SENHOR, QEM MORARA EM VOSSA CASA?
Nos últimos dias pelo menos três situações chamaram a
atenção do mundo todo. A tomada de poder pelos grupos fundamentalistas no Afeganistão,
ameaçando a vida e os direitos das pessoas em nome do respeito a lei e do
cumprimento da vontade divina.
O último terremoto no Haiti que se soma a pobreza e a
corrupção deixando milhares de pessoas desprotegidas e relegadas à própria
sorte.
O medo que ainda ronda o mundo vitimado pela pandemia,
não obstante o sucesso das campanhas de vacinação e o aparente controle da
COVID 19.
Em ambas as situações o problema não está na letra da
lei, nem precisamente no cumprimento ou descumprimento de regras e normas, mas
no cuidado com a vida como um dom a ser preservado e valorizado em qualquer circunstância.
É sobre cuidado e valorização da vida que tratam as
leituras da Palavra de Deus nesse domingo. A lei de Deus que está no livro do
deuteronômio tem um objetivo muito claro: “Moisés falou ao povo, dizendo: 'Agora, Israel, ouve as leis e os
decretos que eu vos ensino a cumprir, para que, fazendo-o, vivais e
entreis na posse da terra prometida pelo Senhor Deus de vossos pais”.
A lei é o indicativo de um caminho para a vida plena, não se
esgota no cumprimento da regra pela regra ou de ritos e práticas vazias.
Cumprir os mandamentos é um processo de conversão e de compromisso de quem ama
a Deus e aos irmãos: “Vós
os guardareis e os poreis em prática, porque neles está vossa sabedoria e inteligência perante os
povos. Pois,
qual é a grande nação cujos deuses lhe são tão próximos como o Senhor nosso Deus, sempre
que o invocamos? E que
nação haverá tão grande que tenha leis e decretos tão justos”. Em resumo, praticar a
lei é condição para a felicidade e vida plena!
No Evangelho, mais uma vez Jesus se defronta com o legalismo dos fariseus:
“Os fariseus e alguns
mestres vieram
de Jerusalém e se reuniram em torno de Jesus e lhe perguntaram 'Por que os teus
discípulos não seguem a tradição dos antigos”. Na resposta Jesus retoma as
profecias bem conhecidas dos doutores da lei: “Este povo me honra com os lábios,
mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois, as doutrinas que ensinam são
preceitos humanos'. Vós
abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens”. Para dar uma
resposta à altura do questionamento Jesus apela ao justo valor que se deve dar
às leis e normas na medida em que elas servem como meio para o respeito às
pessoas e a Deus: “Escutai todos e compreendei: o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de
fora, mas o que sai do seu interior. Pois é de dentro do coração humano que saem as más intenções, imoralidades,
roubos, assassínios, adultérios,
ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo”. Todas estas coisas más saem de dentro, e são elas que tornam impuro o
homem”.
O ensinamento que Jesus dá aos fariseus de outrora pode ser
aplicado a nós e as nossas comunidades. O mais importante não é a prática de todas
as leis e regras, mesmo aquelas propostas pela igreja. O mais importante não é
o cumprimento escrupuloso dos ritos, regras e normas, mas é verdadeiramente
cristão acolher as pessoas como um gesto de gratidão a Deus. É importante
celebrar e participar da vida comunitária na medida em que essa prática se
torne amor partilhado. A verdadeira preocupação de quem acredita deve ser
moldar o seu coração na prática do amor e da caridade como se reza no salmo: “Senhor, quem morará em vossa casa É aquele que caminha sem pecado e pratica a justiça fielmente; que pensa a verdade no seu íntimo e não solta em calúnias sua
língua. Que em nada prejudica o seu irmão, nem cobre de insultos seu
vizinho; nem se deixa subornar
contra o inocente”.
E
Tiago na sua carta que é a segunda leitura dá uma lição objetiva. Escutar e
contemplar a Palavra sem colocá-la em prática é ritualismo estéril e que não
serve para nada: “Recebei com humildade a Palavra que em vós foi implantada, e que é capaz de salvar as
vossas almas. Todavia, sede praticantes da Palavra e não meros ouvintes. Com efeito, a
religião pura e sem mancha diante de Deus Pai, é
esta: assistir os órfãos e as viúvas em suas tribulações”
Como indicativo para a nossa vida é importante que nos
perguntemos: nossas práticas litúrgicas, nossas práticas de piedade nos
comprometem com a promoção, cuidado e valorização da vida na construção de
relações humanas respeitosas e inclusivas, ou se resumem a práticas legalistas.
Peçamos a graça de nos deixar transformar pela Palavra, pela
oração e pela Eucaristia a fim de evitar toda forma de desprezo, discriminação,
ou condenação das pessoas. Que a Eucaristia nos ensine a não somar regras, mas
sim multiplicar a caridade.
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