sábado, 20 de outubro de 2018

CHAMADO À SANTIDADE


CHAMADO À SANTIDADE

Todos são chamados à santidade, o que muitas vezes acontece é a falta de coragem para compreender o chamado (Hebreus – 12, 1- 2) – Entre as testemunhas podem estar a nossa mãe, uma avó, outra pessoa próxima de nós – “Lembro de sua fé sincera, a mesma que sua vó Loide e sua mãe Eunice e tenho a certeza que é a mesma fé que você tem” (2Tm 1, 5). A sua vida pode não ter sido sempre perfeita, mas continuaram a caminhar e agradaram ao Senhor.
É este sentido que tem a luta pela santidade e que Bento XVI já manifestou no início do seu pontificado: “Não devo carregar sozinho, nunca poderia carregar sozinho. Os numerosos santos de Deus me protegem, amparam e me guiam”.  Quando a Igreja declara que uma pessoa pode ser considerada santa leva em conta a prática das virtudes.
Não pensemos apenas nos santos reconhecidos pela Igreja, mas em todos aqueles que o Espírito Santo derrama a santidade: “Aprouve a Deus salvar e santificar todas as pessoas, não individualmente, mas constituindo-se em um povo que O Conhecesse na verdade e o servisse na santidade” (Lumen Gentinum 9). Resumindo a salvação não é um privilégio particular, mas uma conquista comunitária assim se expressa um provérbio popular: “Um santo faz outro santo”.
Segundo Francisco a santidade não é um desafio inalcançável, pelo contrário afirma o Papa: “Gosto de ver a santidade no povo paciente de Deus: nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e nas mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa, nos doentes, nas consagradas idosas que continuam a sorrir. Nesta constância de continuar a caminhar dia após dia, vejo a santidade da Igreja militante. Esta é muitas vezes a santidade “ao pé da porta”, daqueles que vivem perto de nós e são um reflexo da presença de Deus, um reflexo da “classe média da santidade”.
Que nosso peregrinar para a santidade seja alimentado pelos sinais perceptíveis nas pessoas mais simples. Neste particular Francisco recorda a vida de Edith Stein – (Judia convertida depois de ter lido as obras de Santa Teresa D’Avila. Mártir no campo de concentração Auschwitz, foi canonizada por João Paulo II com o nome de Santa Teresa Benedita da Cruz). Nos diários desta santa se lê: “Na noite mais escura, surgem os maiores profetas e os santos. Todavia, a corrente vivificante da vida mística permanece invisível. Certamente, os eventos decisivos da história do mundo foram essencialmente influenciados por almas sobre as quais nada se diz nos livros de história. E saber quais sejam as almas a quem devemos agradecer os acontecimentos decisivos da nossa vida pessoal é algo que só conheceremos no dia em que tudo o que está oculto for revelado”. (Obras completas).
A santidade é o rosto mais belo da Igreja e ela não está necessariamente na Igreja. Disse São João Paulo II. O Espírito suscita “sinais da sua presença, que ajudam os próprios discípulos de Cristo”(Novo Milênio). O Sangue de Cristo derramado é um patrimônio comum para os cristãos.
Ninguém está excluído do chamado à santidade: “Eu sou o Senhor que os trouxe do Egito a fim de ser o Deus de Vocês. Portanto sejam santos, pois eu sou santo” (Lv 11,45). A Lumen Gentium é categórica: “Munidos de tantos e tão grandes meios de salvação, todos os fiéis, seja qual for a sua condição são chamados pelo Senhor à perfeição do Pai, cada um por seu caminho”(11).
O fato de alguns exemplos de santidade parecer alto demais não é motivo para desânimo, todos eles oferecem testemunhos para estimular, não para copiar, São João da Cruz afirma no seu Cântico Espiritual: “cada um aproveite a seu modo pois a vida divina comunica-se a uns de uma maneira e a outros de outra”.
Além de grandes nomes da Igreja, afirma Francisco, “interessa-me lembrar tantas mulheres desconhecidas ou esquecidas que sustentaram e transformaram, cada uma a seu modo, famílias e comunidades com a força do seu testemunho”. Obviamente que isso implica em dar o melhor de si para realizar aquilo que Deus pensou desde sempre para cada pessoa: “Antes de formar-te no seio de tua mãe, eu já te conhecia; antes de saíres do ventre de tua mãe eu te consagrei”(Jr 1, 5).
É ilusão pensar que a santidade seja reservada apenas àqueles que tem possibilidade de se afastar das ocupações comuns. Não é assim. Todos somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações de cada dia, onde cada um se encontra. Procura a santidade vivendo com alegria a tua doação. Estás casado? Cuida das suas responsabilidades com aqueles que estão próximo de ti, como Cristo faz com a Igreja. És um trabalhador? Cumpra com honestidade e competência sua responsabilidade e por meio do trabalho santifique seus irmãos. É Pai, mãe, avô, avó? Ensina as crianças a seguirem Jesus. Tens alguma responsabilidade no exercício de autoridade? Luta pelo bem comum e renuncia aos interesses pessoais.
Permita que o batismo frutifique em você. Quando sua vida se voltar para a fragilidade ergue os olhos para o crucificado e admite: “Senhor, sou um miserável! Mas vós podeis realizar o milagre em de me tornar um pouco melhor”. A igreja é santa e pecadora e sempre oferece uma possibilidade para ser melhor: “Nós nos alegramos e cantaremos um hino de louvor por causa daquilo que o Senhor nosso Deus, fez. Ele nos vestiu com a roupa da salvação e com a capa da vitória. Somos como um noivo que põe um turbante de festa na cabeça, como uma noiva enfeitada com joias”(Is 61, 10).
A santidade é feita de Pontos Concretos de Esforço... “Não falar mal dos outros, ouvir o filho que se lamenta, conversar com um pobre que ‘não merece’ nossa atenção.”. Quem ensina isso é o Cardeal Vietnamita François Van Thuan, preso pelo regime comunista durante 13 anos, 9 dos quais em absoluto isolamento: “aproveito as ocasiões que vão surgindo cada dia para realizar ações ordinárias de modo extraordinário”(Livro cinco pães e dois peixes).
Para um cristão não existe outro caminho neste peregrinar senão compreendê-lo como caminho de santidade, pois para isso foi moldado: “O que Deus que de vocês é isto: que sejam completamente dedicados a ele. Que cada um saiba viver com sua esposa de um modo que agrade a Deus, com todo o respeito”(1 Ts 4, 3- 4).
Perseguir a santidade não é importante fixar-se em detalhes, porque naturalmente sempre haverá quedas, o que se deve buscar é o conjunto da vida, o caminho inteiro, o desejo de encontrar a Cristo no todo da vida das pessoas. Não existe uma receita para a santidade, existe uma abertura ao Espírito Santo. Pedir que o mesmo Espírito mostre sempre o que Jesus espera de tua vida e quais as escolhas que você deve fazer discernindo sempre a sua missão. Que você seja um reflexo da vida de Jesus no mundo contemporâneo.
Identificar-se com Cristo implica compreender os compromissos relativos a construção de um Reino de amor e de justiça para todos. É o mesmo Jesus que vem ao teu encontro para viver contigo todos os esforços e garantir a fecundidade deles garantido que sempre estás dando o melhor de você nos compromissos que assumiu.
Fazer-se santo exige uma sintonia entre silêncio e encontro; oração, repouso e atividade. Ser capaz de contemplar estando ao mesmo tempo em ação é o exercício mais generoso de quem busca a santidade. O Espírito não é contraditório, ele não iria enviar alguém em missão e pedir que faça um processo de fuga. É ilusão uma paz interior que não seja comprometida. Em resumo, a vida é uma missão!
As exigências de santidade implicam em doação evangélica que nos seus escritos o Papa chama de Espiritualidade da missão (EG); Espiritualidade ecológica (Laudato Si); Espiritualidade familiar (AL). Tal forma de espiritualidade não exclui o que se chama quietude e solidão diante do silêncio de Deus. Ser santo não é sinônimo de uma corrida frenética para “fazer coisas” é a garantia de um espaço dialogal com Deus. Aceitar um encontro com Deus, deixar-se invadir por ele, muitas vezes só acontece quando a pessoa se percebe a beira do abismo, no precipício do próprio abandono ou no mais alto da solidão radical.
Não raro, a frenesi do mundo contemporâneo, com todas as oportunidades e ofertas de distração leva a absolutizar o tempo livre com prazeres passageiros. Há que se cultivar um espírito de Santidade que compartilhe solidão e serviço, contemplação e ação.
Em resumo, não ter medo de ser santo, esta realidade não nos torna menos humanos, pelo contrário, ela se potencializa pelo encontro entre a fragilidade e a força da graça. Leon Bloy – escritor, poeta e ensaísta francês que viveu até o início do século passado, afirmou em seu livro “A mulher pobre”: “Existe apenas uma tristeza: a de não ser santo”.
(Pense em momentos nos quais você não perseguiu a santidade e enumere para sua vida pessoal e familiar, fazer o dever-se de sentar-se como busca para o caminho da santidade)


  
DOIS INIMIGOS DA SANTIDADE
2ª MEDITAÇÃO

No início do cristianismo duas correntes de pensamento ameaçaram a doutrina que estava nascendo. A primeira delas denominado gnosticismo tinha como premissa o conceito que tudo o que é matéria fosse necessariamente má e que só o que é espiritual seria bom. A outra doutrina foi conhecida como pelagianismo e segundo esta corrente de pensamento a pessoa humana é a única responsável pela sua salvação ou condenação.
Francisco afirma que estas duas correntes estão muito presentes nos cristãos da atualidade e elas se manifestam todas as vezes que algumas pessoas se colocam num patamar elevado de perfeição, uma espécie de elite do cristianismo que em vez de evangelizar julgam e analisam os demais. Em lugar de facilitar a graça consomem-se em controlar os demais. Para estes a pessoa de Jesus deixa de ser importante e necessária e na esteira desta compreensão todos as demais criaturas.
As pessoas que pensam assim na atualidade cultivam uma fé fechada para quem só interessa uma determinada experiência, um determinado raciocínio, uma única forma de ver e compreender o mundo, em outras palavras “consideram-se a última bolacha do pacote”. Estas pessoas vivem como se estivessem enclausuradas dentro das próprias verdades e sentimentos.
Ao longo da história da Igreja não foi assim e sempre ficou muito claro que não se mede a perfeição das pessoas porque elas não têm pecado. Faço questão de citar as palavras do Bispo no dia da minha ordenação: “Do que se trata ordenar um sacerdote e que acho que impressiona a todos nós aqui e é só isso que vou acenar. É que se trata do aspecto da generosidade de um moço que aos 26,27 ou 28 anos ele assume entregar-se com todas as suas qualidades, como é o caso do Élcio, e também com suas limitações como aqui foi dito. Agora o que impressiona não é a perfeição da pessoa, o que impressiona é a generosidade da pessoa, isso certamente impressiona a mim, a todos vocês e a toda a humanidade até o fim do mundo.
Sempre haverá de ser impressionante ver um homem que aos vinte e oito anos, a partir da fé ele se põe a serviço do povo de Deus para fazer crescer a fé. Isto é o que se trata aqui irmãos e imãs. Esta é a grande coisa estupenda que está acontecendo entre nós neste momento. É isto que nós queremos acolher com carinho, e nós queremos acolher com alegria imensa, porque esse testemunho de generosidade faz bem a todos nós. Faz bem a vocês pais de família que sem serem generosos a família de vocês não irá bem nunca, faz bem a vocês mães de família que são aquela coisa incomparável dentro da nossa casa, porque vocês são sempre a pessoa mais generosa dentro da nossa casa. Faz bem a vocês jovens que sem aprenderem desde cedo a grande lição da generosidade, desculpem, vocês não irão a nada. Jovens vocês não chegarão a nada sem a generosidade. Faz bem às crianças que mal entendem esse tipo de coisa. Que não mal entendem, que muito bem entendem todo gesto de generosidade que se faz com as crianças, podem não entender as palavras, mas o gesto de generosidade que você faz com uma criança eles entendem sempre, então está aí é o que está aqui, é o grande segredo nosso dos padres nós não temos a pretensão, graças a Deus, de nos apresentar como gente perfeita, ninguém de nós.
E se tem uma insistência que eu faço para mim, e se tem uma insistência que eu faço para os nossos padres é que não tenham a pretensão de serem perfeitos, mas que tenham sim a pretensão sempre de serem generosos” (Dom Luiz Colussi, 03/11/90).
Os perfeitos, melhores que os demais, são incapazes de tocar a “carne sofredora de Cristo”, preferem um Deus sem Cristo, um Cristo sem cruz e uma Igreja sem povo. Os gnósticos contemporâneos pensam explicar e compreender todas as coisas e até todo o evangelho a partir da sua própria sabedoria e perfeição. Absolutizam tudo e exigem que todos estejam debaixo dos seus raciocínios. Certamente esta maneira de ver a vida e de viver a fé é uma das piores artimanhas atuais. Esta doutrina aparece disfarçada de espiritualidade, mas é desencarnada, tem a pretensão de “domesticar o mistério”.
Quando uma pessoa tem respostas para todas as situações começa a evidenciar que não está no bom caminho, nestes casos, frequentemente ele busca “engaiolar Deus” dentro das suas próprias verdades e muitas vezes em seu próprio benefício pretende dominar a transcendência de Deus. A mais antiga formulação de doutrina definia Deus como “um espírito perfeitíssimo criador do céu e da terra” e quando perguntado onde estava Deus, a resposta era também pronta: “Deus está no céu e na terra e em todo lugar”. Esta verdade, dita de outra maneira, continua sendo a única possível para definir a transcendência e a onipotência de Deus.
Deus está misteriosamente presente na vida de todas as pessoas e está de uma maneira que só ele poderia explicar e entender. Mesmo quando a vida de alguém tiver sido um desastre, mesmo que o vejamos destruído pelos vícios ou pela dependência, Deus está presente na sua vida. Reconhecer a presença de Deus implica deixar-se guiar pelo Espírito Santo, mais do que pelos conhecimentos e pela sabedoria acumulada. “Eu te louvo Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelastes aos pequeninos”, disse Jesus. O gnosticismo tem a pretensão de exercer o controle rigoroso sobre a vida dos outros e facilmente substituem a simplicidade concreta do Evangelho por uma Unidade alheia à nossa história.
Todo o ensinamento da Igreja não pode ser entendido como um sistema fechado que não admita perguntas e respostas diferentes para cada circunstância. A fé no verdadeiro Deus exige compreender e aceitar as perguntas, dúvidas, questões, angústias, batalhas, sonhos e preocupações do cotidiano e das pessoas. As dificuldades do povo servem também para nos questionar e nos tirar da zona de conforto produzida pelo gnóstico que mora em nós. Não raro os membros da Igreja, participantes de movimentos e serviços pastorais julgam que são capazes de explicar tudo a partir da sua sabedoria e perfeição. Não se pode subestimar a razão, mas ao mesmo tempo não se pode absolutizar e pretender explicar tudo de maneira a exercer um controle rigoroso sobre a vida de todos. Por conta desta pretensa “santidade” cultivar sentimentos de superioridade em relação ao “comum dos fiéis”, o verdadeiro cristão precisa aprender sempre que o binômio “razão e santidade” são inseparáveis.
São Francisco escreveu para Santo Antônio: “Alegra-me que você explique aos demais as doutrinas da Igreja, mas tome cuidado para que isso não apague neles a simplicidade do Evangelho que se manifesta na oração e na devoção”. São Boaventura, seguidor de Francisco, e que viveu na Itália nos anos 1200 fez uma advertência que se aplica perfeitamente às pessoas contemporâneas: “A maior sabedoria que pode existir consiste em dispensar frutuosamente o que se possui e que lhe foi dado precisamente para ser distribuído. Por isso como a misericórdia é amiga da sabedoria, a avareza é sua inimiga”.
O segundo perigo da atualidade é o pelagianismo, este por sua vez acredita que toda a perfeição reside na capacidade da própria pessoa que com seu esforço é capaz de alcançar a perfeição. Os pelagianos desconsideram que a escolha de Deus não depende das vontades humanas, mas que foi Ele que nos escolheu com a sua misericórdia e nos amou primeiro: “Nós amamos porque Deus nos amou primeiro. Se alguém diz: Eu amo a Deus, mas odeia o seu irmão, é mentiroso. Pois ninguém pode amar a Deus a quem não vê, se não amar o seu irmão, a quem vê” (1Jo 4,19 -20).
Quem vive de acordo com a compreensão pelagiana faz bonitos discursos, porém na prática “só confia nas suas próprias forças e sente-se superior aos outros por cumprir determinadas normas ou por ser irredutivelmente fiel a certo estilo católico” (EG 94). Contra essa mentalidade cabe o convite de Santo Agostinho: “Faça tudo o que você pode e peça o que você não pode”, em outras palavras: “Que eu alcance aquilo que por vós foi ordenado e disponha ao meu alcance aquilo que seja da sua vontade” (Confissões, X, 29). A superação do pelagianismo implica um reconhecimento sincero dos próprios limites e a abertura para que a graça atue na pessoa. Acreditar na graça significa compreender que por ela a pessoa não se torna um “super-homem”.
Reconhecer a realidade concreta e limitada permite perceber o que Deus pede a cada momento, afinal é Ele quem faz a pessoa ser idônea e habilitada para os seus dons: “Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos”. A perfeição implica viver na presença de Deus e compreender que ela só pode nos fazer bem. Deixar-se moldar como vasos de argila, ter convicção daquilo que se reza: “Ao Senhor peço apenas uma coisa, e só isto que eu desejo: habitar no santuário do Senhor por toda a minha vida; saborear a suavidade do Senhor e contemplá-lo no seu templo” (Salmo 26/27). “É melhor passar um dia no teu Templo do que mil dias em qualquer outro lugar” (Salmo 84,11).
São João Crisóstomo já antecipava a doutrina da Igreja quando diz: “antes de termos entrado no combate” Deus nos preenche com seus dons. São Basílio Magno (anos 330 na Turquia) afirma que a confiança em Deus é a condição para experimentar a verdadeira justiça. Esta certeza continua sendo doutrina da Igreja como se lê no catecismo quando afirma que a graça: “ultrapassa as capacidades da Inteligência e as forças da vontade humana” (CIC 1998).  Tão mais longe estão os meus pensamentos dos seus pensamentos, como está distante a terra do céu, reza o salmista, neste sentido diz o Papa Francisco: “A sua amizade supera-nos infinitamente, não pode ser comparada por nós com as nossas obras e só pode ser um dom da sua iniciativa de amor”.
Santa Teresa de Liseux declarou: “Ao anoitecer desta vida, aparecerei diante de vós com as mãos vazias, pois não vos peço, Senhor, que conteis minhas obras. Toda a nossa justiça tem mancha diante dos teus olhos Senhor”. Lucio Gera, sacerdote argentino, declarou que a pessoa precisa: “Reconhecer alegremente que a própria realidade é fruto de um dom, e aceitar também a liberdade como graça. Isto é muito difícil para o mundo contemporâneo que julga possuir as coisas por si mesmo, como fruto da própria originalidade e liberdade”.  Somente se reconhecendo como pertencendo a Deus a pessoa é capaz de oferecer-se a si próprio, de acordo com São Paulo: “Eu lhes exorto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a oferecerdes seus próprios corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus” (Rm 12,1) e ainda “Se eu não tivesse a caridade de nada adiantaria” (1Cor 13,2).
Embora tudo isso seja suficientemente esclarecido, não faltam aqueles cristãos que insistem em seguir outra estrada que consiste na justificação pelas suas próprias forças. A Obsessão pela lei, o fascínio pelas conquistas sociais e políticas, a ostentação no cuidado com a liturgia, da doutrina e o prestígio da Igreja, a vanglória ligada à gestão de assuntos práticos, a atração pelas dinâmicas de autoajuda a realização auto referencial são, frequentemente, ocupações de alguns cristãos que consomem todas as suas energias e seu tempo para garantir estas coisas e esquecem de se deixar guiar pelo Espírito no caminho do amor, esquecem-se de se apaixonar pela Alegria do Evangelho e não saem a procurar os afastados nessas imensas multidões sedentas de Cristo.
Sem dificuldade é possível perceber com a vida da Igreja com facilidade se torna uma peça de museu ou uma propriedade de poucos. Essa situação é facilmente perceptível quando alguns grupos de cristãos dão maior importância para a observação de normas, costumes, regras e estilos de vida. Tal situação despoja o evangelho da sua simplicidade e o torna como sal insosso. Facilmente se observa tal realidade em grupos, movimentos, pastorais, serviços e comunidades que começam com uma vida intensa e aos poucos vão se fossilizando e corrompendo.
Sem se dar conta, por causa da compreensão pelagiana, complicam o evangelho e escravizam e tornam-se escravos de esquemas por onde não passa a graça. Para estes cabe a recomendação de São Tomás de Aquino quando afirma que se deve exigir com moderação, os preceitos acrescentados ao Evangelho: “para não tornar a vida pesada aos fiéis, porque assim se transformaria a nossa religião numa escravidão” (Summa Theologiae, I – II q, 107, art. 4). De novo vai se encontrar São Paulo: “Não fiquem devendo nada a ninguém. A única dívida que vocês devem ter é a de amar uns aos outros. Quem ama os outros está obedecendo a lei. Quem ama os outros não faz mal a eles. Porque, amar é obedecer a toda a lei” (Rm 13, 8 e 10).
Muitas vezes a preservação das instituições empurra as pessoas para uma densa selva de preceitos, como ocorreu com os judeus. E no meio daquele emaranhado de prescrições, proibições e permissões Jesus abre uma brecha para vislumbrar o rosto do Pai e dos irmãos.  Diante da pergunta, qual o maior dos mandamentos: Jesus lhe disse: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento. Este é o maior e o primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Estes dois mandamentos contêm toda a lei e os profetas” (Mateus, 12 34-40).
À guisa de conclusão, somente duas riquezas não desaparecem: O Senhor e o próximo! Como exercício de “dever de sentar-se” proponho: Questionar e discernir quais são os pontos concretos de esforço que eu devo realizar na minha vida para que Deus possa se manifestar no cotidiano.
(Rever o nosso Ponto concreto de Esforço à luz destes dois inimigos da Santidade. Estou pensando em Deus...)


 III MEDITAÇÃO
À LUZ DO MESTRE

As palavras de Jesus foram sempre direcionadas para o objetivo da sua vinda ao mundo, isto é, para ajudar a perceber a essência da santidade. Certamente a melhor explicação para isso se encontra na simplicidade das bem-aventuranças (Mt 5, 3 – 12; Lc 6, 20-23). Compreendendo isso não resta dificuldade para enxergar o caminho sobre como ser um bom cristão. Cada qual a seu modo, colocar em prática o sermão da montanha. Sem dificuldade pode-se entender como sinônimo as palavras: “Feliz, bem-aventurado e santo”.
Que elas são bonitas e soam bem ao ouvido ninguém dúvida, mas que estão na contramão do que é habitual também não há dúvida. Colocar em prática os conselhos de Jesus implica abrir-se ao Espírito Santo e se deixar encharcar com toda a sua força e nos libertar da fraqueza, do egoísmo, da preguiça e do orgulho, todos eles frutos do pelagianismo contemporâneo.

1 - FELIZES OS POBRES EM ESPÍRITO PORQUE DELES 
É O REINO DO CÉU...
A facilidade que oferece a posse dos bens dificulta perceber a carência que as posses significam. Aquele que tem certas garantias somente percebe sua fragilidade quando as seguranças humanas desmoronam e só nesta ocasião procura outro sentido para vida. Note-se que Jesus também conta a parábola do rico insensato – não pensava que iria morrer no mesmo dia – (Lc 12, 16-21). Quando o coração se sente rico, fica tão satisfeito de si mesmo que nele não tem espaço para a Palavra de Deus. Por isso Jesus chama de Felizes os pobres em espírito, que tem coração pobre, onde pode entrar o Senhor com sua novidade.
Santo Inácio de Loyola afirmou que a santidade está ligada à capacidade da indiferença. Dizia que a santidade se encontra à medida que a pessoa é capaz de não colocar em primeiro plano a satisfação a partir das coisas criadas, e considera que elas existem como se não existissem.
Lucas já apresenta as bem-aventuranças, sem alcançar o adjetivo “em espírito”. Isso é um convite para uma pobreza austera, ser feliz nesse caso é cultivar a capacidade de compartilhar o que se tem com aqueles que mais precisam. Em outras palavras é um processo de “configuração” a Cristo que sendo “Rico se tornou pobre” (2 Cor 8, 9).

2 - FELIZES OS MANSOS PORQUE POSSUIRÃO A TERRA

Que o nosso cotidiano é marcado pela violência, intolerância e incompreensão é um fato inegável. Com frequência vê se reinar o orgulho, a vaidade, a prepotência. No meio desta realidade Jesus sugere outro estilo: “a mansidão”. Ele mesmo praticava essa virtude com seus discípulos: aí vem o teu Rei, ao teu encontro, manso e montado num jumentinho (Mt 21, 5; cf. Zc 9, 9). E ainda: “Aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito” (Mt 11, 29).
Olhar as pessoas com quem convivemos e compreender que seus limites e defeitos não são oportunidades para nos sentirmos superiores ou melhores. Não olhar os outros com sentimento de superioridade, mas estendendo a mão para acolher evitamos de gastar energias em lamentações. Para Santa Teresa de Lisieux, «a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros, em não se escandalizar com as suas fraquezas».
São Paulo já havia recomendado a correção fraterna entre aqueles que se amam, porém, não com grosseria e superioridade, pelo contrário com mansidão: “O espírito de Deus produz o amor, a alegria, a paz, a paciência, a delicadeza, a bondade e a fidelidade a humildade e o domínio próprio. E contra essas coisas não existe lei. As pessoas que pertencem a Cristo Jesus crucificaram a Natureza humana delas, junto com todas as paixões e desejos dessa natureza. Que o Espírito de deus que nos deu a vida controle também a nossa vida! Nós não devemos ser orgulhosos, nem provocar ninguém, nem ter inveja dos outros” (Gl 5, 22- 25). E se por acaso as más ações de algum irmão seja causa de escândalo procurar corrigir com “mansidão”: “Meus irmãos se alguém for apanhado em alguma falta, vocês que são espirituais devem ajudar essa pessoa a se corrigir. Mas façam isso com humildade e mansidão” (Gl 6, 1ss). Não poucas vezes na Igreja erramos mais por julgar enquanto deveríamos mais acolher.
É claro que mansidão não é sinônimo de um “bobo alegre” A Palavra “anawin” é usada na Sagrada Escritura e significa “pobres e mansos”. Estes dois adjetivos não podem ser entendidos como alguém insensato, estúpido ou frágil, pelo contrário são aqueles que esperam no Senhor na mesma proporção como o Senhor confia neles: “é nos humildes de coração contrito que os meus olhos se fixam, pois escutam a minha palavra com respeito” (Is 66, 2).

3 -  FELIZES OS QUE CHORAM PORQUE SERÃO CONSOLADOS

O mundo contemporâneo, o advento das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação trazem muito facilmente a ideia de que precisamos estar sempre ocupados. Mal nos sentamos em qualquer lugar. Paramos no semáforo, ou em qualquer outro lugar, precisamos estar conectados com o mundo. O entretenimento, o prazer, a diversão é que torna a vida boa. “O mundano ignora, olha para o lado, quando há problemas de doença ou aflição na família ou ao seu redor. O mundo não quer chorar: prefere ignorar as situações dolorosas, cobri-las, escondê-las. Gastam-se muitas energias para escapar das situações onde está presente o sofrimento, julgando que é possível dissimular a realidade, onde nunca, nunca, pode faltar a cruz”.
A oração para pedir o dom das lágrimas, rezada pelos padres da Igreja para pedir o arrependimento do coração: “Ó Deus onipotente e mansíssimo, que fizeste surgir da rocha uma fonte de água viva para o povo sedento, fazei brotar da dura natureza do nosso coração lágrimas de arrependimento, para podermos chorar os nossos pecados e obter por vossa misericórdia a sua remissão” (Missal Romano edição típica 1962) Pensemos nas lágrimas de Santa Mônica que garantiram a conversão de Santo Agostinho:  A pessoa que, vendo as coisas como realmente estão, se deixa trespassar pela aflição e chora no seu coração, é capaz de alcançar as profundezas da vida e ser autenticamente feliz. Assim pode ter a coragem de compartilhar o sofrimento alheio, e deixa de fugir das situações dolorosas. Esta pessoa sente que o outro é carne da sua carne, não teme aproximar-se até tocar a sua ferida, compadece-se até sentir que as distâncias são superadas. Assim, é possível acolher aquela exortação de São Paulo: «Chorai com os que choram» (Rm 12, 15).
Saber chorar com os outros isso é santidade!

4 - FELIZES OS QUE TÊM FOME E SEDE DE JUSTIÇA, PORQUE SERÃO SACIADOS

Fome e sede são necessidades primárias e tem a ver com sobrevivência, mas estes sentimentos têm a ver também com a justiça e a estes Jesus garante que a saciedade de Deus chegará. A justiça de Deus não é interesseira, nem tampouco manchada por interesses mesquinhos, corporativistas, manipulada segundo as vantagens que pode oferecer a este ou aquele grupo. Não é raro que muitas vezes fiquemos assistindo impotentes diante das injustiças e nas situações em que alguns repartem a seu bel prazer o “bolo da vida”.
Jesus recomenda que a busca da justiça de Deus vá se tornando realidade na vida de cada pessoa e daí se estenda aos mais pobres e vulneráveis: “justiça com os indefesos: «procurai o que é justo, socorrei os oprimidos, fazei justiça aos órfãos, defendei as viúvas” (Is 1, 17).
Buscar a justiça com sede e fome isso é santidade!

 5 - FELIZES OS MISERICORDIOSOS, PORQUE ALCANÇARÃO MISERICÓRDIA

Misericórdia é uma atitude de reciprocidade: Mateus resume-o numa regra de ouro: “o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também a eles” (7, 12). Esta atitude precisa ser praticada em todas as situações especialmente quando o assunto entra no campo do juízo moral.
Fazer a experiência da reciprocidade é se aproxima da perfeição de Deus: “Lucas, já não encontramos «sede perfeitos» (Mt 5, 48), mas «sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados. Dai e ser-vos-á dado» (6, 36-38). E depois Lucas acrescenta algo que não deveríamos transcurar: «a medida que usardes com os outros será usada convosco» (6, 38).
A felicidade não está prometida a quem planeja vingança, pelo contrário oferece a alegria a quem é capaz de perdoar até setenta vezes sete. Isso não porque alguém é mais perfeito que o outro, mas porque todos temos uma multidão de pecados e somos uma multidão de perdoados. “Não devias tu também ter compaixão do teu companheiro como eu tive de você” (Mt 18,33).
Olhar e agir com misericórdia: isso é santidade!

 6 - FELIZES OS PUROS DE CORAÇÃO, PORQUE VERÃO A DEUS

Na bíblia o “coração” é o lugar onde se tomam todas as decisões e onde moram todas as intenções: “a pessoa humana vê as aparências, o Senhor vê o coração” (1Samuel 16,7). É por isso que Deus falar ao coração e se propõe repetidamente a nos dar um “um coração novo” (Ez 36,26). Guardar as coisas no coração com cuidado é um pedido insistente desde o Antigo Testamento, Provérbios, 4, 23. “O Pai vê o que está escondido” (Mateus 6, 6). O Filho também sabe o que há em cada pessoa humana: “E ninguém precisava falar com ele sobre qualquer pessoa, pois ele sabia o que cada pessoa pensava” (João 2,25).
É verdade que não há amor sem obras de amor, mas esta bem-aventurança lembra-nos que o Senhor espera uma dedicação ao irmão que brote do coração, pois «ainda que eu distribua todos os meus bens e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, de nada me vale» (1 Cor 13, 3). O que torna a pessoa impura é o que sai da boca vindo do coração (Cf. Mt 15,18). A verdadeira intenção tem mão dupla: ama a Deus e ao próximo, isso é muito mais do que palavras vazias isso São Paulo também canta no chamado hino da caridade: “Agora vemos num espelho confusamente, mas o veremos tal como ele é”(1Cor 13, 12). E para isso é importante não deixar manchar o coração pela falta de caridade.
Manter o coração limpo isso é santidade!

 7 - FELIZES OS PACIFICADORES, PORQUE SERÃO CHAMADOS FILHOS DE DEUS

Se fizermos uma olhada para o nosso interior e nas relações de proximidade com outras pessoas e mesmo com as criaturas em geral, não é difícil perceber como estamos cercados de conflitos, de guerras, de incompreensões. Muitas vezes é chamado pecado da língua. Quando levamos intrigas e fofocas para outras pessoas e outros ambientes – em dialeto italiano – “porta Schiti”. Somos, frequentemente envolvidos no mundo das murmurações e que não poucas vezes tem por objetivo destruir e não construir a paz.
Pelo contrário, os pacificadores vivem semeando a paz e a estes disse Jesus: “Serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9). Não sem razão Jesus enviou os discípulos com esta recomendação: “Chegando em uma casa, digam primeiro: A paz a esta casa!” (Lc 10,5). Paz e justiça se abraçarão já rezava o salmista: “A verdade e o amor se encontrarão, a justiça e a paz se abraçarão; da terra brotará a fidelidade, e a justiça olhará dos altos céus. — O Senhor nos dará tudo o que é bom, e a nossa terra nos dará suas colheitas; a justiça andará na sua frente e a salvação há de seguir os passos seus”. (Salmo 85).
Buscar a paz é um convite e um desafio feito a todos pois: “pois a bondade é a colheita produzida pelas sementes que forma plantadas pelos que trabalham em favor da paz” (Tg 3,18).
Construir a paz evangélica não é uma tarefa fácil, pois ela não é excludente, ou um projeto para poucos. Trata-se de ser artesãos da paz, porque construir a paz é uma arte que requer serenidade, criatividade, sensibilidade e destreza. 
Semear a paz ao nosso redor: Isso é santidade!

 8 - FELIZES OS QUE SOFREM PERSEGUIÇÃO POR CAUSA DA JUSTIÇA, PORQUE DELES É O REINO DO CÉU

Colocar a vida num caminho que vai contra a corrente habitual da sociedade transforma as pessoas em incômodo. Não são poucos os perseguidos por esta causa, porém, não há outro caminho: “Quem quiser salvar a sua vida vai perde-la, mas quem gastar a sua vida por minha causa e pelo evangelho esse vai ganhar”.
É óbvio que nem tudo a nossa volta gira sempre em nosso favor, seja porque não cooperamos, seja porque as ambições e interesses mundanos jogam contra nós. São João Paulo II já declarou: “alienada a sociedade que, nas suas formas de organização social, de produção e de consumo, torna mais difícil a realização [do] dom [de si mesmo] e a constituição [da] solidariedade inter-humana”.
“A cruz, especialmente as fadigas e os sofrimentos que suportamos para viver o mandamento do amor e o caminho da justiça, é fonte de amadurecimento e santificação”. Pensemos na afirmação dos Atos: “Os apóstolos saíram do conselho muito alegres porque Deus havia achado que eles eram dignos de serem insultados por serem seguidores de Jesus” (At 5,41). E São Paulo: “Pois ele tem a dado a vocês o privilégio de servir a Cristo, não somente crendo nele, mas também sofrendo por ele”. (Filipenses 1, 29).
É importante te claro também que não faltam perseguições provocadas por nossos próprios erros e por maneiras erradas de tratar os outros. Ser apóstolo de Cristo hoje implica espelhar-se no modelo das primeiras testemunhas: “Louvavam a Deus por tudo e eram estimados por todos e a cada dia Deus o Senhor juntava ao grupo as pessoas que iam sendo salvas”.
Não ter medo das incompreensões e perseguições: “vocês serão felizes se mentindo disserem todo o mal contra vocês por causa de mim” (Mt 5,11).
Aceitar os problemas e perseguições do cotidiano, mesmo que isso nos acarrete problemas: isso é santidade.

O GRANDE CRITÉRIO DE SALVAÇÃO

O final do Evangelho de Mateus apresenta como acontecerá os fins dos tempos e põe na boca de Jesus alguns critérios. Entre eles a prudência – na parábola das dez virgens. Mas o grande critério está entre no capítulo 25, 35 - 46 conhecido como o juízo final.
A compreensão destas máximas de Jesus deixa mais do que claro santidade não se resume “revirar os olhos em suposto êxtase”. São João Paulo II já havia afirmado:  “Se verdadeiramente partimos da contemplação de Cristo, devemos saber vê-Lo sobretudo no rosto daqueles com quem Ele mesmo  quis  se identificar”. No documento sobre a Eucaristia o mesmo Santo toma as palavras de São João Crisóstomo: “Queres honrar o corpo de Cristo com vestes de seda e vasos de ouro, fazes bem. Mas não esqueça que o mesmo Jesus que disse isso é meu e isso é meu sangue também disse: tudo o que fizer ao menor dos meus irmãos foi a mim que você fez. Portanto vai antes vestir quem está nú e dar de comer a quem tem fome e só depois com aquilo que sobra venha adorar o corpo de Cristo”. (Vinde ó irmãos adorar...) O juízo final é muito mais do que um convite a caridade mas projeta luz sobre todo o mistério da vida de Cristo”. (Chegada do Novo Milênio e a Eucaristia faz a Igreja).
Sem comentários, especulações e desculpas que lhes tirem força. O Senhor deixou-nos bem claro que a santidade não se pode compreender nem viver prescindindo destas suas exigências, porque a misericórdia é o coração pulsante do Evangelho”.
Claro deve ficar que temos o dever de fazer caridade assistencial, mas temos o compromisso de colaborar para o estabelecimento de sistemas econômicos e justos onde a exclusão não tenha lugar.
Obviamente que estas exigências não estão desconectadas de um relacionamento pessoal com o Senhor, se assim fosse a Igreja não passaria de uma ONG. A igreja está repleta de uma nuvem de testemunhas que foram capazes de linkar estas duas realidades. Apenas para recordar pensemos em São Francisco de Assis, São Vicente de Paulo, Santa Teresa de Calcutá, Dom Helder Câmara, Dom Luciano Mendes de Almeida. Esses e tantos outros muito bem souberam conectar: oração, amor a Deus, leitura do Evangelho, paixão e eficácia no serviço aos pobres.
Algumas ações são indispensáveis, mas em cada região e em cada tempo as exigências e as escolhas dão um norte para a ação da caridade (PCE). Vale recordar: O direito de nascer; A dignidade dos que já nasceram; os feridos pelo narcotráfico; as feridas da eutanásia; os doentes desassistidos, as diversas formas de escravatura, os jovens fora da escola, a exploração do trabalho infantil, todas as formas de intolerância, a exploração sexual... Essa situação foi levantada pelos bispos latino americanos na Conferência de Aparecida que afirmaram que a pessoa humana: “É sempre sagrada, desde a concepção, em todas as etapas da vida da existência, até sua morte natural e depois da morte e que a vida deve ser cuidada em todos os tempos” (Ap 464).
Nenhum ideal de santidade será alcançado se formos indiferentes nas questões de justiça. Enquanto alguns gastam folgadamente a reduzem suas vidas às novidades do consumo outros continuam sendo os pobres lázaros do Evangelho (Lucas 16, 19-31). E os cristãos felizes expectadores dessa escandalosa cena de exclusão social.
Outras questões emergentes merecem a atenção dos cristãos: Migrantes e refugiados; Questões de bioética; Cuidados com o meio ambiente.
Especificamente em relação aos migrantes e refugiados já advertiu Moisés aos judeus: Algo de semelhante propõe o Antigo Testamento, quando diz: «não usarás de violência contra o estrangeiro residente nem o oprimirás, porque foste estrangeiro residente na terra do Egito» (Ex 22, 20). «O estrangeiro que reside convosco será tratado como um dos vossos compatriotas e amá-lo-ás como a ti mesmo, porque fostes estrangeiros na terra do Egito» (Lv 19, 34). Por isso, não se trata da invenção de um Papa nem dum delírio passageiro. Também nós, no contexto atual, somos chamados a viver o caminho de iluminação espiritual que nos apresentava o profeta Isaías quando, interrogando-se sobre o que agrada a Deus, respondia: é «repartir o teu pão com os esfomeados, dar abrigo aos infelizes sem casa, atender e vestir os nus e não desprezar o teu irmão. Então, a tua luz surgirá como a aurora» (58, 7-8).
O que mais agrada a Deus: “Poder-se-ia pensar que damos glória a Deus só com o culto e a oração, ou apenas observando algumas normas éticas (é verdade que o primado pertence à relação com Deus), mas esquecemos que o critério de avaliação da nossa vida é, antes de mais nada, o que fizemos pelos outros. A oração é preciosa, se alimenta uma doação diária de amor. O nosso culto agrada a Deus, quando levamos lá os propósitos de viver com generosidade e quando deixamos que o dom lá recebido se manifeste na dedicação aos irmãos”.
“Pela mesma razão, o melhor modo para discernir se o nosso caminho de oração é autêntico será ver em que medida a nossa vida se vai transformando à luz da misericórdia. Com efeito, «a misericórdia não é apenas o agir do Pai, mas torna-se o critério para individuar quem são os seus verdadeiros filhos». [88] É «a arquitrave que suporta avida da Igreja». [89] Quero assinalar mais uma vez que, embora a misericórdia não exclua a justiça e a verdade, «antes de tudo, temos de dizer que a misericórdia é a plenitude da justiça e a manifestação mais luminosa da verdade de Deus». [90] A misericórdia «é a chave do Céu”.
Isso já afirmou Santo Tomás de Aquino: “mais do que os atos de culto, são as obras de misericórdia para com o próximo: [92] «não praticamos o culto a Deus com sacrifícios e com ofertas exteriores para proveito d’Ele, mas para benefício nosso e do próximo: de fato Ele não precisa dos nossos sacrifícios, mas quer que Lhes ofereçamos para nossa devoção e para utilidade do próximo. Por isso a misericórdia, pela qual socorremos as carências alheias, ao favorecer mais diretamente a utilidade do próximo, é o sacrifício que mais lhe agrada». [Summa Theoligiae 93].
Se uma pessoa deseja realmente dar glória a Deus: “é chamado a obstinar-se, gastar-se e cansar-se procurando viver as obras de misericórdia. Muito bem o entendera Santa Teresa de Calcutá: «sim, tenho muitas fraquezas humanas, muitas misérias humanas. (...), Mas Ele abaixa-Se e serve-Se de nós, de ti e de mim, para sermos o seu amor e a sua compaixão no mundo, apesar dos nossos pecados, apesar das nossas misérias e defeitos. Se nos ocupamos demais de nós mesmos, não teremos tempo para os outros” (Cristo nos pobres).
Outro engano da modernidade é o consumo hedonista que se alimenta dos desejos de diversão e de centrar-se sobre si mesmo. Um dos pecados da modernidade é o “consumo de informações superficiais as formas rápidas de comunicação virtual podem ser um fator estonteante que ocupa todo o nosso tempo e nos afasta da carne sofredora dos irmãos
Em síntese: o testemunho dos santos consiste em viver a regra do comportamento do Juízo final.

(Escuta da Palavra de Deus... duplas de casal)


IV MEDITAÇÃO
ALGUMAS CARATERÍSTICAS DA SANTIDADE NO MUNDO ATUAL

Uma das ações muito valorizadas nas relações humanas e na consecução de objetivos em todos os setores da sociedade se chama “foco”. E o Papa Francisco nos aponta cinco grandes manifestações para as quais devemos ter “foco” quando se trata de viver as bem-aventuranças e o Juízo final.
São elas:
1)                Tolerância, paciência e mansidão
Firmeza interior, permanecer centrado e firme em Deus que sustenta e que ama: “Com base em tal solidez interior, o testemunho de santidade, no nosso mundo acelerado, volúvel e agressivo, é feito de paciência e constância no bem. É a fidelidade (pistis) do amor, pois quem se apoia em Deus também pode ser fiel (pistós) aos irmãos, não os abandonando nos momentos difíceis, nem se deixando levar pela própria ansiedade, mas mantendo-se ao lado dos outros mesmo quando isso não lhe proporcione qualquer satisfação imediata”.
Esta máxima foi defendida por São Paulo “não paguem a ninguém o mal com o mal. Procurem agir de tal maneira que vocês recebam a aprovação dos outros. No que depender de vocês façam todo o possível para viver em paz com todas as pessoas. Meus queridos irmãos, nunca se viguem de ninguém; pelo contrário, deixem que seja Deus quem dê o castigo” (Rm 12,17 – 19).
Não pensemos que isso seja sinal de fraqueza Deus é lento para ira e muito poderoso para o perdão: “O SENHOR é misericordioso e clemente, lento para a cólera, mas paciente e generoso em seu amor” (Salmo 103, 8).  E São Paulo pede aos efésios o que pode ser dirigido a nós: “Abandonem toda amargura, todo ódio e toda raiva. Nada de gritarias, insultos e maldades. Não se ponha o sol sobre vossa ira. ” (Ef. 4,31).
Tenham certeza, “A paz de Deus que supera todo entendimento guardará seus corações e seus pensamentos em Cristo Jesus” (Fl 4, 6- 7).
Um dos perigos da intolerância reside no mau uso das mídias e muitas vezes até católicas em que se ultrapassa os limites e se propaga a difamação e a calunia que não respeita da fama alheia. Este pecado é a potencialização da reprovação feita por São Tiago: “A língua é um fogo. Ela é um mundo de maldades, ocupa o seu lugar em nosso corpo e espalha o mal em todo o nosso ser. Como o fogo que vem do próprio inferno ela põe toda a nossa em chamas. O ser humano é capaz de dominar até os animais que se arrastam pelo chão, mas não é capaz de controlar a própria língua” (Tg 3, 6- 8).
Se alguém quer ser santo deve-se ocupar menos dos erros alheios, não gastar energias, mas guardar silêncio sobre os defeitos dos outros isso evita a violência verbal que destrói e maltrata, porque não se julga digno de ser duro com os outros, mas os considera superiores a si próprio (Cf. Fl 2, 3).
São João Crisóstomo bem entendeu as palavras de Jesus: “Mostra-se sempre mais inclinado a aprender com os outros do que querer ensinar”. E aconselhava a quem queria afastar-se do demônio: alegrando-se com o bem dos outros como se fosse teu e procurando sinceramente que estes seja preferido a ti em todas as coisas. Exercite essas coisas sobre tudo em relação aqueles que te são menos simpáticos.
“A humildade só se pode enraizar no coração através das humilhações. Sem elas, não há humildade nem santidade. Se não fores capaz de suportar e oferecer a Deus algumas humilhações, não és humilde nem estás no caminho da santidade”.
A virtude da humildade foi praticada primeiro por Deus que amou primeiro e que aceitou que se humilhando caminhou com seu povo superando todas as suas infidelidades e murmurações. Entregou seu Filho para a humilhação da cruz. 
E se trata mesmo de humilhações cotidianas, como recomenda São Pedro: “Pois se vocês fazem o mal e são castigados qual é o merecimento de suportarem com paciência o castigo? Mas se vocês sofrem por terem feito o bem e suportam esse sofrimento com paciência, Deus os abençoara por causa disso, pois foi para isso que ele nos chamou” (1Pd 2,20 -21). Isso não é sinônimo de andar com a cabeça inclinada, fala pouco, esconder-se da sociedade. Libertar-se do egocentrismo implica ter a coragem de reclamar justiça e defender os fracos diante dos poderosos (Violência contra a mulher).
Sem sombra de dúvida humilhação não é algo agradável, mas é uma virtude que pressupõe um coração pacificado por Cristo que ensinou: “Deixo-lhes a paz, e lhes dou a minha paz. Não é uma paz como a do mundo” (Jo 14,27).

2 – Alegria e sentido de humor
Ser tolerante, paciente e manso não é necessariamente cultivar um espírito retraído, melancólico, amargo, tristonho, sumido, sem energia. O santo é capaz de viver com alegria e sentido de humor. Não perde o realismo, ilumina os outros com um espírito positivo e rico de esperança. Ser cristão é alegria no Espírito Santo. A caridade se concretiza na Alegria. É preciso deixar que Deus nos arranque de nossa concha e mude a nossa vida, de modo a se realizar em nós o que pedia São Paulo: alegrem-se sempre no Senhor! (É preferível um triste santo do que um santo triste).
A vinda do messias foi anunciada pelos profetas no meio da desolação e de toda sorte de sofrimento, que em muito se assemelha às condições atuais, mas apesar disso eles diziam: “Moradores de Sião, alegrem-se e louvem a Deus, pois o Santo e poderoso de Israel mora no meio do seu povo” (Is 12, 6); Cantem ó céus e alegre-se ó terra! Montes gritem de alegria! Pois o Senhor consolou o seu povo; ele teve pena dos que estavam sofrendo” (Is 49 13). E Neemias recomenda: “Não é dia de luto, pois a alegria do Senhor será a vossa força” (8,10). Tudo isso foi experimentado por todos os que tiveram oportunidade de compreender a missão de Jesus: “Então Maria Cantou: A minha alma se alegra no Senhor” (Lc 1,47); Por onde ele passava a multidão se alegrava (Lc 13, 17); onde chegavam os discípulos depois da humilhação da cruz, havia grande alegria (At 8,8). A santidade compreende a palavra de Jesus “Ficarão tristes, mas sua tristeza se transformará em alegria... e eu lhes disse para que a minha alegria esteja em vocês e sua alegria seja completa”( Cf. João 15 e 16).
Não há dúvida que existam momentos difíceis e tempos de cruz, mas nada pode tirar a alegria sobrenatural que “se adapta e se transforma, mas sempre permanece, como um feixe de luz que nasce da certeza pessoal de que, apesar de tudo, somos infinitamente amados” (EG 6).
A alegria é acompanhada pelo sentido de bom humor que viveram São Tomás Moro, São Vicente de Paulo, São Felipe Néri. O mau humor não é sinal de Santidade, pelo contrário: “Tira a angústia do seu coração e afasta o mal do teu corpo” (Ecl 11,10). E Timóteo, “Mas você que é de Deus, fuja de tudo isso. Viva uma vida correta, de dedicação, de fé, de amor, de perseverança e de respeito pelos outros. Corra a boa corrida da fé” (1Tm 11,12). Em resumo, é tanto o que se recebe do Senhor que as vezes a tristeza tem a ver com a ingratidão, com estar fechados em nós mesmos que nos tornamos incapazes de reconhecer os dons de Deus (São Tomás Moro).
A santidade com a alegria e sentido de humor tem a ver com adaptação a todas as circunstâncias: “Sou uma pessoa livrem não sou escravo de ninguém. Mas eu me fiz escravo de todos a fim de ganhar para Cristo o maior número possível de pessoas. Quando trabalho entre os judeus, vivo como judeu, vivo como judeu a fim de ganhá-los para Cristo. Não estou debaixo da Lei de Moisés, mas, vivo como se estivesse sujeito a essa lei. Assim também quando estou entre os não judeus, vivo fora da lei de Moisés a fim de ganhar os não-judeus para Cristo. Isso não quer dizer que eu não obedeça a lei. Quando estou entre os fracos na fé, eu me torno fraco também a fim de ganhá-los para Cristo. Assim em tornei tudo em todos a fim de ganhar alguns a qualquer custo e faço isso por causa do Evangelho” (1Cor 9,11-23).

3)                Ousadia e ardor
Por sua vez santidade tem a ver com ousadia, ou seja, algo que deixa marca neste mundo. É preciso reconhecer que o próprio Jesus caminha ao nosso encontro e continua repetindo: “Não tenham medo” (Mc 6, 50); Eis que estou com vocês todos os dias até o fim dos tempos” (Mt 28,20). Reconhecer estas palavras de Jesus nos faz partir com aquela atitude cheia de coragem que o Espirito Santo suscitava nos Apóstolos, impelindo-os a anunciar Jesus Cristo. Já havia falado Paulo VI: “O mundo moderno aceita com mais bom grado as testemunhas do que os mestres e se aceita os mestres é porque eles também são testemunhas” (Evangelii Nuntiandi). Como é importante pedir sempre a graça concedida a São Paulo: “Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho” (1Cor 9,16).
Jesus foi uma pessoa empurrada pela compaixão, dele saia uma força que lhe fazia ir em missão para curar e libertar. Reconheçamos que também nós somos frágeis portadores de um tesouro em vasos de argila.
Precisamos deixar que o Espirito nos impulsione para não nos deixar paralisados pelo medo e o calculismo, para nos habituarmos a caminhar só dentro de confins seguros. O que fica fechado cheira mofo e cria ambiente doentio. Os Atos são um testemunho de vencer o medo e o perigo “Agora, Senhor, olha as ameaças que fazem, e concede que os teus servos anunciem corajosamente a tua Palavra... Quando terminaram a oração, tremeu o lugar onde estavam reunidos. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e anunciavam corajosamente a Palavra de Deus” (4, 29 – 31).
Sem dúvida muitas vezes podemos nos sentir como Jonas com vontade de fugir para lugares seguros, que se pode identificar com “individualismo, espiritualismo, confinamento em mundos pequenos, dependência, instalação, repetição de esquemas preestabelecidos, dogmatismo, nostalgia, pessimismo, refúgio nas normas”. Porém, estas mesmas dificuldades podem nos fazer voltar para este Deus que é ternura e nos quer levar a uma itinerância constante e renovadora. Deus é sempre novidade, que nos impele a partir sem cessar e a mover-nos para ir mais além do conhecido, rumo às periferias e aos confins. Deus não tem medo! Jesus antecipa-Se nos no coração daquele irmão, na sua carne ferida, na sua vida oprimida, na sua alma sombria. Ele já está lá é verdade precisamos abrir a porta a Jesus Cristo, porque ele bate e chama (Ap. 3,20). Pensando sob outra ótica, muitas vezes em nossa autorreferencialidade, pergunto-me se às vezes Jesus não estará já dentro de nós, batendo para que O deixemos sair.
Outro desafio para a ousadia é o comodismo. Está muito seguro da maneira como tudo está acontecendo “Já não temos coragem de enfrentar o mal e permitimos que as coisas ‘continuem como estão’ ou como alguns decidiram que estejam. Desafiemos a habituação, abramos bem os olhos, os ouvidos e sobretudo o coração, para nos deixarmos mover pelo que acontece ao nosso redor e pelo clamor da Palavra viva e eficaz do Ressuscitado”.
O mundo e a Igreja estão cercados de uma - nuvem de testemunhas - “O seu testemunho lembra-nos que a Igreja não precisa de muitos burocratas e funcionários, mas de missionários apaixonados, devorados pelo entusiasmo de comunicar a verdadeira vida. Os santos surpreendem, desinstalam, porque a sua vida nos chama a sair da mediocridade tranquila e anestesiadora”.
Peçamos ao Senhor a graça de não hesitar quando o Espírito nos exige que demos um passo à frente.

4 – Em comunidade
Separados a gente perde, juntos a gente encontra”. José e Maria podem ser nossos mestres quando se trata de fazer a experiência da comunhão. Fieis seguidores da lei de Moisés, cumpriram em relação ao Filho o que estava prescrito: “Quando o menino completou 12 anos, subiram a Jerusalém para a festa da Páscoa. Terminados os dias de festa voltaram para casa. Caminharam durante três um pensando que o menino estivesse com o outro. Quando se deram conta o haviam perdido. Juntos retornaram a Jerusalém e encontraram o menino no Templo com os doutores...”
É muito difícil lutar contra as próprias fraquezas se estivermos isolados. Daí uma resposta contemporânea dos grupos de autoajuda, da literatura de autoajuda. Também no que se refere à santificação ela é um caminho para se fazer em comunidade. Na história da Igreja não são poucos os santos canonizados com seus companheiros. “De igual modo, há muitos casais santos, onde cada cônjuge foi um instrumento para a santificação do outro. Viver e trabalhar com outros é, sem dúvida, um caminho de crescimento espiritual. São João da Cruz dizia a um discípulo: estás a viver com outros «para que te trabalhem e exercitem na virtude”.
A comunidade é chamada a criar aquele «espaço teologal onde se pode experimentar a presença mística do Senhor ressuscitado». [105] Partilhar a Palavra e celebrar juntos a Eucaristia torna-nos mais irmãos e vai nos transformando pouco a pouco em comunidade santa e missionária”.
Pensemos no “encontro” narrado por Santo Agostinho quando conta o dia da partida da sua mãe “próximo já do dia em que ela ia sair desta vida – dia que Vós conhecíeis e nós ignorávamos – sucedeu, segundo creio, por disposição dos vossos secretos desígnios, que nos encontrássemos sozinhos, ela e eu, apoiados a uma janela cuja vista dava para o jardim interior da casa onde morávamos (…). Os lábios do nosso coração abriam-se ansiosos para a corrente celeste da vossa fonte, a fonte da Vida, que está em Vós (...). Enquanto assim falávamos, anelantes pela Sabedoria, atingimo-la momentaneamente num ímpeto completo do nosso coração (...) E se a vida eterna fosse semelhante a este vislumbre intuitivo?”
A santidade não é necessariamente de feitos grandiosos, a vida comunitária, na família, na paróquia, compõe-se de pequenos detalhes diários. Imaginemos alguns detalhes de Jesus com seus discípulos:
- Vinho que acaba na festa e com a festa;
- A ovelha que estava perdida;
- As duas moedinhas da viúva pobre;
- Reserva de azeite para as lamparinas;
- Um menino com cinco pães e dois peixes;
- Peixe e pão na brasa para a chegada dos discípulos.
Quem é capaz de guardar os pequenos detalhes do amor (Palavras mágicas que se aprende no primeiro ano de escola) e por meio dos quais os membros cuidam uns dos outros abre espaço para a santidade. Contra o individualismo contemporâneo vale de novo a oração de Jesus: “Que todos sejam um só, como tu, Pai, estás em mim, e eu em ti” (Jo 17,21).
  
5 – Em oração constante
O santo tem necessidade de se comunicar, e isso tem a ver com oração, o Santo tem necessidade de se comunicar com Deus. Não acredito em santidade sem oração, embora não se trate necessariamente de longos períodos ou de sentimentos intensos.
São João da Cruz falava de andar sempre na presença de Deus, seja ela real, imaginada ou unitiva, conforme permitiam as obras que estamos realizando: “procura que a tua oração seja contínua e, no meio dos exercícios corporais, não a deixes. Quando comes, bebes, conversas com outros, ou em qualquer outra coisa que faças, sempre deseja a Deus e prende a Ele o teu coração”.
Obviamente que isso não dispensa algum tempo seu dedicado a sós com Deus:  “Quando orardes entra no teu quarto e fecha a porta e teu pai que vê o que está oculto te recompensará”.
A oração confiante é uma resposta do coração que se abre a Deus face a face, onde estão silenciados todos os rumores para escutar a voz suave do Senhor que ressoa no silêncio – Colocar o coração de molho no coração de Deus!
Para todo discípulo, é indispensável estar com o Mestre, escutá-lo, aprender dele, aprender sempre. Se não escutarmos todas as nossas palavras serão apenas rumores que não servem para nada. Contemplar a face sem vida de Jesus é uma forma de recompor a nossa humanidade. Tens momentos em que te colocas em silêncio na presença e permaneces com ele sem pressa?
Não pensemos no silêncio como evasão do mundo que nos rodeia, no silêncio não pode desaparecer a própria história. Se deixamos Deus entrar na história a oração é tecida de recordações da própria vida. Santo Inácio de Loyola afirmava: “quando nos pede para trazer à memória todos os benefícios que recebemos do Senhor. Contempla a tua história quando rezas e, nela, encontrarás tanta misericórdia. Ao mesmo tempo, isto alimentará a tua consciência com a certeza de que o Senhor te conserva na sua memória e nunca te esquece. Consequentemente tem sentido pedir-lhe que ilumine até mesmo os pequenos detalhes da tua existência, que não Lhe passam despercebidos”.
Dentre as formas de oração que precisamos ter em alta estima está a oração de petição que muitas vezes tranquiliza o coração e ajuda a continuar lutando com esperança. A intercessão comunitária expressa o compromisso fraterno com os outros, quando somos capazes de incorporar nela a vida deles, as suas angústias mais inquietantes e os seus melhores sonhos. O encontro com Jesus nas Escrituras nos conduz à Eucaristia, e quando o recebemos na comunhão, renovamos a nossa aliança com Ele e consentimos que ele realize em nós sua obra transformadora – AMÉM!

(Como tenho praticado momentos de oração silenciosa diante do Senhor...)


V MEDITAÇÃO
LUTA, VIGILÂNCIA E DISCERNIMENTO
A vida cristã é uma luta permanente, é como entrar em campo para uma nova partida todos os dias. Esse jogo é magnífico porque nos permite cantar vitorias todas as vezes que o Senhor triunfa em nossa vida. Ele mesmo fez a experiência do triunfo no sucesso dos discípulos. Quando chegaram contando tudo o que realizaram exultou: “Eu vi Satanás cair do céu, com um relâmpago” (Lc 10, 17 – 18).
Nos tempos de Jesus muito facilmente se confundia qualquer doença com possessão demoníaca. Hoje isso ficou para traz, mas não se pode achar que o demônio não existe. Ele existe sim, é mais feio do que você pinta, mas também não podemos somatizar seu poder. Se rezamos o Pai Nosso entendendo o que dissemos, veremos que não é toa que Jesus fez o pedido: “Livra-nos do maligno”.  Ele é um ser, um ente, que não precisa necessariamente se manifestar em uma pessoa, mas pode nos envenenar com o ódio, a tristeza, a inveja, os vícios: “anda ao redor de nós como um leão que ruge, procurando a quem devorar” (1Pd 5 – 8 -11).
Somos convidados a resistir às ciladas do diabo e apagar todas as flechas incendiadas pelo maligno (Cf. Ef 6, 16). O nosso caminho para a santidade é uma luta que se faz com as armas mais poderosas que o Senhor nos dá: A fé que se expressa na oração, a meditação da Palavra, a Missa, a adoração eucarística, as OBRAS DE CARIDADE E A VIDA COMUNITÁRIA.
Neste caminho, o progresso no bem, o amadurecimento espiritual e o crescimento do amor são o melhor contrapeso ao mal. Ninguém resiste, se escolhe arrastar-se em ponto morto, se se contenta com pouco, se deixa de sonhar com a oferta de maior dedicação ao Senhor; e, menos ainda, se cai num sentido de derrota, porque quem começa sem confiança, perdeu de antemão metade da batalha e enterra os seus talentos. (…) O triunfo cristão é sempre uma cruz, mas cruz que é, simultaneamente, estandarte de vitória, que se empunha com ternura batalhadora contra as investidas do mal.
O caminho da santidade pede a prudência das pombas e a esperteza das serpentes e o azeite das lamparinas. Ter o cuidado de não se considerar melhor do que ninguém e nem tampouco livre dos pecados. Quem acha que nunca errou vai criando uma espécie de entorpecimento e sonolência e sua vida espiritual vai se corrompendo.
A corrupção espiritual é pior que a queda de um pecador, porque a primeira causa cegueira e tudo parece ser licito. A pessoa se torna autorreferencial quase se disfarça de anjo da luz: “E isso não é de se admirar, pois até Satanás pode se disfarçar e ficar parecendo um anjo de luz” (2Cor 11,14). No evangelho Jesus fala de uma pessoa que pensava estar limpa e quando se deu conta estava possuída por outros setes espíritos malignos (Cf. Lc 11, 24-26).
A busca da santidade exige discernimento o qual deve ser pedido constantemente ao Espírito Santo, sem o Espírito Santo nos tornamos facilmente marionetes das tendências de ocasião. (Perca de tempo na Internet).
O discernimento é um instrumento de luta. (Pontos concretos de esforço) – Trata-se de não colocar limites para o máximo, ao melhor, ao mais belo, mas também de não pensar pequeno e ficar sempre nos compromissos de hoje. (Não dar o passo maior que a perna, mas também não se julgar incapaz de mover os pés).
O discernimento é um dom sobrenatural que não exclui a sabedoria humana ou as normas da Igreja. Não está em jogo apenas um bem espiritual, nem a satisfação em realizar algo útil, ou o desejo de ter a consciência tranquila. Está em jogo o sentido da minha vida. O discernimento exige predisposição para ouvir: o Senhor, os outros, a realidade que sempre nos interpelam de uma maneira nova e diferente.
Não se trata de aplicar receitas do passado, nenhuma solução é válida em todas as circunstâncias e o que foi útil num determinado contexto pode não ser em outro.
A lógica do dom é a cruz, condição para avançar no discernimento é educar-se para a paciência de Deus e os seus tempos que nunca são os nossos. Nenhuma missão supera a que recebemos no batismo até mesmo as repetidas renuncias que somos obrigados a fazer em cada nova circunstância.
Quando podemos perceber a presença de Deus não há caminho ou espaço que fique excluído. O discernimento não é uma autoanálise presunçosa, mas uma verdadeira saída de nós mesmos para o mistério de Deus que nos chama para o bem de todos.
E na caminhada da santidade Maria é a figura que mais do que ninguém viveu as bem-aventuranças. Estremecia de Júbilo na presença de Deus, conservava todas essas coisas no coração que se deixou atravessar pela espada.

Animeno-nos uns aos outros nesse propósito...

Imaculada....


( Renovação das promessas matrimonias...)

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

HOMILIA PARA O DIA 21 DE OUTUBRO DE 2018 - 29º COMUM - ANO B


ESCOLHAS E PROMOÇÕES COM SEUS ÔNUS E BÔNUS

No auge das disputas eleitorais para os cargos de governadores e Presidente da República notam-se situações que fazem rir para não chorar. Diante de candidatos cujos nomes nem apareciam nas pesquisas eleitorais, do fracasso de grandes figurões da política, surgem os amigos da última hora, os companheiros e apoiadores de projetos de renovação. Gente que até ontem eram parceiros inseparáveis agora se engalfinham disputando novos lugares no cenário. Todos prometem fazer milagres e dar um basta em velhos problemas que em épocas eleitorais se potencializam.   
Jesus viveu há pouco mais de dois mil anos, veio com um projeto e uma proposta extraordinária para renovar as relações entre as pessoas. Seus amigos nem sempre tiveram clareza da proposta e do alcance das mudanças que a pessoa de Jesus trouxe para a humanidade. Por mais que convivessem com o mestre e diariamente pudessem ouvir seus ensinamentos eles ainda pensavam em “levar vantagem” e garantir sua fatia quando o “novo governo fosse instalado”.  Na conversa de hoje com os discípulos Jesus desmascara o oportunismo que borbulhava nas conversas de bastidores.
Primeiro são os dois irmãos: “Tiago e João, filhos de Zebedeu, foram a Jesus e lhe disseram: 'Mestre, queremos que faças por nós o que vamos pedir'. Ele perguntou: 'O que quereis que eu vos faça?' Eles responderam: 'Deixa-nos sentar um à tua direita e outro à tua esquerda, quando estiveres na tua glória!” A proposta dos dois é tão imoral que outro evangelista diz que foi a mãe deles quem fez o meio de campo. Jesus dá uma resposta que deixaria envergonhado qualquer cidadão sério e de boa índole: “Vós não sabeis o que pedem” e aproveita para desestimular os outros que também estavam na espreita de uma fatia: “Vós sabeis que os chefes das nações as oprimem e os grandes as tiranizam. Mas, entre vós, não deve ser assim: quem quiser ser grande, seja vosso servo; e quem quiser ser o primeiro, seja o escravo de todos. Porque o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate para muitos”.
A resposta de Jesus faz entender o que já tinha dito o profeta Isaias na primeira leitura: Meu Servo, o justo, fará justos inúmeros homens, fará cumprir com êxito a vontade do Senhor”. Em outras palavras no projeto de Jesus não tem lugar para conchavos, padrinhos, correligionários, “amigos da última hora”.
E sobre a identidade deste servo tem-se a resposta na carta dos Hebreus: Com efeito, temos um sumo sacerdote capaz de se compadecer de nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado. Aproximemo-nos então, com toda a confiança e permaneçamos firmes na fé que professamos”.
O projeto de Deus revelado em Jesus Cristo não é uma proposta de vantagem e favores para alguns ou alguma categoria de pessoas. A escolha de Deus é por um projeto de serviço, de comunhão. Os verdadeiros discípulos de Jesus não são os que aproveitam as oportunidades para levar vantagem, mas aqueles que abraçam a causa aceitando como ele dar a vida para que todos tenham vida.
Neste tempo de tantas promessas e tantas ameaças, não nos deixemos enganar por salvadores da pátria com soluções simples e milagrosas uma vez mais, rezemos com o salmista de hoje: Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça, pois, em vós, nós esperamos! No Senhor nós esperamos confiantes, porque ele é nosso auxílio e proteção! Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça, da mesma forma que em vós nós esperamos”

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

HOMILIA PARA O DIA 14 DE OUTUBRO DE 2018 - 28º COMUM ANO B


SÓ A PALAVRA DE DEUS JULGA OS PENSAMENTOS E OS CORAÇÕES



Os conceitos de riqueza e pobreza são muito diferentes na sociedade contemporânea como foram também ao longo da história do Povo de Deus. Na Bíblia algumas vezes até parecem estar em oposição, ora defendendo uma condição ora outra. As leituras deste domingo apresentam uma resposta para esta angústia humana e deixam bem claro para que serve a riqueza e a pobreza.
O texto da Sabedoria que foi escrito cerca de cem anos antes do nascimento de Jesus aparece como uma coleção de pensamentos atribuídos ao rei Salomão que foi conhecido como um dos mais sábios reis de Israel. No texto proclamado hoje o povo percebe um impulso para reconhecer a verdadeira riqueza: Preferi a Sabedoria aos cetros e tronos e em comparação com ela, julguei sem valor a riqueza; a ela não igualei nenhuma pedra preciosa, pois, a seu lado, todo o ouro do mundo é um punhado de areia e diante dela, a prata, será como a lama. Todos os bens me vieram com ela, pois uma riqueza incalculável está em suas mãos”.
A carta aos Hebreus também afirma basicamente a mesma coisa: “A Palavra de Deus é viva, eficaz e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes. E não há criatura que possa ocultar-se diante dela. Tudo está nu e descoberto aos seus olhos, e é a ela que devemos prestar contas”. Ou seja, só a Palavra de Deus é a verdadeira sabedoria e verdadeira riqueza.
O Jovem do Evangelho não era uma dessas pessoas que não conhecem a escritura ou que fizesse pouco caso dos mandamentos de Deus. Ele apenas não tinha entendido uma coisa: “Jesus olhou para ele com amor, e disse: Se queres ser perfeito, só uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me!' Mas quando ele ouviu isso, ficou abatido e foi embora cheio de tristeza, porque era muito rico”.
Ou seja, ele entendia bem o que queria, mas ainda não tinha tido a coragem de tomar a atitude radical e de se deixar conduzir pela sabedoria que vem da Palavra de Deus.
As palavras de Jesus para o jovem do evangelho são uma provocação também para os cristãos contemporâneos. Não basta conhecer o evangelho e os mandamentos é preciso ter a coragem de mudar a referência que se tem em relação ao que se possuí ou julga possuir.
Deixar todas as certezas e seguranças que se dispõe por uma causa maior é a forma mais sensata de compreender a verdadeira sabedoria que se encontra junto de Deus e que tantos homens e mulheres experimentaram ao longo do tempo.



sexta-feira, 5 de outubro de 2018

HOMILIA PARA O DIA 07 DE OUTUBRO DE 2018 - 27º COMUM ANO B


DO JEITO QUE DEUS UNIU

Neste tempo de mudança de época, as discussões sobre relações humanas, corresponsabilidade, inclusão e exclusão de pessoas na sociedade costumam ser intensificadas e carregadas de mitos. Não faltam quem usa de muitas e fáceis explicações para justificar seu posicionamento sempre pensando em levar vantagem e ganhar a simpatia das pessoas. Isso acontece também em relação às famílias, ao matrimônio e ao respeito entre casais. Esta situação não era diferente entre os fariseus acostumados a controlar tudo pela força da lei e interpretando segundo os seus interesses.
A primeira leitura e o evangelho deste domingo apresentam com rara clareza qual o sentido do matrimônio e as razões para sua indissolubilidade. O livro do Gênesis apresenta a mais elementar necessidade humana: “viver em companhia” – “Não é bom que o homem esteja só...” diz o texto. E Deus mesmo se encarrega de apresentar a alternativa mais adequada na figura da mulher. A complementaridade desta relação faz de ambos uma só carne, ou seja, uma só realidade que se confirma pelo amor mais forte que a própria morte.
No Evangelho os fariseus não estão preocupados com uma alternativa para as relações entre marido mulher, pelo contrário, queriam legitimar sua posição legalista e colocar Jesus à prova: “É permitido ao homem divorciar-se da mulher por qualquer motivo?” E justificam “Assim Moisés escreveu na lei...” Jesus desmonta a interpretação mesquinha, utilitária e excludente que haviam transformado o matrimônio e todas as outras relações sociais. A resposta de Jesus os deixa desconcertados: “Moisés só permitiu por causa da dureza dos seus corações...” e continua: Vocês conhecem a escritura e sabem que no princípio, isso é, muito antes que a lei de Moisés tivesse importância “desde o começo da criação, Deus os fez homem e mulher. Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e os dois serão uma só carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe!” Marcos afirma que Jesus se aborreceu vendo a dureza de coração dos seus conterrâneos e conclui dizendo que viver um para o outro é um sinal do Reino de Deus o qual precisa ser acolhido com a simplicidade das crianças: “Deixai vir a mim as crianças. Não as proibais, porque o Reino de Deus é dos que são como elas. Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como uma criança, não entrará nele'. Ele abraçava as crianças e as abençoava, impondo-lhes as mãos”.
A carta aos hebreus deixa claro que Jesus é o “santo de Deus” e seu estilo e compromisso com a proposta do Pai: “Jesus, a quem Deus fez pouco menor do que os anjos, nós o vemos coroado de glória e honra, por ter sofrido a morte. Sim, pela graça de Deus em favor de todos, ele provou a morte. Convinha de fato que aquele, por quem e para quem todas as coisas existem, e que desejou conduzir muitos filhos à glória”
Em resumo, mais do que leis sobre as relações entre as pessoas é importante reconhecer que o matrimônio é um caminho dinâmico de crescimento e realização que vai se aperfeiçoando todos os dias e não um fardo para ser carregado. Em lugar de condenar as pessoas os cristãos são chamados a compreender e acolher sobretudo aqueles que a fragilidade humana levou a fracassar no compromisso de ser um para o outro sinal da comunhão e da vontade original do criador.

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

HOMILIA PARA O DIA 30 DE SETEMBRO DE 2018 - 26º COMUM - ANO B


SENHOR, SALVAI O VOSSO POVO DO ORGULHO

Dentre os fatos que chamam a atenção do mundo inteiro nesta semana, merece ser citada Conferência das Nações Unidas, na qual líderes do mundo inteiro discutem sobre o futuro do planeta e das relações internacionais e promoção da dignidade humana. É consenso geral dos participantes e um desafio a ser perseguido por todas as pessoas e todas as instituições: “Trabalhar em conjunto, substituir a confrontação pela cooperação”.  O Papa Francisco, embora não estando participando da Conferência da ONU, também manifestou sua preocupação com as relações internacionais e com a dignidade humana por meio de uma declaração nas redes sociais: “Rezemos para que no mundo prevaleçam os programas de desenvolvimento e não aqueles para os armamentos”.
Este sentimento que cada vez mais ganha espaço e vai se tornando aceito até mesmo pelas mentalidades mais radicais e algumas vezes identificadas com a violência, a intransigência e a intolerância ajuda entender a Palavra de Deus sugerida para este domingo.
O livro dos Números que é uma coleção de fatos e situações pelas quais passou o povo de Deus entre a saída do Egito e seu estabelecimento na Terra Prometida, ajuda a entender como o Espírito de Deus sopra onde quer e como quer. Deus não limita sua presença por meio de alguns iluminados que ditam regras e normas segundo seus interesses. Acreditar em Deus significa perceber seus gestos proféticos acontecendo até mesmo onde muitas vezes parece impossível. Em lugar de excluir alguns e se julgar melhores e mais perfeitos, Moisés responde: “Quem dera que todo o povo do Senhor fosse profeta,
e que o Senhor lhe concedesse o seu espírito!” No projeto de Deus não tem lugar para fanatismo, intolerância, preconceito, condenações, julgamentos apressados. Todos são convidados a reconhecer a presença de Deus em gestos de amor, paz, justiça, solidariedade e partilha.
São Tiago na segunda leitura faz a mesma advertência com outras palavras. Não é uma atitude cristã se achar mais importante e melhor do que os demais. Acumular bens e posses enquanto grandes parcelas da população vivem à miséria e vítimas da exclusão. O cristão é chamado ao respeito e a comunhão.
No evangelho os discípulos ainda mantêm a lógica da competição que Jesus já havia reprovado no texto do último domingo. Ainda estavam preocupados sobre quem é o maior. Estão preocupados com seus interesses mesquinhos e egoístas querem se sentir os donos do mundo e salvadores da pátria: “vimos uma pessoa expulsar demônios em teu nome, mas nós o proibimos porque não conosco”.   Aceitar Jesus e seu projeto implica em não ter atitude de fanáticos e intolerantes. A construção de uma sociedade nova e responsável não se faz com violência em relação aos outros, mas é preciso cortar nos próprios limites e defeitos. “Se o seu olho pecar, arranca-o.…”
Não permitamos que o período pré-eleitoral destrua amizades, construa muros em lugar de pontes. Pelo contrário peçamos a graça de ter a vida renovada na Eucaristia e na vida de Jesus Cristo. Aproveitemos estes dias para aprender que é “imperativo trabalhar em conjunto”, porque separados a gente perde e juntos a gente encontra. O momento é de substituir a confrontação pela comunhão.


quinta-feira, 20 de setembro de 2018

HOMILIA PARA O DIA 23 DE SETEMBRO DE 2018 - 25º COMUM - ANO B


CONFIAR-SE NAS MÃOS DO SENHOR QUE SUSTENTA TODA A VIDA

Em diversos lugares na sociedade é possível perceber como as pessoas sentem a presença de Deus em suas vidas. Um dos locais em que o sofrimento humano ganha contornos extraordinários são os espaços públicos reservados para os cuidados com a saúde e a promoção da dignidade humana. Nos centros de saúde, Unidades de pronto atendimento, hospitais é mais claramente percebível o sofrimento que Cristo anuncia estar sujeito com o consequente pedido para que os seus seguidores não se considerem uns melhores que os outros, nem mais perfeitos, nem tampouco merecedores de tratamento diferenciado. Abraçando uma criança coloca a condição ideal para todos os que desejam aproximar-se dele a quem reconhecem como Messias e Mestre.
O apóstolo Tiago fala ao coração das primeiras comunidades apontando onde se encontra a origem de todos os males: “Onde há inveja e rivalidade, aí estão as desordens e toda espécie de obras más.  De onde vêm as guerras? De onde vêm as brigas entre vós? Não vêm, justamente, das paixões que estão em conflito dentro de vós?  Cobiçais, mas não conseguis ter. Matais e cultivais inveja, mas não conseguis êxito. Brigais e fazeis guerra, mas não conseguis possuir”. Ao mesmo tempo apresenta a alternativa para que estas não aconteçam: “Por outra parte, a sabedoria que vem do alto
é, antes de tudo, pura, depois pacífica, modesta, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem fingimento. O fruto da justiça é semeado na paz, para aqueles que promovem a paz”.
A proposta apresentada por Tiago é a confirmação do pedido feito por Jesus no evangelho: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!' Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio deles, e abraçando-a disse: 'Quem acolher em meu nome uma destas crianças, é a mim que estará acolhendo.
E quem me acolher, está acolhendo, não a mim, mas àquele que me enviou”.
Por mais que o sofrimento pareça desumano e traiçoeiro, aquele que confia em Deus e aceita sua “sabedoria” será capaz de produzir bons frutos sem parcialidade e sem fingimentos.
Que nossa participação nesta liturgia seja proveitosa para a nossa vida como se reza na oração pós comunhão: “Ó Deus, auxiliai sempre os que alimentais com o vosso sacramento para que possamos colher os frutos da redenção na liturgia e na vida”.

sábado, 15 de setembro de 2018

HOMILIA PARA O DIA 16 DE SETEMBRO DE 2018 - 24º COMUM ANO B

O SENHOR É JUSTIÇA E BONDADE

O cristianismo é uma religião diferente de todas as outras grandes religiões. Naquelas os fiéis seguem uma ideia, um livro, uma doutrina. No Cristianismo todas essas coisas existem, mas o seu fundamento é o seguimento da pessoa de Jesus Cristo. Reconhecer quem Ele é, sua missão no mundo e por extensão a missão de todos os que lhe seguem muda completamente a relação das pessoas entre si e com a doutrina que Ele trouxe.
A pergunta de Jesus e a resposta dada por Pedro representam a síntese de todas as preocupações do povo judeu em relação ao seu futuro e a sua aceitação a Deus e ao seu projeto. “E vocês, quem dizeis que eu sou?” Pedro respondeu: 'Tu és o Messias”. Reconhecendo que Jesus não é mais um dos grandes pregadores do seu tempo Pedro só não percebe a relação da pessoa dele com as palavras dos profetas. Jesus aceita a confissão de fé de Pedro e dos seus companheiros, mas lhe diz com outras palavras o que o profeta tinha anunciado: “Em seguida, começou a ensiná-los, dizendo que o Filho do Homem devia sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei; devia ser morto, e ressuscitar depois de três dias”.
As palavras de Jesus não são outra coisa senão a atualização da primeira leitura: “Ofereci as costas para me baterem e as faces para me arrancarem a barba: não desviei o rosto de bofetões e cusparadas.   Mas, o Senhor Deus é meu Auxiliador, por isso não me deixei abater o ânimo, conservei o rosto impassível como pedra, porque sei que não sairei humilhado”.
Logo se uma pessoa aceita que Jesus é o Messias, aceita também o desfecho desta condição e se propõe a segui-lo com todas as suas forças e com toda as suas exigências e consequências: Meus irmãos, que adianta alguém dizer que tem fé, quando não a põe em prática? A fé seria então capaz de salvá-lo? Imaginai que um irmão ou uma irmã não têm o que vestir e que lhes falta a comida de cada dia; se então alguém de vós lhes disser: 'Ide em paz, aquecei-vos', e: 'Comei à vontade', sem lhes dar o necessário para o corpo, que adiantará isso? Assim também a fé: se não se traduz em obras, por si só está morta”.
Resumindo, declarar que Jesus é o Messias implica aceitar a cruz que essa missão traz consigo. O mesmo se pode aplicar em relação ao cotidiano de cada pessoa, trata-se de aceitar a cruz e os sofrimentos comprometendo-se com a qualidade da vida.
Rezar com os irmãos como viemos fazer aqui implica compreender as palavras que se canta: 
Bem-vindos à mesa do Pai, onde o Filho se faz fraternal refeição / 
É Cristo a forte comida, o Pão que dá vida com amor-comunhão. 
Vinde, ó irmãos, adorar, vinde adorar o Senhor / 
A Eucaristia nos faz Igreja, comunidade de amor. 
No longo caminho que temos, o Pão que comemos nos sustentará /
 É Cristo o Pão repartido, que o povo sofrido vem alimentar. 
Há gente morrendo de fome, sofrendo e sem nome, sem terra e sem lar / 
Não é a vontade de Deus, pois Jesus, Filho seu, quis por nós se doar”. 

Então, Que a nossa fé seja sustentada por nossas obras e que a afirmação que Jesus é 
Messias coloque todos no caminho de aceitar a cruz e comprometer-se com todas as pessoas.  

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

HOMILIA PARA O DIA 02 DE SETEMBRO DE 2018 - 22º COMUM - ANO B


QUANDO A VIDA E A BÍBLIA SE ENCONTRAM...

Quantas pessoas a gente encontra cujo testemunho de vida é um exemplo de coerência e não poucas vezes se diz: “fulano de tal é um santo”. Por outro lado, é também frequente que a gente fale a respeito de pessoas e destes se diz: “Beltrano só parece santo”. A diferença nestas duas circunstâncias está no fato de colocar em prática aquilo que acredita e reza, ou simplesmente multiplicar palavras e se parecer com os fariseus que Jesus crítica no evangelho: “Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois, as doutrinas que ensinam são preceitos humanos”.
Na verdade, a ideia principal de toda a Sagrada Escritura consiste em: “Ouvir a Palavra e colocar em prática”. Esta recomendação aparece com clareza absoluta na carta de Tiago proclamada hoje: “Todavia, sede praticantes da Palavra e não meros ouvintes, enganando-vos a vós mesmos”.
O texto do Deuteronômio, foca em alguns pontos fundamentais para o bem-estar entre as pessoas: “Nada acrescenteis, nada tireis, à palavra que vos digo, mas guardai os mandamentos do Senhor vosso Deus que vos prescrevo. Vós os guardareis, pois, e os poreis em prática, porque neles está vossa sabedoria e inteligência perante os povos”.
E Jesus chamando a multidão para perto de si, desautoriza o legalismo dos fariseus quando afirma: “Escutai todos e compreendei: o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior. Pois é de dentro do coração humano que saem as más intenções, imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo”.
O que decide a proximidade com Deus não é o culto e as práticas legalistas, mas a capacidade de colocar em prática e ter para com todas as pessoas respeito e relações de fraternidade, cooperação e comunhão. A crítica mais séria que Jesus faz aos seus conterrâneos é a de aparentar aquilo que não são.
Peçamos a graça de ter coerência entre nossas palavras e nossas ações, não fazer uma coisa no mundo da religião e da igreja e outra no mundo dos negócios e da vida.



























sábado, 25 de agosto de 2018

HOMILIA PARA O DIA 26 DE AGOSTO DE 2018 - 21º ANO B


SERVIR AO ÚNICO DEUS

As pessoas que costumam jogar cartas, dominó, montar quebra cabeças, resolver palavras cruzadas, sabem muito bem que o jogo só continua se constantemente as cartas e pedras forem embaralhadas, se o quebra cabeça for desmontado e se as palavras cruzadas tiverem sempre um grau de complexidade mais exigente. Esta comparação é muito significativa com o dia a dia da vida que não teria a mesma importância e desfecho se não fossem os embaraços e a complexidade crescente de todos os empreendimentos realizados. Sem sombra de dúvida esta situação pode ser comparada também com a v ida de fé. Não poucas vezes as certezas sobre aquilo que se acredita são colocadas em xeque e a crença em Deus, na sua Palavra e no seu mistério sofrem abalos significativos. Ainda mais quando estes abalos ocorrem no âmbito da Igreja, das suas instituições, pastorais, movimentos, dos seus padres e bispos. Isto é o que se chama de crise.
Na história do povo de Deus e entre os amigos de Jesus não foi diferente. “As cartas do jogo” foram muitas vezes embaralhadas e acreditar que Deus estava com eles e que Jesus era o enviado do Pai não foi uma coisa tranquila para os israelitas.
Josué, no texto de hoje, coloca os chefes do povo diante de uma situação que exige maturidade e discernimento. As cartas estão embaralhadas... “Se vos parece mal servir ao Senhor, escolhei hoje a quem quereis servir: se aos deuses a quem vossos pais serviram na Mesopotâmia, ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais. Quanto a mim e à minha família, nós serviremos ao Senhor”.
A condição de povo livre dependeria desta escolha, situação que não foi diferente para os discípulos de Jesus e seus conterrâneos. Enquanto Jesus fazia milagres e os alimentava tudo estava tranquilo e as multidões o seguiam. No momento em que ele pede uma tomada de posição muitos tomam outro rumo e preferem continuar na mediocridade da vida que estavam acostumados. Jesus “Sabendo que seus discípulos estavam murmurando” lança um desafio aos que permaneceram com ele: “Vós também vos quereis ir embora? ”.
Pedro, como de outras vezes responde em nome de todos: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus”.
Ter a coragem de “continuar o jogo” com as cartas embaralhadas a cada dia é um desafio que São Paulo ajuda responder escrevendo aos Efésios: “Vós que temeis a Cristo, sede solícitos uns para com os outros”. Paulo dá uma série de conselhos sobre as relações entre os esposos recomendando que ambos percebam no jogo da vida “Este mistério é grande, e eu o interpreto em relação a Cristo e à Igreja”.
Peçamos também nós a graça, o discernimento e a coragem de seguir ao único e verdadeiro Pão da Vida que alimenta e sustenta nas inseguranças do cotidiano. Tenhamos a certeza do salmista quando reza: “O Senhor pousa seus olhos sobre os justos, e seu ouvido está atento ao seu chamado; Clamam os justos, e o Senhor bondoso escuta; Muitos males se abatem sobre os justos, Mas o Senhor liberta a vida dos seus servos, e castigado não será quem nele espera”.


sábado, 18 de agosto de 2018

HOMILIA PARA A MISSA NA SEMANA DA FAMÍLIA


EU CONFIO NO SENHOR E NADA TEMO

“O Senhor é minha força, meu louvor a salvação, ele fez prodígios e favores, publicai as maravilhas do Senhor”. O profeta Ezequiel faz uma parábola para contar sobre a infidelidade do povo na relação com Deus e conta como Deus “revestiu o seu povo com roupas bordadas, ungiu com perfume, calçou sandálias, enfeitou com joias e corou a cabeça dos seus escolhidos como se fosse salvar uma criança das forças da morte”. O Evangelho toca no cerne das relações familiares e mexe exatamente com a fidelidade matrimonial. A palavra de Jesus é muito clara quando diz que só é permitido o divórcio em caso de união ilegítima. Tal afirmação pode ser melhor entendida nas palavras de São João Paulo II: incompreensões recíprocas, ou quando Francisco diz: “matrimônios que nunca deveriam ter existido”. Em resumo se faltar o amor entre os esposos, termina o respeito e só uma legislação muito rigorosa seria capaz de garantir que a unidade permanecesse embora essa nem sempre fosse sinal de comunhão. Jesus é categórico quando responde aos judeus sobre a lei de Moisés: Ela só deve ser aplicada quando falta o amor, a solidariedade a responsabilidade e o perdão.
Quando falta ingredientes básicos para uma comunhão do casal acontece o que disse São João Paulo II: “Motivos diversos, quais incompreensões recíprocas, incapacidade de abertura a relações interpessoais, etc. podem conduzir dolorosamente o matrimónio válido a uma fratura muitas vezes irreparável. Obviamente que a separação deve ser considerada remédio extremo, depois que se tenham demonstrado vãs todas as tentativas razoáveis. A Igreja não pode abandonar aqueles que por algum motivo procuraram uma segunda união depois de ter feitos todos os esforços para manter o primeiro casamento, reze por eles a Igreja, encoraje-os, mostre-se mãe misericordiosa e sustente-os na fé e na esperança”.
Por sua vez o Papa Francisco afirma: “Quanto às pessoas divorciadas que vivem em segunda união é importante fazer-lhes sentir que fazem parte da Igreja, que “não estão excomungadas” Estas situações exigem acompanhamento e respeito de modo que ninguém se sinta discriminada de nada participando da comunidade. Fazendo isso a Igreja acolhe aqueles que precisaram iniciar uma nova família com o mesmo carinho como Deus fez com o povo de Israel: “banhei-te com água limpa, revesti-lhe com roupas bordadas, calcei uma sandália e te coroei” isso não é um enfraquecimento da fé e das normas da Igreja, mas uma forma de agir com misericórdia diante do sofrimento alheio. De modo que os movimentos, as pastorais e a Igreja inteira tem o dever de acolher, ouvir e compreender aqueles que tanto sofrem quando sua vida matrimonial passa por mares bravios e tempestades que não se acalmam.

HOMILIA PARA O DIA 19 DE AGOSTO DE 2018 - ASSUNÇÃO DE MARIA


DEUS ESTÁ CONTENTE COM VOCÊ

João Cabral de Melo Neto, considerado o maior poeta de língua portuguesa contemporânea, na poesia Morte e Vida Severina se expressa assim: “Somos muitos Severinos, iguais em tudo na vida, morremos de morte igual mesma morte Severina”. De fato, a morte é certa e para todos disto ninguém dúvida. Mas para os cristãos a morte não tem a última palavra e a partir da fé todos podem ter certeza disso: Como se lê na Carta aos Coríntios que é a segunda leitura de hoje: “Na realidade, Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram. Com efeito, por um homem veio a morte e é também por um homem que vem a ressurreição dos mortos. Como em Adão todos morrem, assim também em Cristo todos reviverão”.
Costuma-se dizer que aqueles que morrem dormem à sombra da cruz, até que Cristo os ressuscite para a vida definitiva. Esta foi também a crença dos primeiros discípulos em relação a Maria, Mãe de Jesus. As primeiras comunidades cristãs celebravam a “dormição de Maria”. Tinham a absoluta certeza que assim como ela deu seu sim para que Cristo viesse ao mundo, Ele também teria dado o seu sim para que Maria participasse desde sempre na sua gloria.
A primeira leitura deste domingo mostra de um modo figurativo e muito extraordinário a vitória da vida sobre todas as forças da morte. Diante de um dragão com sete cabeças e dez chifres a mulher grávida dá à luz a um filho, sai vitoriosa para um lugar preparado por Deus enquanto seu filho é levado para Junto de Deus e do seu trono.  A rainha vestida de ouro que entra no palácio real entre cantos de festa e com grande alegria, desde muito cedo os cristãos entenderam que se tratava de Maria Mãe de Jesus.
Ela é a bendita entre as Mulheres, conforme proclamou Isabel. Bendita porque fez a vontade de Deus e não se recusou colocar-se a serviço dos irmãos e das irmãs. Ela mesma cantou as maravilhas que Deus realizou em seu favor.
Com a colaboração de Maria todas as pessoas receberam na pessoa de Jesus Cristo o perdão dos pecados e a certeza da vida definitiva, como diz São Paulo: “Como em Adão todos morreram, assim também em Cristo todos reviverão”.
Por estas razões a Igreja celebra hoje a festa da Assunção de Maria e proclama que ela a Bem-Aventurada, a Cheia de Graça, a Mãe de todos os povos que junto do seu Filho intercede por nós.

sexta-feira, 10 de agosto de 2018

HOMILIA PARA O DIA 12 DE AGOSTO DE 2018 - 19º COMUM ANO B


SEJAM IMITADORES DE DEUS

No documento, “Alegria do Evangelho”, o primeiro do Papa Francisco, ele apresenta para o mundo o que eram as suas convicções e a sua prática na Igreja em Buenos Aires, onde servia como Bispo. No número 49 Ele escreve: “Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo! Repito aqui, para toda a Igreja, aquilo que, muitas vezes, disse aos sacerdotes e aos leigos de Buenos Aires: prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada, por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos”.
É claro que esta afirmação trouxe alegria para muitos, perplexidade para outros, medo para outros e resistência daqueles que estavam acostumados a um estilo e modelo de Igreja presa em “obsessões e procedimentos”, normas, leis, regras e assim por diante. É importante perceber como essa preocupação do Papa não se diferencia da preocupação de Jesus narrada no evangelho deste domingo.
Quando Jesus diz: “Eu sou o pão que desceu do céu, quem dele comer, nunca morrerá. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo”. Sua Palavra traz alegria para muitos, esperança para outros, mas ao mesmo tempo medo e perplexidade aos judeus habituados ao ritmo dos ensinamentos de Moisés que eles haviam transformado num emaranhado de normas e regras, um fardo muito pesado para ser carregado.
Os judeus bem que preferiam manter o ritmo das coisas como estavam acostumados, embora não se davam conta da exclusão que vinham praticando e da falta de misericórdia com que julgavam as pessoas não permitindo que participassem do cotidiano da assembleia.
O tratamento que os conterrâneos dão a Jesus em nada se difere do que os antepassados fizeram em relação aos profetas. Elias, como narra a primeira leitura, também foi incompreendido e perseguido, fugiu para o deserto e desejou a morte. Mas Deus lhe devolve a alegria e o entusiasmo. Alimentando-o não resolve o problema do sofrimento e da perseguição, mas o anima a continuar a missão: “Levanta-se ainda tens um longo caminho a percorrer”.
Sem sombra de dúvida para os cristãos e para a Igreja contemporânea não faltam preocupações, desanimo e perseguição. Para todos vale a palavra de São Paulo: “Seja eliminado do meio de vós tudo o que é azedume, irritação, cólera, insulto, maledicência e toda a espécie de maldade. Sede bondosos e compassivos uns para com os outros e perdoai-vos mutuamente, como Deus também vos perdoou em Cristo. Sede imitadores de Deus, como filhos muito amados. Caminhai na caridade, a exemplo de Cristo”
Buscar e aceitar o batismo não é senão receber um sinal que se pertence a Deus, que se torna morada do Espírito Santo e, por isso mesmo, todo batizado é desafiado a deixar para trás os vícios da pessoa velha: “azedume, irritação, cólera, maledicência, insultos e toda espécie de maldade”. Em resumo Sede imitadores de Deus, como filhos que ele ama. Vivei no amor, como Cristo nos amou”.
Aceitar o evangelho implica ter a coragem de sair do comodismo e das práticas habitais de ser cristão para ir ao encontro daqueles que que mais necessitam da ajuda e do testemunho.

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

HOMILIA PARA O DIA 05 DE AGOSTO DE 2018 - 18º COMUM - ANO B


RENOVAR-SE CONSTANTEMENTE

É inerente da condição humana buscar soluções rápidas e muitas vezes simplórias para problemas e exigências que, na maioria das vezes, exige planejamento, perseverança e organização coletiva. Entre nós é famoso o “jeitinho brasileiro” de resolver as coisas pelo caminho mais curto, mais fácil e mais rápido ainda que nem sempre mais correto nem tampouco mais honesto.
Prestando bem atenção na história do povo de Deus é possível perceber como o “jeitinho” não é uma coisa exclusivamente brasileira, pelo contrário aparece presente em diversas culturas e arraigado na história. Tanto a primeira leitura como o Evangelho deste domingo tratam desta situação.
A longa e exigente caminhada para a terra prometida a que o povo de Israel foi submetido não foi uma ação assimilada com facilidade por todos e durante todo o tempo. Por diversas vezes perderam o entusiasmo e pensavam em soluções simples, rápidas e que tudo se desse por um caminho mais curto, como num passe de mágica.
A primeira leitura trata do problema da fome, diante da qual o povo não exita de encontrar culpados e preferir outras soluções: “Quem dera que tivéssemos morrido escravos no Egito, quando nos sentávamos junto às panelas de carne e comíamos pão com fartura”. Apesar disso Moisés não perde a esperança e lhes apresenta uma alternativa que implica em solução definitiva e não apenas um paliativo para a fome momentânea. Recolher o maná na quantidade suficiente para continuar a caminhada, não acumular e ser capaz de repartir.
O mesmo fato acontece com Jesus e a multidão que o seguia. Aproximaram-se dele com uma pergunta interesseira: “Mestre quando chegaste aqui”. Jesus não se detém nesta resposta mas aponta o limite da busca e do interesse pelo qual as multidões o seguiam: “Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos. Esforçai-vos não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, e que o Filho do Homem vos dará”.
E o esforço para buscar o alimento que não se acaba está na palavra de São Paulo, na segunda leitura: “Eis pois o que eu digo e atesto no Senhor: não continueis a viver como vivem os pagãos, cuja inteligência os leva para o nada. Renunciando à vossa existência passada, despojai-vos do homem velho, que se corrompe sob o efeito das paixões enganadoras, e renovai o vosso espírito e a vossa mentalidade. Revesti o homem novo, criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade”.
Revestir-se como uma pessoa nova não é algo que se faz uma vez na vida, pelo contrário ele começa no dia do batismo e vai se repetindo por todo o sempre. Ledo engano procurar o batismo porque é tradição de nossos pais, ou costume das comunidades. A nossa adesão a Jesus deve partir de uma profunda convicção de que só Ele é o “pão” que nos dá vida. Deus vem, todos os dias, ao encontro das pessoas e os convida escutar a Palavra de Jesus ensinando-lhes os caminhos do amor, da partilha, do serviço. Convém que nos familiarizemos com os métodos e os caminhos de Deus.