivamente à Santa
Sé, a norma do direito e ao Bispo Diocesano.
Parágrafo 2 – É competência da Sé Apostólica disciplinar a
liturgia da Igreja Universal, publicar os livros litúrgicos, aprovar as
adaptações realizadas de acordo com a autonomia da Conferência Episcopal, e
garantir que as normas litúrgicas sejam fielmente observadas.
Parágrafo 3 – Compete às Conferências Episcopais preparar com
fidelidade as traduções dos livros litúrgicos na sua própria língua, adaptando
de modo conveniente dentro dos limites, aprovando e publicando os livros
litúrgicos para a região da sua competência, depois de confirmados pela Santa
Sé.[2]
Parágrafo 4 – Ao Bispo diocesano na Igreja a ele confiada
compete dentro dos limites estabelecer normas em matéria de liturgia, as quais
todos são obrigados.
Consequentemente terá outra interpretação do artigo 64, parágrafo
3 da Constituição Apostólica Pastor
Bonus, como também outras leis em particular aquelas que se referem aos
livros litúrgicos no que se refere as traduções. Também determino que a
Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos modifique o seu
regulamento, tendo por base a nova disciplina e colabore com as Conferências
Episcopais na melhor maneira de realizar a sua tarefa e promover cada vez mais
vida litúrgica da Igreja Latina.
Tudo o que foi deliberado por meio desta Carta Apostólica em
forma de “Motu Próprio” determino que
seja cumprido assim que entrar em vigor, deixa de ter importância toda e
qualquer orientação contrária, mesmo que digna de nota. Que isto seja publicado
no L’Osservatore Romano, vigorando a partir de primeiro de outubro de
2017, depois de registrado nas Atas da Sé Apostólica.
Dado em Roma, junto a São Pedro aos três de setembro de 2017,
quinto do meu Pontificado.
Francisco.
[1]
Tradução livre do Italiano para o português realizada pelo Padre Elcio
Alberton.
[2]
Note-se que houve alteração no texto latino do CIC nos parágrafos 2 e 3. (Na versão antiga a palavra latina era
previa Recognitione e traduzida para
o português como “prévia aprovação”. No motu próprio a palavra é confirmationem).