sexta-feira, 26 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 28 DE MAIO DE 2023 - DOMINGO DE PENTECOSTES - ANO A

 

A PARTIR DE JESUS TODOS SOMOS REPLETOS DO ESPÍRITO SANTO

No decorrer de nossos dias todos já experimentamos situações de medo e insegurança e quando relatamos essas situações as fazemos sempre com figuras de linguagem para melhor nos fazer entender e para dar a dimensão do ocorrido de modo que os nossos interlocutores não só entendam, mas se sintam envolvidos na narrativa e participantes da situação que contamos. Pois as três leituras deste domingo relatam situações de medo e preocupação pelas quais passavam as comunidades envolvidas nas narrativas.

O texto dos Atos dos apóstolos começa dizendo: “os discípulos estavam todos reunidos no mesmo lugar.  De repente, veio do céu um barulho como se fosse uma forte ventania, então apareceram línguas como de fogo” só depois deste relato eles se dão conta que não se trata de uma situação de medo e insegurança mas percebem como de repente eles se enchem de coragem e determinação: “Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito os inspirava” A leitura termina apresentando as diversas nacionalidades de pessoas que em torno de Jesus e animados pelo Espírito Santo formam a nova comunidade na qual todos se entendem e são capazes de ultrapassar suas diferenças. O que aconteceu com a comunidade dos discípulos, também é o que precisa e pode acontecer com a nossa Igreja que reunida em torno de Jesus e animada pelo Espírito Santo dá testemunho e vive a alegria do Evangelho! A partir dos dons do Espírito Santo já não tem mais lugar para grupos fechados dentro da sua própria verdade, antes a Igreja é impulsionada para superar o medo e acolher a todos nas suas particularidades e diferenças.

A carta de São Paulo que ouvimos na segunda leitura se destina a uma comunidade quase perfeita, aos coríntios faltava umas poucas coisas entre elas o amor fraterno. Paulo os compara a um corpo: “Como o corpo é um, embora tenha muitos membros, e como todos os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo” e, portanto, ninguém tem o direito de se achar melhor ou mais importante que o outro, porque todos vivem em função de uma única e mesma causa: “Há diversidade de dons, mas um mesmo é o Espírito. Há diversidade de ministérios, mas um mesmo é o Senhor. Há diferentes atividades, mas um mesmo Deus que realiza todas as coisas em todos. De fato, todos nós, judeus ou gregos, escravos ou livres, fomos batizados num único Espírito, para formarmos um único corpo” Em todos os tempos e lugares e para todos os tempos e lugares precisa ficar claro que cada pessoa com seus dons e carismas deve se colocar a serviço de todos. Ninguém tem o direito de guardar os dons para si ou julgar que é mais importante e necessário que os demais.

Quando temos medo e estamos inseguros, é muito importante ouvir a expressões do tipo: “Aquiete seu coração, conte comigo, se precisar de mim estou a seu lado”. Pois foi isso que Jesus ofereceu aos medrosos discípulos: “A paz esteja com vocês... recebam o Espírito Santo... perdoem os pecados...”

Eles não estavam entendo nada do que havia acontecido duvidavam de tudo e de todos, porém a palavra de Jesus faz deles uma comunidade de reconciliados uma assembleia pronta para a missão: “Assim como o pai me enviou eu também os envio”. Eles são desafiados a anunciar a alegria da ressurreição e o perdão para todos.

O que acontece naquele momento com os discípulos se realiza pela força do Espírito Santo que dá a conhecer todos os seus dons e carismas para serem colocados em comum, cada um a seu modo, mas para o bem de todos. O Espírito empurra os discípulos para o mundo e os anima a viver o amor de Jesus com todas as suas consequências.

Também para nós deve ficar claro que não existe outra razão para existir como Igreja se não para acolher e promover o perdão que alcance a todos.

Aprendamos com Maria, que estava no cenáculo com os apóstolos, e rezemos com ela pedindo para nossa Igreja um espírito missionário e fervoroso: “Senhor vem dar-nos sabedoria que faz ser tudo como Deus quis”.

quarta-feira, 17 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 21 DE MAIO DE 2023 - ASENSÃO DO SENHOR - ANO A

 

ENVIADOS PARA FALAR E OUVIR COM O CORAÇÃO

 

Do ponto de vista fisiológico o coração tem a função primeira de bombear o sangue para todo o corpo. Entretanto do ponto de vista afetivo e ao longo da história poetas, cantores, atores e todas as pessoas em qualquer lugar e condição em que se encontram atribuem muitas outras funções para o coração. Duas delas o Papa Francisco retoma na mensagem que escreveu para o Dia Mundial das Comunicações Sociais que é celebrado nesse domingo da Ascensão do Senhor. O papa recorda que à medida que estas duas funções se desenvolvem de modo equilibrado a pessoa é capaz de sentir o pulsar do coração alheio com a mesma clareza que sente do seu próprio.

No domingo da Ascensão todos os cristãos são convidados a falar e escutar as alegrias, as esperanças, as tristezas e as angústias de todas as pessoas do nosso tempo. Esta tarefa Jesus confiou aos discípulos por ocasião da sua despedida: “Toda a autoridade me foi dada no céu e sobre a terra. Portanto, ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e ensinando-os a observar tudo o que vos ordenei! Eis que eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo".

 A Ascensão de Jesus, mais do que marcar o fato do distanciamento físico entre o Mestre e os discípulos, marca a etapa final da missão que Ele recebeu do Pai, e que cumpriu com plena maestria, e deixa clara que a tarefa de dar continuidade cabe à comunidade dos discípulos em todos os tempos. Isso significa cabe a nós cristãos do século XXI testemunhar Jesus e o seu Evangelho para todos os povos.

Esta tarefa merece ser cumprida com a clareza como foi dada aos discípulos: “Jesus foi levado ao céu, à vista deles. Uma nuvem o encobriu, de forma que seus olhos não mais podiam vê-lo. Os apóstolos continuavam olhando para o céu, enquanto Jesus subia. Apareceram então dois homens vestidos de branco, que lhes disseram: Homens da Galileia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu? Esse Jesus que vos foi levado para o céu, virá do mesmo modo como o vistes partir para o céu".

Somos a Igreja de Jesus Cristo chamada todos os dias a “caminhar juntos”, falar e ouvir com o coração apresentando e testemunhando a todos sem distinção o projeto do Reino de Deus. Os novos desafios que o mundo nos apresenta precisam ser enfrentados à luz dos ensinamentos de Jesus, sem medo e com criatividade.

Este é também o convite feito por Paulo na carta aos Efésios. Os discípulos não podem facilitar que foram chamados a caminhar juntos e anunciar a esperança como membros de um único e mesmo corpo cuja cabeça é Jesus Cristo: “Que ele abra o vosso coração à sua luz, para que saibais qual a esperança que o seu chamamento vos dá, qual a riqueza da glória que está na vossa herança com os santos”

Essa tarefa deve ser levada a cabo com o coração cuja força é capaz de dissipar as sombras do mundo fechado e dividido e no seu lugar construir a civilização do amor.

Nesse dia da Ascensão tenhamos clareza que a nossa comunicação deve proclamar aquilo que rezamos no salmo:

Porque Deus é o grande Rei de toda a terra, *
ao som da harpa acompanhai os seus louvores!

Deus reina sobre todas as nações, *

 

quinta-feira, 4 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 14 DE MAIO DE 2023 - 6º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 NÃO LHES DEIXAREI ÓRFÃOS!

Sentir-se apoiado e amparado diante das situações difíceis que a vida oferece com grande frequência é sempre um consolo e uma espécie de porto seguro. Aliás costuma-se usar a expressão “Porto Seguro” para fazer referência a situações e pessoas que em determinado momento da vida servem de apoio e ajuda quando aparecem as complicações e dificuldades por diferentes causas e motivos.

A Palavra de Deus proclamada na liturgia desse domingo é uma espécie de “porto seguro” ou melhor ainda uma maneira de fazer perceber como Deus age e está presente no cotidiano de modo discreto e tranquilizador.

O texto do Evangelho é parte de uma longa conversa que Jesus tem com seus discípulos na qual ele deixa claro que chegou a hora em que eles mesmos devem alçar voo com suas próprias asas e forças. Obvio que a comunidade dos seguidores ficou perplexa e insegura com a afirmação de Jesus que soa como se fosse um testamento. Jesus conclui a sua fala lhes garantindo presença e cuidado, mas agora de uma maneira diferente daquela que os discípulos tinham experimentado: “Pouco tempo ainda, e o mundo não mais me verá, mas vós me vereis, porque eu vivo e vós vivereis. Não vos deixarei órfãos. Eu virei a vós. Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará um outro Defensor, para que permaneça sempre convosco”

Fica claro para os discípulos que sua vida, sua missão e a comunidade que foi constituída por Jesus se tornará a morada de Deus no mundo e que as pessoas irão reconhecer isso mediante o testemunho de suas vidas. Durante sua vida terrena Ele mesmo foi a segurança que os discípulos precisavam e por suas ações se deu a conhecer como o “rosto misericordioso do Pai” a partir de agora será o Espírito Santo quem vai cuidar dos discípulos. Deus continuará sua presença discreta e segura no mundo de uma outra maneira.

O Espírito que o Pai enviará vai agir de duas maneiras: uma conservando a memória e os ensinamentos de Jesus e outra dando segurança aos discípulos na missão que estavam recebendo. Os sofrimentos de Cristo continuam se repetindo na vida de tantas pessoas perto de nós. Muitas vezes nos sentimos impotentes e sofremos de modo desmedido. Vemos que o mundo se organiza muitas vezes de modo egoísta e injusto, mas é certo que o Reino de Deus vai chegar.

A primeira leitura é a prova mais perfeita da presença de Jesus no meio deles que realizam com suas ações e na comunhão de uns com os outros na medida em que a comunidade dos discípulos vive sua fé formando uma grande comunidade que caminha junto e se mostra reunida com o Pai e com Jesus: “Naqueles dias, Felipe desceu a uma cidade da Samaria e anunciou-lhes o Cristo. Os apóstolos, que estavam em Jerusalém, souberam que a Samaria acolhera a Palavra de Deus, e enviaram lá Pedro e João. Chegando ali, oraram pelos habitantes da Samaria, para que recebessem o Espírito Santo”. Os judeus tinham preconceitos em relação aos samaritanos, considerando-os impuros, mas os discípulos mostram como a Igreja nascente não tinha fronteiras e na alegria anunciava a boa noticia de Jesus.

Na carta de Pedro mais uma vez fica clara a intenção do autor que consiste em reanimar a comunidade que vivia confrontada com as hostilidades do mundo. As palavras do apóstolo têm o objetivo claro de estimular os destinatários para mostrar o amor de Jesus Cristo ao mundo mesmo no contexto das perseguições e dificuldades: “Caríssimos: Santificai em vossos corações o Senhor Jesus Cristo, e estai sempre prontos a dar razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la pedir. Fazei-o, porém, com mansidão e respeito e com boa consciência”.

Estas palavras deixam claro que uma comunidade que vive a comunhão com Jesus e com todos partilhando a mesma fé é uma comunidade que não precisa ter medo porque é na comunhão e solidariedade que todos podem reconhecer a presença de Jesus que se manifesta na força do Espírito Santo renovando todos e cada um. Então sim todos podemos cantar com o salmista:

Aclamai o Senhor Deus, ó terra inteira,
cantai salmos a seu nome glorioso!

 



 

terça-feira, 2 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 07 DE MAIO DE 2023 - 5º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 

JESUS, O CAMINHO PARA O PAI

 

Todas as experiências de separação e de perdas afetam profundamente o nosso dia a dia. Sofremos profundamente com tudo aquilo que frustra as nossas expectativas e diante desta realidade facilmente somos fadados a perder a esperança e nos deixar tomar pelo desânimo, a tristeza e a desilusão. Esta situação foi experimentada pelos discípulos de Jesus que não haviam entendido as referências que o Mestre lhes havia dado durante os dias de sua vida terrena. Depois da morte de Jesus, definitivamente os discípulos se sentiram completamente perdidos, sem rumo e sem perspectiva para continuar qualquer atividade que lhes fosse apresentada.

A Palavra de Deus que ouvimos nesse domingo foi o ponto de partida para os discípulos compreenderem a nova situação da sua vida e missão, ela serve ao mesmo tempo para a Igreja e para cristão contemporâneo. As desilusões que a vida nos oferece devem servir para fortalecer a nossa resiliência e renovar sempre nosso testemunho do amor de Deus ao mundo. Em outras palavras a viver a Alegria do Evangelho!

Jesus deixa claro aos discípulos que aceitar a sua condição como Caminho que leva ao Pai implica renovar-se sempre e de novo colocar-se na dinâmica de também estar a serviço da vida e da qualidade de vida para todas as pessoas.

Aceitar Jesus como caminho, verdade e vida consiste em se tornar sempre gente nova que se reconstrói na doação total aos irmãos e às irmãs, significa sair do seu egoísmo e colocar-se a serviço das pessoas em todos os lugares e em todos os tempos.

Claro está que quem se coloca no caminho da doação nem sempre é uma pessoa totalmente perfeita e santa. Seja a pessoa, seja a Igreja todos fazem parte de uma comunidade de gente que busca a perfeição e a santidade, mas que apesar disso traz em si mesmo as marcas do pecado e da imperfeição. Tanto os discípulos de outrora como os cristãos contemporâneos, todos somos convidados a ser uma comunidade de diáconos na qual uns estão a serviço dos outros e certos que apesar das imperfeições e deslizes todos são conduzidos e animados pelo Espírito Santo. Como os diáconos daquele tempo cada pessoa que recebe ou assume uma função ou tarefa na comunidade não faz para a promoção pessoal nem para concretizar sonhos egoístas, mas desempenham a tarefa em benefício dos irmãos e das irmãs.

Na segunda leitura, Pedro deixa claro que todos formamos o templo espiritual, porém deve ficar claro que isso se manifesta à medida que nela se reconhecer Jesus como a Pedra Principal. Permanecer unido e no caminho de Jesus é a única e decidida maneira de se apresentar diante de Deus com aquilo que temos de mais precioso: nossa vida e nosso amor.

O Espírito Santo, que delicadamente conduz a história, nos impulsione, como comunidade eclesial, a viver a alegria, a verdade, a justiça e a paz.

 

sexta-feira, 21 de abril de 2023

HOMILIA PARA O DIA 23 DE ABRIL DE 2023 - 3º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 

PARTIR E REPARTIR O PÃO PARA RECONHECER JESUS

 

Não são raras nossas experiências de frustração e desencanto. Frequentemente vemos nossos sonhos se desfazerem como bolhas de sabão. Desiludidos diante destas situações resta nos lamentar e partilhar com outros que experimentam a mesma sensação de perdas e sofrimentos.

Situação de desolação é a que vivia a comunidade dos seguidores de Jesus depois da sua morte. O Texto do Evangelho de hoje, Lucas escreveu quase 50 anos depois da morte de Jesus. Recuperando um fato contado de boca o autor tem a intenção de reanimar a comunidade do seu tempo que estava atravessando mais uma das grandes crises e provações.

O que merece ser destacado no Evangelho é a maneira como se dá o encontro de Jesus com os desiludidos discípulos que caminhavam sem rumo depois da sua morte. Duas coisas são fundamentais: Recordar a Palavra de Deus transmitida por Moisés e os profetas e partir e repartir o pão como ensinou Jesus.

A maneira como Jesus lhes recordou a escritura fez arder o coração e a lição da partilha lhes fez reconhecer Jesus enchendo-os de coragem para retomar a vida e a tarefa que haviam abandonado: “Então disseram um para o outro: Não estava o nosso coração ardendo quando nos explicava as escrituras pelo caminho? No mesmo instante voltaram para Jerusalém e, encontrando os outros reunidos disseram: Nós vimos o Senhor”!

Também para nós serve a lição: As desilusões e fracassos da vida são superados quando aprendemos com Jesus a lição da partilha. Jesus continua caminhando conosco, para que nossos olhos se abram resta-nos aprender a lição da fraternidade. Muitas vezes sonhamos com coisas extraordinárias e intervenções espetaculares, esta não é a lógica de Deus. Ele caminha ao nosso lado nas estradas do mundo se o reconhecemos nossos sonhos não serão frustrações e devaneios.

A primeira leitura reafirma a ideia de um messias que passou pelo mundo realizando gestos que testemunhavam o jeito de ser de Deus, por causa disso foi condenado e morto, mas Deus o ressuscitou: “Gente de Israel, ouçam estas palavras: Jesus de Nazaré foi um homem em quem Deus confiava e que provou isso por meio de milagres e sinais realizados no meio de todos, apesar disso foi condenado a morte de uma maneira perversa. Mas, Deus o ressuscitou livrando-o dos laços da morte”.  Tal como Pedro cada cristão do nosso tempo é convidado a testemunhar Jesus no mundo de hoje.

Na segunda leitura, o autor da carta de Pedro nos convida a reconhecer o amor de Deus pelo mundo que se revelou na cruz de Jesus. A carta é um convite para manter a fidelidade e a firmeza da fé apesar das hostilidades e sofrimentos presentes em todos os tempos: “Lembrem-se que não foi com coisas corruptíveis, nem com ouro e prata que Deus se deu a conhecer, mas pelo sangue derramado na cruz”. Portanto sejam firmes na esperança, no amor, na solidariedade. Vivam com alegria, coragem e coerência aquilo que acreditam.

Então sim podemos cantar:

Mostrai-me Senhor o Caminho da vida!

Bendigo o Senhor por me ter aconselhado,
até de noite me inspira interiormente.
O Senhor está sempre na minha presença,
com Ele a meu lado não vacilarei.

quarta-feira, 12 de abril de 2023

HOMILIA PARA O DIA 16 DE ABRIL DE 2023 - 2º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 EU CREIO NUM MUNDO NOVO...

Expressões do tipo: “Em cima do muro”; “andar no escuro”; “cair para trás” e uma série de outras deste gênero são usadas em nosso cotidiano para indicar medo e insegurança em relação às responsabilidades e atividades que precisamos desenvolver. Pois o Evangelho deste domingo começa descrevendo algumas situações desta natureza pelas quais estavam passando os discípulos de Jesus logo após a sua trágica morte. O evangelho começa dizendo: “Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam...” Mais do que estar nestas condições, as expressões indicam que os discípulos estavam perdidos e desiludidos em relação a tudo o que acreditavam e ao futuro da sua condição de seguidores de Jesus de Nazaré.

Porém a continuidade do Evangelho e as outras leituras nos apresentam uma comunidade de gente que renasce das cinzas e à sombra da Cruz ganha coragem para recomeçar todos os seus projetos. As aparições de Jesus e a maneira como elas se realizam apontam com clareza que Jesus, agora ressuscitado, continua sendo o centro da comunidade. Reunidos os discípulos recebem a missão e a força para colocar em prática: “Jesus entrou e pondo-se no meio deles, disse: "A paz esteja convosco". Como o Pai me enviou, também eu vos envio. Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos". Enquanto estamos sozinhos somos um agrupamento de pessoas medrosas e sem rumo, mas à medida que reconhecemos Jesus nos tornamos fortes e corajosos diante das adversidades e medos que o mundo nos impõe.

A consequência deste reencontro com Jesus está descrita na primeira leitura. Os Atos dos Apóstolos fazem uma fotografia da comunidade cristã nascida em torno da pessoa de Jesus e fiel em algumas pequenas, mas significativas ações: “Eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna na fração do pão e nas orações. Todos os que abraçavam a fé viviam unidos e colocavam tudo em comum; frequentavam o Templo, partiam o pão pelas casas e, unidos, tomavam a refeição com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e eram estimados por todo o povo”. Também nós cristãos do século XXI somos convidados a reconhecer Jesus Cristo e a partir dele estabelecer um estilo diferente de vida sustentado nas mesmas práticas das primeiras comunidades.

Na mesma linha Pedro, na segunda leitura, fala aos cristãos do seu tempo: “Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Em sua grande misericórdia, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, ele nos fez nascer de novo, para uma esperança viva, para uma herança incorruptível, que não se mancha nem murcha”. O Apóstolo reconhece todas as provações e sofrimentos aos quais a comunidade está sujeita, mas deixa bem claro que: “Graças à fé, e pelo poder de Deus, vós fostes guardados para a salvação que deve manifestar-se nos últimos tempos. Isto é motivo de alegria para vós, embora seja necessário que agora fiqueis por algum tempo aflitos, por causa de várias provações”.

Não tenhamos medo, nem sejamos fracos como Tomé, não queiramos ir sozinho ao encontro de Jesus, antes na comunidade e junto com todos proclamemos: “Meu Senhor e meu Deus”! E rezemos com o Salmista:

Dai graças ao Senhor,

porque Ele é bom;

eterna é a sua misericórdia!

 

 



quinta-feira, 30 de março de 2023

HOMILIA PARA O DIA 09 DE ABRIL DE 2023 - DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 

DOMINGO DA PÁSCOA

NA RESSURREIÇÃO DO SENHOR

 

“Por sua morte a morte viu o fim, no sangue derramado a vida renasceu. Seu pé Ferido nova estrada abriu e neste homem o homem enfim se descobriu.”

 

O texto deste hino litúrgico entoado pelas comunidades neste domingo da páscoa proclama o cerne da fé na ressurreição de Jesus e no mundo novo que começou com este fato. Não sem razão o salmo da liturgia proclama: “Este é o dia que o Senhor fez para nós, exultemos e nele nos alegremos”.

O dia do Senhor que faz memória do extraordinário fato realizado por Deus Pai com Jesus é celebrado em todos os tempos como o início da nova criação. Tanto o texto do evangelho de João, que se proclama nas missas do domingo pela manhã, quanto o texto de Lucas previsto para a missa da noite, ambos não contam propriamente o fato da ressurreição, mas a experiência de um encontro e isto muda a vida das pessoas e das comunidades.

A mesma condição vivida pelos amigos de Jesus precisa ser experimentada pelas pessoas no século XXI. Não se trata de um dia cronológico para realizar diferentes atividades daquelas do cotidiano, trata-se de um momento para celebrar a descoberta de um Deus que se fez  humano. Celebrar a ressurreição de Jesus significa compreender que a plenitude da existência consiste em colocar toda a vida com todos os seus dons e capacidades a serviço de todos. Por sua morte e ressurreição Jesus se torna o exemplo mais perfeito e confirma essa verdade: "Por sua morte a morte viu o fim, no sangue derramando a vida renasceu, seu pé ferido nova estrada abriu e nesse homem o homem enfim se descobriu". 

 Reunir-se para celebrar a ressureição implica deixar transparecer no cotidiano da história a experiência da comunhão feita com a pessoa de Jesus de Nazaré. Na ressureição de Jesus se concretiza a profecia do velho Simeão quando o menino foi apresentado no templo: “Sol da justiça que nos veio visitar”.

 

HOMILIA PARA O DIA 08 DE ABRIL DE 2023 - SÁBADO SANTO - ANO A

 

SÁBADO SANTO  

VIGÍLIA PASCAL 

CELEBRAÇÃO DA RESSURREIÇÃO

O texto da proclamação da páscoa que se reza na celebração do sábado santo permite descrever esta festa como uma “noite mil vezes feliz”, ou como dizia Santo Agostinho: “Mãe de Todas as Vigílias”, não uma noite de espera, mas a própria festa.

A comunidade reunida celebra esta noite num cenário muito parecido com aquele vivido pelos discípulos de Jesus. Isto é, desolação e sofrimento. A campanha da fraternidade apontou para isso dizendo que os laços comunitários e sociais se fragilizaram, a dignidade da vida e a própria vida é ameaçada, o cenário de fome que assola multidões parece nos deixar incapazes de tomar qualquer atitude que não seja dispensar as multidões para que procurem a seu modo alguma coisa para comer. Ontem, como hoje continua a ressoar em nossos ouvidos a Palavra de Jesus: “Vocês não precisam mandar ninguém embora. Deem vocês mesmos de comer”

No conjunto as leituras, os salmos e as orações desta noite conduzem os participantes ao cerne do mistério da criação e da redenção. Narrando a obra criadora de Deus o livro do Gênesis faz perceber com clareza a mão de Deus que está no início de tudo. O texto do Êxodo confirma a presença de Deus diante de todas as provações e desafios que a humanidade experimenta e o profeta convida a estabelecer uma nova forma de relacionamento entre as pessoas e com o mundo.

São Paulo que já havia feito a experiência do encontro com Jesus tem certeza e fortalece a esperança de todos dizendo que em Cristo todos se renovam, morre o que é já não tem mais sentido para fazer renascer algo totalmente novo, uma nova criatura: “Banhados em Cristo somos nascidos de novo, as coisas antigas já se passaram”.

As palavras que Jesus dirige às mulheres de Jerusalém são adequadas para cada pessoa nestes novos tempos: “Não procurar entre os mortos aquele que está vivo, ir ao encontro do mundo e proclamar que o Senhor ressuscitou tendo convicção e vivendo como ele também todos ressuscitarão”. Os sofrimentos pelos quais passou Jesus e pelos quais passa a humanidade são necessários para quem quer experimentar a páscoa da Salvação.

HOMILIA PARA O DIA 07 DE ABRIL DE 2023 - SEXTA FEIRA DA PAIXÃO - ANO A

 

SEXTA FEIRA SANTA DA PAIXÃO DO SENHOR

As mudanças que ocorrem no mundo e que afetam tudo e todos são de algum modo também sinais de violência. As guerras regionais e outras de proporção gigantesca que ameaçam o mundo todo. As relações comerciais e os interesses pouco humanitários que movimentam a economia mundial são causadores de fome, miséria e exclusão que multidões pelo planeta.

É neste contexto que a Igreja faz memória dos sofrimentos de Cristo e convida a comunidade que se reúne em oração a fazer o mesmo. Memória do sofrimento de Cristo não para fazer chorar as dores do redentor, mas para perceber como Ele de modo voluntário e decidido abraçou tudo isso para transformar em vida e vitória.

Reconhecer o gesto redentor de Jesus é também reconhecer que a páscoa de Jesus pode se realizar no meio do mundo tornando os sofrimentos do tempo presente como verdadeiros eventos nos quais o mistério da páscoa também se realiza.

Como disse o Papa Bento XVI  “A cruz é uma expressão do louco amor de Deus para o mundo e que se abandona não para mostrar sofrimento e por meio dele fazer o mundo sofrer, mas livrar o ser humano do medo da morte e fazê-lo receptivo à redenção que se deu pela Cruz”.

HOMILIA PARA O DIA 06 DE ABRIL DE 2023 - QUINTA FEIRA DA SEMANA SANTA - ANO A

 

QUINTA FEIRA DA SEMANA SANTA –

CELEBRAÇÃO DA CEIA DO SENHOR

 

Com a celebração da “Missa do Lava Pés”, como é popularmente chamada a Eucaristia da noite de Quinta Feira Santa, a Igreja encerra o tempo da quaresma e dá início ao tríduo pascal que se estende até o Domingo da Páscoa.

Lá no Antigo Testamento, o povo de Israel foi convidado a celebrar a páscoa e a compreender que o clima de medo e insegurança que estava reinando no acampamento não poderia se limitar a isso, pelo contrário, na páscoa se realiza o gesto favorável de Deus contra o sofrimento dos seus amigos. A páscoa é para eles desde aquele tempo a garantia de que o Amor de Deus os salvou e por isso mesmo são chamados a fazer memória para sempre.

Repetindo de forma solene o gesto de Jesus na última ceia a comunidade cristã é convidada a perceber os sofrimentos de todos e ao mesmo tempo a coragem de Jesus para transformar tudo isso em serviço, em alegria, em luz e em pré-anuncio da ressurreição.

Reunidos em assembleia de oração todos são chamados a dizer como São Paulo: transmito a vocês o que eu mesmo recebi: façam isto em memória de mim. Transformar a Eucaristia em serviço é um jeito de tornar Jesus presente no meio de todos e proclamar como se reza no salmo: “que poderei retribuir ao Senhor por tudo o que ele me fez”.

Ao final desta celebração os participantes precisam reconhecer que a Páscoa de Cristo pode brilhar na sociedade atual, e pode ser vista muito mais facilmente na medida em que todos respondam “eis-me aqui, envia-me!”. Que a adoração a Eucaristia se concretize no serviço a todos como um gesto de lavar os pés uns dos outros.

 

 

HOMILIA PARA O DIA 02 DE ABRIL DE 2023 - DOMINGO DE RAMOS E DA PAIXÃO DO SENHOR - ANO A

 NA CRUZ A VITÓRIA DA VIDA

A aparente contradição entre os dois textos do Evangelho que são proclamados nesse Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, é apenas mais uma oportunidade para perceber como Jesus foi reconhecido por uma grande parcela da população e traído por quem tinha o poder de decidir e determinar o destino da cidade e das pessoas.

Na celebração do Domingo de Ramos está diante de nós um Deus que confirma sua missão de partilhar da nossa condição humana e do meio de todos os sofrimentos e provocações estimular a todos a deixar morrer tudo o que não condiz com a qualidade e a dignidade da vida.

O cumprimento da profecia de Isaias: “Eis que o teu rei vem a ti, manso e montado num jumento, num jumentinho, num potro de jumenta". Não é outra forma de entender se não que ele é o Servo Sofredor descrito na primeira leitura: “Ofereci as costas para me baterem e as faces para me arrancarem a barba; não desviei o rosto de bofetões e cusparadas. Mas o Senhor Deus é meu Auxiliador, por isso não me deixei abater o ânimo, conservei o rosto impassível como pedra, porque sei que não sairei humilhado”. Desde muito cedo os cristãos reconheceram que em Jesus se cumpria tudo o que havia sido dito pelos profetas e que nele todos seriam restabelecidos e aproximados de Deus e dos seus projetos. Em Jesus somos convidados a fazer de nossa vida um serviço radical em favor de todos. Não temos o direito de permanecer indiferentes diante do sofrimento dos que estão próximos de nós.

São Paulo escreve aos filipenses que é uma comunidade quase perfeita, e por isso mesmo ele sugere aos destinatários da carta que tomem como modelo a pessoa de Jesus: “Jesus Cristo, existindo em condição divina, não fez do ser igual a Deus uma usurpação, mas ele esvaziou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz. Por isso, Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome”. Essa insistência de Paulo serve para cada um de nós. Deixar nossa arrogância e autossuficiência são as condições indispensáveis para alcançar a plena realização para nossas vidas.

As aclamações que todos fazem a Jesus enquanto entra na cidade de Jerusalém: “Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor”, se misturam com as condenações que o levam a morte na cruz. Jesus não se deixa elevar pela efusiva saudação do Domingo de Ramos, como também não se deixa abater pela condição de crucificado. O relato da paixão e morte é apenas a antecipação da alegria que vamos experimentar no domingo da páscoa e que nós rezamos com o salmista:

Anunciarei o vosso nome a meus irmãos *
e no meio da assembleia hei de louvar-vos!

Vós que temeis ao Senhor Deus, dai-lhe louvores,

glorificai-o, descendentes de Jacó, *
e respeitai-o, toda a raça de Israel!

 





quarta-feira, 22 de março de 2023

HOMILIA PARA O DIA 26 DE MARÇO DE 2023 - 5º DOMINGO DA QUARESMA - ANO A

 

PARA ALÉM DA MORTE A VIDA DEFINITIVA

 

Perdas e situações de luto e dor são frequentes em nossa vida. Lidar com essas experiências requer muito equilíbrio físico e emocional. Facilmente nos revoltamos contra tudo e contra todos. Dentre as situações mais difíceis que somos obrigados a enfrentar uma delas é a morte e ainda mais quando se trata da morte de pessoas que amamos. A morte é uma dor sem nome que enche nossos olhos com a neblina da saudade.

Porém, para os que acreditam na Palavra de Jesus Cristo a morte é a travessia deste mundo para a situação de vida plena na qual Deus enxugará toda lágrima dos nossos olhos.

A Palavra de Deus deste domingo nos garante que o desígnio de Deus nos faz superar todas as finitudes e fragilidades desta vida que é efêmera e passageira.

O profeta Ezequiel fala para um povo desiludido e sem esperança garantindo-lhes que mesmo quando tudo parece perdido Deus continua transformando o desespero em coragem. Em cada instante da história Deus está presente recriando o que havia sido perdido: “Ó meu povo, vou abrir as vossas sepulturas e conduzir-vos para a terra de Israel; e quando eu abrir as vossas sepulturas e vos fizer sair delas, sabereis que eu sou o Senhor”.

Ontem como hoje Deus age por meio de pessoas como o profeta Ezequiel que por meio de palavras e exemplos fazem reacender a esperança em mundo novo.

Na carta aos Romanos Paulo deixa claro para aqueles que aceitaram Jesus Cristo e a sua Palavra que estes já não vivem mais somente sob a realidade finita da carne humana, mas já carregam em si uma vida guiada pelo Espírito: “Vós não viveis segundo a carne, mas segundo o Espírito. Cristo está em vós, embora vosso corpo esteja ferido de morte por causa do pecado, vosso espírito está cheio de vida, graças à justiça. E, se o Espírito daquele
que ressuscitou Jesus dentre os mortos mora em vós, então aquele que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também vossos corpos mortais por meio do seu Espírito que mora em vós”.

A relação de Jesus com Marta, Maria e Lázaro é conhecida por outros fatos relatados no Evangelho. No texto de Hoje fica claro que Jesus, embora amigo dos três não faz questão de modificar o curso da vida. Quando fica sabendo da doença de Lázaro não se apressa em ir ao seu encontro para não o deixar morrer. E quando o encontra sepultado a quatro dias ele sofre com as irmãs e os amigos. Diz o Evangelho que Jesus “comoveu-se interiormente”.

Mas o diálogo com as irmãs prova que a morte física não passa de um sono do qual todos os que nele acreditam acordarão para a vida definitiva: “Senhor, se tivesses estado aqui ,meu irmão não teria morrido” E Jesus lhe desafia: “Eu sou a ressurreição e a vida. Você acredita nisso? Respondeu ela: "Sim, Senhor, eu creio firmemente que tu és o Messias, o Filho de Deus, que devia vir ao mundo".

Contrariando todas as expectativas humanas Jesus ordena ao que estava morto: “Jesus levantou os olhos para o alto e disse: "Pai, eu te dou graças porque me ouviste. Eu sei que sempre me escutas. Mas digo isto por causa do povo que me rodeia, para que creia que tu me enviaste". Tendo dito isso, exclamou com voz forte: Lázaro, vem para fora!" O morto saiu”.

O que Jesus realiza confirma sua fidelidade à missão que o Pai lhe havia confiado. Para quem crê em Jesus a morte física não é uma destruição nem aniquilação da vida, mas apenas passagem para uma vida plena junto de Deus.

Peçamos a graça e a coragem de não nos deixar abater pelas situações de tristeza e de dor que o cotidiano nos oferece, mas que tenhamos a coragem de proclamar como as irmãs de Lázaro: “Eu creio Senhor que és a ressurreição e a vida”.

Rezemos com o salmista:

No Senhor ponho a minha esperança,*
espero em sua palavra.

A minh'alma espera no Senhor *
mais que o vigia pela aurora. 

 

 

 

 

 

 

quinta-feira, 16 de março de 2023

HOMILIA PARA O DIA 19 DE MARÇO DE 2023 - 4º DOMINGO DA QUARESMA - ANO A

 

Ó LUZ DO SENHOR QUE VEM SOBRE A TERRA...

Em diversas ocasiões quando estamos diante de algum problema de difícil solução usamos expressões do tipo: “Preciso de uma luz”; ou então “É como caminhar no escuro” e por adiante. As três leituras desse domingo nos apresentam pessoas em situações que exigem discernimento, precisam de uma luz. Nos três casos o resultado é sempre a experiência de “encontrar uma clareira diante das situações do cotidiano.

O texto de Samuel que ouvimos na primeira leitura não usa a expressão “Luz”, mas põe o personagem diante da difícil decisão de escolher entre os filhos de Jessé um para ocupar a função de líder de todo o povo judeu que vivia numa profunda divisão e sem ver luz que resolvesse seus problemas diante dos outros povos.

Note-se que a lógica de Deus vai muito além do que o olhar humano pode ver. Tendo visto a aparência dos filhos de Jessé Samuel estava ainda indeciso sobre qual deles escolher. Inspirado pela “LUZ” do Senhor pede para chamar o último dos filhos: "Estão aqui todos os teus filhos? Jessé respondeu: Resta ainda o mais novo que está apascentando as ovelhas". E Samuel ordenou a Jessé: "Manda buscá-lo, pois não nos sentaremos à mesa enquanto ele não chegar". Jessé mandou buscá-lo. Era Davi. E o Senhor disse: Levanta-te, unge-o: é este!" Samuel tomou o chifre com óleo e ungiu a Davi na presença de seus irmãos”.

O relato é absolutamente claro no sentido de fazer compreender que a escolha parte sempre de Deus e que os seus critérios, a sua lógica, nem sempre coincidem com a nossa.

Paulo escreve à comunidade de Éfeso deixando claro que para quem conheceu Jesus Cristo a vida tem outra dimensão: “Outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor. Vivei como filhos da luz. E o fruto da luz chama-se: bondade, justiça, verdade”. O convite que Paulo dirige aos efésios serve também para nós: Desperta, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e sobre ti Cristo resplandecerá". Na condição de batizados somos conhecedores da Luz do Senhor e não temos o direito de nos fingir de cegos diante dos sofrimentos do mundo.

No Evangelho, mais uma vez, Jesus se confronta com os fariseus e dessa vez numa situação bem particular de uma pessoa que mais do enxergar precisava ser liberto de todas as amarras e prescrições que a religião judaica impunha àqueles que eram acometidos por alguma doença ou deficiência.

Nesse caso o debate se dá em torno de um cego de nascença o qual continuaria nessa condição se não fossem os preconceitos e as cegueiras que o impediam de ver a bondade de Deus.

Antes de realizar a cura do cego Jesus se dá a conhecer como “Luz do mundo” e deixa claro que sua missão é eliminar o orgulho, o egoísmo, a autossuficiência que permeava todas as relações legais das práticas farisaicas.

Para mostrar concretamente porque veio Jesus convidou o cego a tomar uma atitude depois de afirmar que Ele é a luz do mundo e que veio para realizar as obras da Luz o desafiou:  Jesus cuspiu no chão, fez lama com a saliva e colocou-a sobre os olhos do cego. E disse-lhe: "Vai lavar-te na piscina de Siloé. O cego foi, lavou-se e voltou enxergando”.

Todo o diálogo na sequência não é outra coisa senão a reação de uma sociedade indiferente para com o sofrimento alheio e nada preocupada com a qualidade de vida das pessoas. O Cego do Evangelho é apenas mais um dos muitos que vivem “prisioneiros da escuridão”. Dando ouvidos à Palavra de Jesus, o homem que antes dependia das esmolas na porta do Templo, torna-se agora uma pessoa das certezas, dos argumentos, da agilidade, da inteligência. Trata-se de uma pessoa madura, livre e sem medo. Perguntado sobre aquele que lhe abriu os olhos ele respondeu com firmeza: “É um profeta, eu era cego e agora vejo".

Insistindo no descumprimento dos preceitos legais e continuando a pressionar o que tinha sido curado, esse respondeu: “Espantoso! Vós não sabeis de onde ele é? No entanto, ele abriu-me os olhos! Sabemos que Deus não escuta os pecadores, mas escuta aquele que é piedoso e que faz a sua vontade. Jamais se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos a um cego de nascença. Se este homem não viesse de Deus, não poderia fazer nada".

Em resumo o Evangelho nos sugere que deixemos nosso estilo de fariseus fechados num pessimismo inútil de quem vive fechado a Deus e às outras pessoas e nos deixar iluminar pela Luz que é Jesus que pode fazer brilhar a luz que elimina as trevas e que permite reconhecer a mão de Deus que se estende para todas as circunstâncias da vida.

 A quaresma é um tempo de iluminação, deixemo-nos conduzir pela oração, pela esmola, pelo Jejum, pela penitência e deixemos Jesus curar as cegueiras que existem em nós. Que essa quaresma nos facilite enxergar os sofrimentos de tantos que próximo de nós repetem o mandato de Jesus: “Vocês não precisam mandar embora, deem vocês mesmos de comer”.



 

 

quarta-feira, 8 de março de 2023

HOMILIA PARA O DIA 12 DE MARÇO DE 2023 - 3º DOMINGO DA QUARESMA - ANO A

 

ENTRADA LIVRE

Em um recente discurso o Papa Francisco ele afirmou: “Eu as vezes penso que deveríamos colocar na porta das nossas igrejas uma placa dizendo: “Entrada Livre” e continua: “A paróquia deve ser uma comunidade de proximidade, sem burocracia, centrada nas pessoas e onde todos podem encontrar de presente os sacramentos. As paróquias devem ser escolas de serviço e generosidade com suas portas sempre abertas aos excluídos e incluídos. A paróquia não pode ser um clube para poucos. Por favor sejamos audazes, repensemos o estilo de nossas paróquias. Rezemos para que as paróquias aprendam a colocar no centro de suas preocupações a comunhão entre as pessoas e sejam cada vez mais comunidades de acolhimento aos mais necessitados”.

O que o Papa sugere para as paróquias não é outra coisa senão compreender o jeito de ser de Deus, sua presença na história do povo e sua oferta de realização plena. O texto do livro do Êxodo proclamado na primeira leitura relata as dificuldades e desafios enfrentados pelo povo de Israel na caminhada para a Terra Prometida e como nem sempre percebeu a mão de Deus que os conduzia diante de cada nova provação. No episódio de hoje, mais uma vez Deus reage com sua misericórdia e paciência: “Que farei por este povo? Por pouco não me apedrejam! O Senhor disse a Moisés: Passa adiante do povo e leva contigo alguns anciãos de Israel. Toma a tua vara com que feriste o rio Nilo e vai. Eu estarei lá, diante de ti, sobre o rochedo, no monte Horeb. Ferirás a pedra e dela sairá água para o povo beber".

Nos longos desertos da nossa vida, não poucas vezes nos revoltamos com Deus. Apesar disso Ele está ao nosso lado em cada passo da caminhada e sempre nos oferece água que mata a sede de vida, felicidade e possibilidade de caminhar seguros pelas estradas da vida.

A carta de São Paulo aos Romanos é a confirmação da companhia de Deus na história humana, Ele oferece sua ajuda de forma gratuita e incondicional. Dizendo que Deus é justo está claro para São Paulo que Deus supera todas as formas legais e todas as prescrições humanas fazendo sempre prevalecer a bondade e a misericórdia: Justificados pela fé, estamos em paz com Deus, pela mediação do Senhor nosso, Jesus Cristo. Por ele tivemos acesso, pela fé, a esta graça, na qual estamos firmes e nos gloriamos, na esperança da glória de Deus. E a esperança não decepciona”.

O Evangelho confirma como a pessoa de Jesus é a verdadeira presença de Deus, a “água viva” que sacia a todos no caminho da vida. A mulher anônima do Evangelho é a própria comunidade da Samaria que teve “cinco maridos” isso é buscou diversos deuses e nenhum deles foi capaz de lhe saciar a sede. A Samaria continua buscando respostas no passado, mas Jesus lhe abre um caminho para o futuro.

Para todos os que estão agarrados a verdades e costumes que não libertam e tornam melhor a vida o autor do Evangelho de João quer mostrar como o verdadeiro sentido para todas as necessidades humanas é a pessoa de Jesus e nele todos serão guiados e admitidos como filhos e filhas de Deus.

Aos samaritanos Jesus deixa claro o que serve para cada um de nós e que o Papa Francisco chama de ousadia: Em lugar de transformar nossas paróquias em alfândegas do céu somos chamados a nos encontrar e reconhecer Jesus e a partir dele ser comunicadores da Palavra.

Jesus sentado junto ao poço que pertenceu aos antepassados deixa claro que não se trata de cumprir prescrições e normas sobre o lugar e quando reconhecer e louvar a Deus. Ele passa a ser o novo poço e a água que jorra para a vida eterna.

Tal como a Samaritana de outrora também nós somos chamados a abandonar o “cântaro” das nossas respostas limitas, falíveis e incompletas: Então a mulher deixou o seu cântaro e foi à cidade, dizendo ao povo: "Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Será que ele não é o Cristo?"

Ontem como hoje todos somos convidados a não permanecer na segurança de nossas casas e de nossas verdades, mas partir com entusiasmo sendo uma testemunha coerente e entusiasmada próprio de quem encontrou e reconheceu Jesus como água viva e verdadeira que mata toda sede.

Não tenhamos medo de rezar com o salmista:


Vinde adoremos e prostremo-nos por terra,*
e ajoelhemos ante o Deus que nos criou!

Porque ele é o nosso Deus, nosso Pastor, 
e nós somos o seu povo e seu rebanho,*
as ovelhas que conduz com sua mão.