quarta-feira, 5 de julho de 2023

HOMILIA PARA O DIA 09 DE JULHO DE 2023 - DÉCIMO QUARTO DOMINDO COMUM - ANO A

 O MEU JUGO É SUAVE E O MEU FARDO É LEVE

 

Não é raro que nós tenhamos sentimento de rejeição e indignação em relação aos comportamentos pouco gentis e a falta de cordialidade das autoridades e de servidores públicos por exemplo. Pessoas que procuram vender uma imagem que não corresponde com a fineza e a cortesia também são recriminados com bastante facilidade. A arrogância, a prepotência e o orgulho não são sentimentos aprovados nas relações interpessoais.

Pois a liturgia desse domingo mostra exatamente o contrário e nos ajuda a reconhecer Deus que se apresenta vestido de simplicidade, se faz reconhecer na humildade, na pobreza e na pequenez. Um Deus que se apresenta dessa maneira não precisa de força para dar fim às guerras e as disputas pelo poder: Exulta, cidade de Sião! Rejubila, cidade de Jerusalém. Eis que vem teu rei ao teu encontro; ele é justo, ele salva; é humilde e vem montado num jumento, um potro, cria de jumenta”. A atitude desse rei desmonta a visão de mundo, de realeza, de força e segurança que se apresenta com agressividade, com armas e instrumentos sofisticados que consomem muitos recursos que poderiam ser investidos para promover a paz e a concórdia: “Eliminará os carros de Efraim, os cavalos de Jerusalém; ele quebrará o arco de guerreiro, anunciará a paz às nações”.

Na segunda leitura mais uma vez temos São Paulo apresentando duas situações antagônicas entre si: ‘Viver segundo a carne ou viver segundo o espírito’. Aqueles que vivem na primeira condição mostram sua verdadeira face instalados na autorreferencialidade, na prepotência e na arrogância. Aqueles que vivem segundo o espírito reconhecem que a morte de Jesus não terminou com o projeto de Deus, pelo contrário, foi o tormento da cruz que transformou Jesus no servo obediente e fiel a quem o Pai confiou o cuidado de toda a obra criada.

Tal como Jesus também os cristãos que fizerem de sua vida um serviço aos demais serão agraciados, como Paulo mesmo afirmou no último domingo, com a coroa da justiça: “Vós não viveis segundo a carne, mas segundo o espírito, se realmente o Espírito de Deus mora em vós. E, se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos mora em vós, então aquele que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também vossos corpos mortais por meio do seu Espírito que mora em vós”.

No Evangelho Jesus faz um agradecimento a Deus Pai reconhecendo como Ele acolhe, compreende e ama seus filhos e filhas, mas tem uma predileção especial pelos mais fragilizados: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos”. Jesus faz essa louvação para contrastar com os fariseus e doutores da lei que se julgavam melhores e mais perfeitos que todos os demais. Na condição de sábios e autorizados a interpretar as escrituras eles se consideravam os únicos destinatários da salvação. Sem dizer exatamente quem eram os pequeninos parece ficar claro que Jesus está se referindo aos seus discípulos, mas com eles também estão os pecadores, os doentes, os publicanos, as pessoas de má fama. Em lugar de considerar a lei como uma espécie de “linha direta” com Deus Jesus mostra que a misericórdia do Pai não precisa destes subterfúgios e recursos mundanos. A única condição para acessar Deus é seguir Jesus e viver os seus preceitos. Em outras palavras fazer a experiência de estar com Jesus. Ele então conclui o Evangelho com um convite: “Vinde a mim todos vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e eu vos darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e vós encontrareis descanso. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve".

O convite de Jesus expressa o desejo de socorrer todos os que estão excluídos e despidos da dignidade humana. O Vinde a mim, de Jesus é o abraço misericordioso do Pai que acolhe a todos apesar das fraquezas e infidelidades. Ninguém está excluído do abraço de Deus, mas ao mesmo tempo ninguém tem o direito de excluir quem quer que seja dos espaços e dos locais de encontro e de comunhão. Que o Espírito Santo nos ensine e nos faça compreender o que rezamos no salmo.

Misericórdia e piedade é o Senhor,*
ele é amor, é paciência, é compaixão.

O Senhor é muito bom para com todos,*
sua ternura abraça toda criatura.



 

quinta-feira, 29 de junho de 2023

HOMILIA PARA O DIA 02 DE JULHO DE 2023 - SOLENIDADE DE SÃO PEDRO E SÃO PAULO - ANO A

 

TODO JUNTOS EXALTEMOS O SEU NOME!

A pedagogia e as técnicas de relações interpessoais na atualidade consideram de grande valor chamar uma pessoa pelo nome. Alguns dizem que chamar pelo nome significa mais do que oferecer valiosos presentes. O nome significa “você é único”! É comum entre nós que muito antes do nascimento os pais já decidirem que nome vão dar a criança e ala começa a ser chamada ainda no ventre materno com sua identificação que a acompanhará por toda a vida. Muitas vezes o nome acaba sendo associado com a ocupação ou profissão que vai desenvolver ao longo do tempo e daí também decorre muitas das relações de amizade e corresponsabilidade, parceria e até de negócio entre as pessoas.

Pois a liturgia desse domingo nos apresenta as figuras de Pedro e Paulo suas responsabilidades e tarefas decorrem da estreita relação com Jesus e da sua coragem e determinação em reconhece-lo na sua origem e missão.

O diálogo que Jesus estabeleceu com os discípulos e a resposta dada por Pedro, em nome de todos os demais, continua sendo uma pergunta inquietante e não pode nos deixar alheios aos compromissos de quem reconhece Jesus com o Filho de Deus.

Na mesma medida e com a mesma coragem dos apóstolos Pedro e Paulo todos os cristãos tem, de alguma maneira condições de acessar o Reino e de facilitar o acesso para outras pessoas. Não bastam palavras bonitas e longas orações será sempre necessário provar nossa adesão ao projeto pelo compromisso e coerência de vida.

Não bastam bonitas respostas e opiniões genéricas sobre Jesus e sua missão é preciso a coragem de Pedro que não se resumiu a dizer: “Tu és o messias, o Filho de Deus vivo” e a determinação de Paulo: “Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé”.

Fica claro também que a resposta de Pedro e a coragem de Paulo não são decorrentes apenas da sua vontade, elas são o resultado de um encontro pessoal com Jesus, o qual todos nós somos convidados a fazer e cujas possibilidades nos são dadas desde o dia do nosso batismo como dom e graça da parte de Deus.

A primeira leitura mostra uma das ocasiões em que Pedro testemunha com sua vida o que significa acreditar na pessoa e na doutrina de Jesus, por sua vez os atos dos apóstolos deixam claro também que não só Pedro, mas também toda a comunidade estava solidária e comprometida com tarefa dada ao apóstolo e preocupada com o êxito da tarefa: “Enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja rezava continuamente a Deus por ele”. Essa atitude da comunidade não fica sem resposta da parte de Deus: Eis que apareceu o anjo do Senhor e uma luz iluminou a cela. Então Pedro caiu em si e disse: "Agora sei, de fato, que o Senhor enviou o seu anjo para me libertar do poder de Herodes e de tudo o que o povo judeu esperava!"

A segunda leitura é uma espécie de “testamento” ele faz um balanço da sua vida e das suas atividades missionárias e mesmo angustiado com a falta de solidariedade e de compreensão por parte de algumas pessoas e grupos: “Quanto a mim, eu já estou para ser derramado em sacrifício; aproxima-se o momento de minha partida. Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé. Agora está reservada para mim a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos que esperam com amor a sua manifestação gloriosa”.

Estas palavras finais de Paulo são também para nós um convite e uma desafio a percorrer nosso caminho com Jesus com determinação, entusiasmo e generosidade. Tal como Paulo e tantos homens e mulheres na história podemos ter a mesma firmeza de Paulo: “O Senhor esteve a meu lado e me deu forças. O Senhor me libertará de todo mal e me salvará para o seu Reino celeste. A ele a glória, pelos séculos dos séculos! Amém”.

Por isso podemos rezar serenamente com o salmista:

De todos os temores me livrou o Senhor Deus”.

 

 

quinta-feira, 15 de junho de 2023

HOMILIA PARA O DIA 25 DE JUNHO DE 2023 - 12º DOMINGO COMUM - ANO B

 

ATENDEI-NOS SENHOR, POR VOSSO IMENSO AMOR!

Dentre as muitas frases atribuídas a Dom Helder Câmara que foi arcebispo de Olinda e Recife, uma delas diz assim: “É graça divina começar bem. Graça maior persistir na caminhada certa. Mas graça das graças é não desistir nunca”. As leituras deste domingo trazem como destaque a questão do sofrimento e das dificuldades que rondam a vida daqueles que aceitam ser discípulos de Jesus para anunciar o projeto de Deus para o mundo. Mas ao mesmo tempo deixam claro que Deus não abandona aqueles que aceitam caminhar segundo a sua vontade.

Jeremias, cuja primeira leitura ouvimos, é o modelo do profeta sofredor. Ele experimenta todas as formas de perseguição até o abandono, mas em hipótese alguma perde a confiança em Deus e deixa de lado a coerência e a fidelidade: “Eu ouvi as injúrias de tantos homens e os vi espalhando o medo em redor”. Até os amigos mais próximos do profeta fizeram um lobby contra ele, apesar disso, do fundo da sua solidão Jeremias declara: “Mas o Senhor está ao meu lado, como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos. Por não terem tido êxito, eles se cobrirão de vergonha”. Confiante na verdade e autenticidade da sua missão ele expressa um hino de confiança em Deus: “Cantai ao Senhor, louvai o Senhor, pois ele salvou a vida de um pobre homem das mãos dos maus".

Na segunda leitura Paulo, mais uma vez, deixa claro aos cristãos de Roma que não importa a origem de cada pessoa, todos são destinatários da salvação de Deus e que o mais importante é acolher essa proposta. Paulo costuma falar sempre sobre dois aspectos distintos e hoje usa as figuras de Adão e de Cristo. Enquanto o primeiro escolhe o caminho do egoísmo e da autossuficiência que geram a morte como afastamento de Deus, Jesus Cristo escolhe a obediência. Esse caminho faz nascer uma criatura nova, livre e em plena comunhão com Deus. Em Jesus Cristo todos foram libertados do pecado e da morte, a cruz é apenas a aparência do fracasso, mas ao contrário é dessa provação que surge o dinamismo de uma nova vida: “O pecado entrou no mundo por um só homem. Através do pecado, entrou a morte. E a morte passou para todos os homens. A transgressão de um só levou a multidão humana à morte,
mas foi de modo bem superior que a graça de Deus, ou seja, o dom gratuito concedido através de um só homem, Jesus Cristo, se derramou em abundância sobre todos”.

No Evangelho Jesus continua o discurso sobre a missão e deixa claro aos discípulos: “Não tenhais medo daqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma”. Para os que aceitam com fidelidade a missão não faltará a mão generosa de Deus, a ajuda e a presença do próprio Jesus ao longo da jornada: “O que vos digo na escuridão, dizei-o à luz do dia; o que escutais ao pé do ouvido, proclamai-o sobre os telhados”.

A promessa de Jesus no trecho de hoje já estava contida nas bem-aventuranças: “Felizes daqueles que forem perseguidos, insultados, incompreendidos por minha causa”. Não será o medo que deve acovardar os discípulos, acomodando-os dentro de quatro paredes. Quem dá a vida pela causa do Reino não precisa ter medo da morte física, pois o cristão sabe que a vida é um dom de Deus que não termina com a finitude dessa vida terrena. E Jesus conclui seu discurso com um convite a confiança absoluta: “Quanto a vós, até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não tenhais medo! Vós valeis mais do que muitos pardais. Portanto, todo aquele que se declarar a meu favor diante dos homens, também eu me declararei em favor dele diante do meu Pai que está nos céus”. Ora, com um Pai que tem essas características ninguém precisa ter medo, nem tampouco exercer a missão com fraqueza. Esse é também o convite do Papa Francisco: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos. Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: ‘Dai-lhes vós mesmos de comer”.

 

 

HOMILIA PARA O DIA 18 DE JUNHO DE 2023 - 11º DOMINGO COMUM - ANO A

 CHAMADOS A TESTEMUNHAR

A COMPAIXÃO DO SENHOR

Dentre as coisas bonitas que a vida nos oferece uma delas é poder contar com a ajuda e companhia de pessoas que nos amam e com quem podemos partilhar nossas preocupações, dores, sofrimentos, alegrias, esperança e assim por diante. Construir a solidariedade é uma das formas mais extraordinárias que se pode cultivar nas relações interpessoais.

Pois a Palavra de Deus na liturgia desse domingo mostra exatamente essa realidade, porém é Deus mesmo quem caminha e   dá segurança ao povo ao longo da história. Na construção de relações solidárias Deus se faz sentir através de pessoas que ouvem e interpretam as suas disposições para caminhar dando segurança para todos. Isso fica claro na pessoa de Moisés, de Paulo, e da comunidade dos discípulos enviados por Jesus.

Na primeira leitura fica clara a iniciativa de Deus fazendo de Moisés um seu intermediário com a tarefa de fazer uma nação inteira como sinal da sua presença para todos os povos: “Moisés, então, subiu ao encontro de Deus. O Senhor chamou-o do alto da montanha, e disse: "Assim deverás falar à casa de Jacó e anunciar aos filhos de Israel, como vos levei sobre asas de águia, portanto, se ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança, sereis para mim a porção escolhida dentre todos os povos”. A proposta de Deus consiste em garantir libertação definitiva ao povo de Israel. Se depender da vontade de Deus, os israelitas nunca mais experimentarão a escravidão e a opressão que haviam sofrido os seus antepassados.

Na carta aos Romanos Paulo deixa claro que a salvação de todos não é mérito de uns ou de outros, nem tampouco se destina a alguma categoria especial de pessoas. Os discípulos são os primeiros enviados para mostrar ao mundo o incondicional amor de Deus pela humanidade. O amor de Deus tem dimensões espantosas: “Quando éramos ainda fracos, Cristo morreu pelos ímpios, Pois bem, a prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores. Muito mais agora, que já estamos justificados pelo sangue de Cristo, seremos salvos da ira por ele. Quando éramos inimigos de Deus, fomos reconciliados com ele pela morte do seu Filho; quanto mais agora, estando já reconciliados”. Só um amor sem reservas é capaz de entregar o seu próprio Filho como prova da sua preocupação e cuidado para com todos.

No Evangelho Mateus apresenta Jesus com olhar compassivo e preocupado com a condição dos seus conterrâneos: “Vendo Jesus as multidões, compadeceu-se delas, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor.  Jesus chamou os doze discípulos e deu-lhes poder para expulsarem os espíritos maus e para curarem todo tipo de doença e enfermidade. Ide, antes, às ovelhas perdidas da casa de Israel! Em vosso caminho, anunciai: 'O Reino dos Céus está próximo'. Curai os doentes, ressuscitai os mortos, purificai os leprosos, expulsai os demônios”.

As palavras de Jesus aos discípulos têm tudo a ver com as insistentes recomendações que nos faz o Papa Francisco no que se refere a prática pastoral da Igreja e dos ministros na atualidade: “Compaixão e misericórdia. E se a compaixão é a linguagem de Deus, muitas vezes a indiferença é a linguagem humana. Quantas vezes olhamos para o outro lado… E assim fechamos a porta para a compaixão” alerta o Papa.  

A compaixão nos convida ao compromisso, ao anuncio do Reino de Deus, nossa missão como cristãos consiste em continuar a missão de Jesus, doando gratuitamente aquilo que recebemos na mesma condição: “De graça recebestes, de graça deveis dar”. Peçamos a graça de compreender a dimensão da compaixão e da preocupação de Deus com a humanidade sendo capazes de transformar a nossa vida em serviço de cuidado e preocupação com a vida digna para todos, com o acolhimento e com a alegria do Evangelho. A missão dos seguidores de Jesus, em todos os tempos, consiste em lutar contra tudo o que compromete a qualidade da vida e a felicidade das pessoas. Afinal de contas, rezamos no salmo: “Nós somos o povo e o rebanho do Senhor”.

 

 

 

sexta-feira, 2 de junho de 2023

HOMILIA PARA O DIA 11 DE JUNHO DE 2023 - 10º DOMINGO COMUM - ANO A

 

EU QUERO A MISERICÓRDIA E NÃO O SACRIFÍCIO!

Não bastam boas intenções, é preciso colocar em prática aquilo que se deseja. Essa máxima vale para muitas situações do cotidiano e serve para indicar que pensar e agir são dois lados da mesma moeda. Pois é este o ponto central da liturgia da Palavra nesse domingo.

Isso nós rezamos na oração que o padre faz antes das leituras, chamada de oração da coleta: “Ó Deus por vossa inspiração fazei-nos pensar o que é certo e realizá-lo com vossa ajuda”. As três leituras deixam bastante claro que o mais importante não são as palavras que saem da nossa boca transformadas em oração, ou declarações de boas intenções, mas o que conta é a concretização daquilo que sonhamos e queremos fazer de bem.

O profeta Oseias fala na primeira leitura colocando em duvidas a seriedade dos seus conterrâneos. Eles reconhecem que mais cedo ou mais tarde Deus se manifestará: “Certa como a aurora é a sua vinda, ele virá até nós como as primeiras chuvas, que regam o solo”. Apesar disso o profeta duvida da sinceridade de conversão do seu povo os ritos e orações que realizam são desligados da vida, quase como quem tenta fazer negociata com Deus. O profeta, porém, deixa clara a perspectiva de Deus: “quero amor, e não sacrifícios, conhecimento de Deus, mais do que holocaustos”.

A carta aos Romanos, Paulo escreve num contexto de dificuldade de relacionamento entre aqueles que aceitaram a proposta de Jesus, mas que tinham tradições religiosas diversas antes de conhecerem o cristianismo. Muito próximo das repreensões que fez o profeta na primeira leitura, Paulo fala para os convertidos mostrando o exemplo de Abraão. Ele não foi salvo, e nem se tornou modelo para as gerações por causa do seu conhecimento e das suas muitas palavras. Abraão se tornou exemplo para todos e pai de todas as gerações porque colocou em prática o que ouviu do Senhor. Sua fé e confiança nas promessas tornaram sua vida um modelo para ser seguido: “Abraão, contra toda a humana esperança, firmou-se na esperança e na fé. Assim, tornou-se pai de muitos povos, conforme lhe fora dito: Assim será a tua posteridade. Não fraquejou na fé, à vista de seu físico desvigorado pela idade, diante da promessa divina, não duvidou e isto lhe foi creditado como justiça”. Abraão foi o modelo da pessoa que tudo o que fez não são méritos seus, mas graça de Deus: “Ó Deus por vossa inspiração fazei-nos pensar o que é certo e realizá-lo com vossa ajuda”

O Evangelho nos apresenta uma catequese sobre a resposta que devemos dar a Deus que chama a todos sem distinção. Para Deus o que conta não é em primeiro lugar a perfeição, ele chama e abre oportunidade para todos, basta ter a coragem e predisposição para mudar o curso da vida que por sua vez mudará a própria história. O Caso de Mateus no evangelho de hoje é uma clássica situação de determinação e coragem. Na condição de cobrador de impostos, Mateus estava entre os excluídos do Templo e considerado pecador público a quem as autoridades judaicas e os fariseus não davam nenhum crédito.

Jesus não apenas convida o pecador a deixar para trás seus hábitos e costumes como também faz uma refeição com outros reconhecidamente impuros e não merecedores de confiança. Nesta ocasião Jesus responde aos fariseus: “Aqueles que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes. Aprendei, pois, o que significa: 'Quero misericórdia e não sacrifício'. De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores". A atitude de Jesus ensina que antes de julgar, condenar e excluir é necessário acolher e perdoar.

Todos os chamados de Jesus partem de um mesmo princípio: trata-se de trabalhadores do cotidiano, não se tratam de super-heróis, perfeitos e que caminham nas nuvens. Os convidados são pessoas que vivem os mesmos dramas e sofrimentos de todos os seus conterrâneos Diante do convite, Mateus não pede esclarecimentos, define a sua vida a partir do chamado sem fazer objeções. A resposta de Mateus pode ser comparada com a resposta de Abraão e de tantos outros homens e mulheres ao longo da história, a quem também nós somos convidados a imitar deixando de lado as nossas certezas, nosso orgulho e autorreferecialidade, não nos conformando com as pequenas e insignificantes conquistas que fazemos seguindo nossos próprios hábitos e costumes.

Que o exemplo dos apóstolos e a coragem de Maria nos ensine a responder sempre com determinação, alegria e ousadia.

quinta-feira, 1 de junho de 2023

HOMILIA PARA O DIA 08 DE JUNHO DE 2023 - SOLENIDADE DO SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DO SENHOR - ANO A

 

EUCARISTIA LUGAR PARA O CORAÇÃO

TRANSBORDAR DE CONFIANÇA

A quinta feira do Corpus Christi é uma das ocasiões em que a piedade popular extravasa em criatividade e manifesta o que os cristãos tem de mais extraordinário na sua relação com a Eucaristia. Em diversas comunidades os grupos dedicam semanas de trabalhos para preparar os insumos que serão utilizados na procissão deste dia.

Mas o que é a Eucaristia senão o caminhar de Jesus ao nosso lado, como fez com os discípulos de Emaús.  Ele agora é peregrino na história, alimenta a nossa fé e nos renova na esperança e na caridade. Jesus presente na Eucaristia caminhando por nossas ruas e praças realmente presente no pão consagrado é também presença em cada pessoa que caminha conosco e em cada irmão e irmã que precisa da nossa solidariedade e da nossa comunhão.

Jesus presente na Eucaristia, para quem dedicamos horas de serviço preparando os insumos e os tapetes com os quais enfeitamos nossas ruas é o mesmo que continua dizendo: Eu tive fome e vocês me deram de comer, Eu tive sede e me deram de beber, eu era peregrino e me acolheram, eu estava nu e me vestiram, eu estava doente e preso e foram me visitar.

Esse Jesus que caminha conosco nas ruas decoradas de nossas cidades é o mesmo que disse aos discípulos: “Vocês não precisam mandar ninguém embora com fome: deem vocês mesmos de comer.

Jesus presente na Eucaristia é nossa força espiritual para que coloquemos em prática o seu o mandamento do amor que se concretiza à medida que nossas comunidades sejam lugar de perdão, de acolhida, de valorização das pessoas e das diferenças. A Eucaristia que adoramos caminhando por nossas ruas e praças é o mesmo que convida a sermos sensíveis às necessidades dos mais frágeis, pobres, doentes, indefesos e carentes. Assim se confirma que somos capazes de amar como ele nos amou!

O caráter festivo da procissão que realizamos hoje completa a festa da ressurreição do Senhor que como aos discípulos nos precede na Galileia dos nossos tempos e que caminha conosco até o fim do mundo e continua a nos enviando para todas as nações do mundo, fazendo a mesma recomendação que deu aos discípulos: Não mandem ninguém para casa de mãos vazias, deem vocês mesmos de comer!

A esse Jesus que está além das paredes das nossas igrejas, confiamos à sua misericórdia, nossas estradas, nossas casas, nossa vida cotidiana. Que nossas estradas sejam de Jesus, Que nossas casas sejam d’Ele, para Ele e com Ele, que a nossa vida e a de todos sejam guiadas por Ele e por sua Palavra, nas ruas decoradas de nossas cidades colocamos sob o olhar de Jesus os sofrimentos dos doentes, a solidão dos jovens e dos idosos, as tentações e os medos de nossas vidas.

A procissão é uma grande bênção pública para nossa cidade, a Eucaristia que levamos solenemente completa o caminho de Iniciação à vida cristã é deste sacramento que brota todos os demais. Esta procissão é a expressão da autêntica ação de graças ao Pai por seu amor e misericórdia colocados em nossas vidas pela entrega do seu Filho Jesus verdadeiro Deus e verdadeiro homem.

A Eucaristia não é uma simples lembrança, no pão partido Deus derrama toda a sua misericórdia sobre nós e sobre todos a ponto de renovar o nosso coração, a nossa existência e o nosso próprio modo de nos relacionarmos com Ele e com os irmãos.

Nunca seremos suficientemente agradecidos a Deus pelos dons que nos concede na Eucaristia, cada vez que celebramos a Eucaristia, cada vez que vamos a missa e nela comungamos sentimo-nos acolhidos e regenerados pela misericórdia de Deus.

Que a Virgem Maria, que esteve sempre unida a Jesus, nos ajude a descobrir na Eucaristia a dimensão do serviço, do lava pés, do comprometimento e da comunhão com todas as criaturas.

LOUVADO SEJA NOSSO SENHOR JESUS CRISTO!

 

 

 

 

HOMILIA PARA O DIA 04 DE JUNHO DE 2023 - DOMINGO DA SANTÍSSIMA TRINDADE - ANO A

 DEUS MISERICORDIOSO E CLEMENTE

Poucas situações e experiências humanas são mais significativas do que o perdão e a reconciliação cujo local extraordinário é o seio da família. Sentir-se participante de uma família que se quer bem, se respeita e se ama é tranquilizador e serve de testemunha para muitas outras relações sociais do cotidiano.

Este domingo, chamado da Santíssima Trindade é a oportunidade que Deus tem para manifestar mais claramente sua existência como família, que vive a plena comunhão, a corresponsabilidade e a partilha.

No texto do Êxodo temos uma definição de Deus que sai da boca de Moisés: “Senhor, Senhor! Deus misericordioso e clemente, paciente, rico em bondade e fiel". Por causa dessa convicção Moisés apresenta alguns pedidos: “Senhor, se é verdade que gozo de teu favor, peço-te, caminha conosco; embora este seja um povo de cabeça dura, perdoa nossas culpas e nossos pecados e acolhe-nos como propriedade tua". Moisés tem convicção que a misericórdia de Deus é ilimitada e aconteça o que acontecer Deus não abandonará o seu povo!

Na carta aos coríntios o mais importante é a saudação que Paulo recomenda aos cristãos: “Saudai-vos uns aos outros com o beijo santo. Todos os santos vos saúdam. A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós”. Ao mesmo tempo que propõe uma forma de manifestar o bem querer entre as pessoas da comunidade ele reforça o conceito de Deus que é comunhão, que é família e que se manifesta na Trindade.

No Evangelho João apresenta a culminância de uma extraordinária história de amor: “Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna”.  As gerações, tal como o povo de Israel continua com as mesmas dificuldades de outrora que agora se manifestam em práticas egoístas, alienação, escravidão, discórdias e assim por diante. Em Jesus que se fez obediente todos são convidados a aprender que a vida plena consiste em obedecer ao Pai e doar a vida pelo bem de todos.

Deus não mandou seu filho ao encontro dos perfeitos, justos e bons, mas de todo aquele que nele crer, para todos Jesus apresenta a proposta de um novo estilo de vida. Em Jesus o divino se torna humano e o humano alcança divindade.

A Trindade é a manifestação de Deus que acolhe com ternura todos e cada uma ensinando a formar comunhão, partilha e solidariedade. A trindade no estimula “encorajai-vos, cultivai a concórdia, vivei em paz”.



 

sexta-feira, 26 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 28 DE MAIO DE 2023 - DOMINGO DE PENTECOSTES - ANO A

 

A PARTIR DE JESUS TODOS SOMOS REPLETOS DO ESPÍRITO SANTO

No decorrer de nossos dias todos já experimentamos situações de medo e insegurança e quando relatamos essas situações as fazemos sempre com figuras de linguagem para melhor nos fazer entender e para dar a dimensão do ocorrido de modo que os nossos interlocutores não só entendam, mas se sintam envolvidos na narrativa e participantes da situação que contamos. Pois as três leituras deste domingo relatam situações de medo e preocupação pelas quais passavam as comunidades envolvidas nas narrativas.

O texto dos Atos dos apóstolos começa dizendo: “os discípulos estavam todos reunidos no mesmo lugar.  De repente, veio do céu um barulho como se fosse uma forte ventania, então apareceram línguas como de fogo” só depois deste relato eles se dão conta que não se trata de uma situação de medo e insegurança mas percebem como de repente eles se enchem de coragem e determinação: “Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito os inspirava” A leitura termina apresentando as diversas nacionalidades de pessoas que em torno de Jesus e animados pelo Espírito Santo formam a nova comunidade na qual todos se entendem e são capazes de ultrapassar suas diferenças. O que aconteceu com a comunidade dos discípulos, também é o que precisa e pode acontecer com a nossa Igreja que reunida em torno de Jesus e animada pelo Espírito Santo dá testemunho e vive a alegria do Evangelho! A partir dos dons do Espírito Santo já não tem mais lugar para grupos fechados dentro da sua própria verdade, antes a Igreja é impulsionada para superar o medo e acolher a todos nas suas particularidades e diferenças.

A carta de São Paulo que ouvimos na segunda leitura se destina a uma comunidade quase perfeita, aos coríntios faltava umas poucas coisas entre elas o amor fraterno. Paulo os compara a um corpo: “Como o corpo é um, embora tenha muitos membros, e como todos os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo” e, portanto, ninguém tem o direito de se achar melhor ou mais importante que o outro, porque todos vivem em função de uma única e mesma causa: “Há diversidade de dons, mas um mesmo é o Espírito. Há diversidade de ministérios, mas um mesmo é o Senhor. Há diferentes atividades, mas um mesmo Deus que realiza todas as coisas em todos. De fato, todos nós, judeus ou gregos, escravos ou livres, fomos batizados num único Espírito, para formarmos um único corpo” Em todos os tempos e lugares e para todos os tempos e lugares precisa ficar claro que cada pessoa com seus dons e carismas deve se colocar a serviço de todos. Ninguém tem o direito de guardar os dons para si ou julgar que é mais importante e necessário que os demais.

Quando temos medo e estamos inseguros, é muito importante ouvir a expressões do tipo: “Aquiete seu coração, conte comigo, se precisar de mim estou a seu lado”. Pois foi isso que Jesus ofereceu aos medrosos discípulos: “A paz esteja com vocês... recebam o Espírito Santo... perdoem os pecados...”

Eles não estavam entendo nada do que havia acontecido duvidavam de tudo e de todos, porém a palavra de Jesus faz deles uma comunidade de reconciliados uma assembleia pronta para a missão: “Assim como o pai me enviou eu também os envio”. Eles são desafiados a anunciar a alegria da ressurreição e o perdão para todos.

O que acontece naquele momento com os discípulos se realiza pela força do Espírito Santo que dá a conhecer todos os seus dons e carismas para serem colocados em comum, cada um a seu modo, mas para o bem de todos. O Espírito empurra os discípulos para o mundo e os anima a viver o amor de Jesus com todas as suas consequências.

Também para nós deve ficar claro que não existe outra razão para existir como Igreja se não para acolher e promover o perdão que alcance a todos.

Aprendamos com Maria, que estava no cenáculo com os apóstolos, e rezemos com ela pedindo para nossa Igreja um espírito missionário e fervoroso: “Senhor vem dar-nos sabedoria que faz ser tudo como Deus quis”.

quarta-feira, 17 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 21 DE MAIO DE 2023 - ASENSÃO DO SENHOR - ANO A

 

ENVIADOS PARA FALAR E OUVIR COM O CORAÇÃO

 

Do ponto de vista fisiológico o coração tem a função primeira de bombear o sangue para todo o corpo. Entretanto do ponto de vista afetivo e ao longo da história poetas, cantores, atores e todas as pessoas em qualquer lugar e condição em que se encontram atribuem muitas outras funções para o coração. Duas delas o Papa Francisco retoma na mensagem que escreveu para o Dia Mundial das Comunicações Sociais que é celebrado nesse domingo da Ascensão do Senhor. O papa recorda que à medida que estas duas funções se desenvolvem de modo equilibrado a pessoa é capaz de sentir o pulsar do coração alheio com a mesma clareza que sente do seu próprio.

No domingo da Ascensão todos os cristãos são convidados a falar e escutar as alegrias, as esperanças, as tristezas e as angústias de todas as pessoas do nosso tempo. Esta tarefa Jesus confiou aos discípulos por ocasião da sua despedida: “Toda a autoridade me foi dada no céu e sobre a terra. Portanto, ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e ensinando-os a observar tudo o que vos ordenei! Eis que eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo".

 A Ascensão de Jesus, mais do que marcar o fato do distanciamento físico entre o Mestre e os discípulos, marca a etapa final da missão que Ele recebeu do Pai, e que cumpriu com plena maestria, e deixa clara que a tarefa de dar continuidade cabe à comunidade dos discípulos em todos os tempos. Isso significa cabe a nós cristãos do século XXI testemunhar Jesus e o seu Evangelho para todos os povos.

Esta tarefa merece ser cumprida com a clareza como foi dada aos discípulos: “Jesus foi levado ao céu, à vista deles. Uma nuvem o encobriu, de forma que seus olhos não mais podiam vê-lo. Os apóstolos continuavam olhando para o céu, enquanto Jesus subia. Apareceram então dois homens vestidos de branco, que lhes disseram: Homens da Galileia, por que ficais aqui, parados, olhando para o céu? Esse Jesus que vos foi levado para o céu, virá do mesmo modo como o vistes partir para o céu".

Somos a Igreja de Jesus Cristo chamada todos os dias a “caminhar juntos”, falar e ouvir com o coração apresentando e testemunhando a todos sem distinção o projeto do Reino de Deus. Os novos desafios que o mundo nos apresenta precisam ser enfrentados à luz dos ensinamentos de Jesus, sem medo e com criatividade.

Este é também o convite feito por Paulo na carta aos Efésios. Os discípulos não podem facilitar que foram chamados a caminhar juntos e anunciar a esperança como membros de um único e mesmo corpo cuja cabeça é Jesus Cristo: “Que ele abra o vosso coração à sua luz, para que saibais qual a esperança que o seu chamamento vos dá, qual a riqueza da glória que está na vossa herança com os santos”

Essa tarefa deve ser levada a cabo com o coração cuja força é capaz de dissipar as sombras do mundo fechado e dividido e no seu lugar construir a civilização do amor.

Nesse dia da Ascensão tenhamos clareza que a nossa comunicação deve proclamar aquilo que rezamos no salmo:

Porque Deus é o grande Rei de toda a terra, *
ao som da harpa acompanhai os seus louvores!

Deus reina sobre todas as nações, *

 

quinta-feira, 4 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 14 DE MAIO DE 2023 - 6º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 NÃO LHES DEIXAREI ÓRFÃOS!

Sentir-se apoiado e amparado diante das situações difíceis que a vida oferece com grande frequência é sempre um consolo e uma espécie de porto seguro. Aliás costuma-se usar a expressão “Porto Seguro” para fazer referência a situações e pessoas que em determinado momento da vida servem de apoio e ajuda quando aparecem as complicações e dificuldades por diferentes causas e motivos.

A Palavra de Deus proclamada na liturgia desse domingo é uma espécie de “porto seguro” ou melhor ainda uma maneira de fazer perceber como Deus age e está presente no cotidiano de modo discreto e tranquilizador.

O texto do Evangelho é parte de uma longa conversa que Jesus tem com seus discípulos na qual ele deixa claro que chegou a hora em que eles mesmos devem alçar voo com suas próprias asas e forças. Obvio que a comunidade dos seguidores ficou perplexa e insegura com a afirmação de Jesus que soa como se fosse um testamento. Jesus conclui a sua fala lhes garantindo presença e cuidado, mas agora de uma maneira diferente daquela que os discípulos tinham experimentado: “Pouco tempo ainda, e o mundo não mais me verá, mas vós me vereis, porque eu vivo e vós vivereis. Não vos deixarei órfãos. Eu virei a vós. Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará um outro Defensor, para que permaneça sempre convosco”

Fica claro para os discípulos que sua vida, sua missão e a comunidade que foi constituída por Jesus se tornará a morada de Deus no mundo e que as pessoas irão reconhecer isso mediante o testemunho de suas vidas. Durante sua vida terrena Ele mesmo foi a segurança que os discípulos precisavam e por suas ações se deu a conhecer como o “rosto misericordioso do Pai” a partir de agora será o Espírito Santo quem vai cuidar dos discípulos. Deus continuará sua presença discreta e segura no mundo de uma outra maneira.

O Espírito que o Pai enviará vai agir de duas maneiras: uma conservando a memória e os ensinamentos de Jesus e outra dando segurança aos discípulos na missão que estavam recebendo. Os sofrimentos de Cristo continuam se repetindo na vida de tantas pessoas perto de nós. Muitas vezes nos sentimos impotentes e sofremos de modo desmedido. Vemos que o mundo se organiza muitas vezes de modo egoísta e injusto, mas é certo que o Reino de Deus vai chegar.

A primeira leitura é a prova mais perfeita da presença de Jesus no meio deles que realizam com suas ações e na comunhão de uns com os outros na medida em que a comunidade dos discípulos vive sua fé formando uma grande comunidade que caminha junto e se mostra reunida com o Pai e com Jesus: “Naqueles dias, Felipe desceu a uma cidade da Samaria e anunciou-lhes o Cristo. Os apóstolos, que estavam em Jerusalém, souberam que a Samaria acolhera a Palavra de Deus, e enviaram lá Pedro e João. Chegando ali, oraram pelos habitantes da Samaria, para que recebessem o Espírito Santo”. Os judeus tinham preconceitos em relação aos samaritanos, considerando-os impuros, mas os discípulos mostram como a Igreja nascente não tinha fronteiras e na alegria anunciava a boa noticia de Jesus.

Na carta de Pedro mais uma vez fica clara a intenção do autor que consiste em reanimar a comunidade que vivia confrontada com as hostilidades do mundo. As palavras do apóstolo têm o objetivo claro de estimular os destinatários para mostrar o amor de Jesus Cristo ao mundo mesmo no contexto das perseguições e dificuldades: “Caríssimos: Santificai em vossos corações o Senhor Jesus Cristo, e estai sempre prontos a dar razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la pedir. Fazei-o, porém, com mansidão e respeito e com boa consciência”.

Estas palavras deixam claro que uma comunidade que vive a comunhão com Jesus e com todos partilhando a mesma fé é uma comunidade que não precisa ter medo porque é na comunhão e solidariedade que todos podem reconhecer a presença de Jesus que se manifesta na força do Espírito Santo renovando todos e cada um. Então sim todos podemos cantar com o salmista:

Aclamai o Senhor Deus, ó terra inteira,
cantai salmos a seu nome glorioso!

 



 

terça-feira, 2 de maio de 2023

HOMILIA PARA O DIA 07 DE MAIO DE 2023 - 5º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 

JESUS, O CAMINHO PARA O PAI

 

Todas as experiências de separação e de perdas afetam profundamente o nosso dia a dia. Sofremos profundamente com tudo aquilo que frustra as nossas expectativas e diante desta realidade facilmente somos fadados a perder a esperança e nos deixar tomar pelo desânimo, a tristeza e a desilusão. Esta situação foi experimentada pelos discípulos de Jesus que não haviam entendido as referências que o Mestre lhes havia dado durante os dias de sua vida terrena. Depois da morte de Jesus, definitivamente os discípulos se sentiram completamente perdidos, sem rumo e sem perspectiva para continuar qualquer atividade que lhes fosse apresentada.

A Palavra de Deus que ouvimos nesse domingo foi o ponto de partida para os discípulos compreenderem a nova situação da sua vida e missão, ela serve ao mesmo tempo para a Igreja e para cristão contemporâneo. As desilusões que a vida nos oferece devem servir para fortalecer a nossa resiliência e renovar sempre nosso testemunho do amor de Deus ao mundo. Em outras palavras a viver a Alegria do Evangelho!

Jesus deixa claro aos discípulos que aceitar a sua condição como Caminho que leva ao Pai implica renovar-se sempre e de novo colocar-se na dinâmica de também estar a serviço da vida e da qualidade de vida para todas as pessoas.

Aceitar Jesus como caminho, verdade e vida consiste em se tornar sempre gente nova que se reconstrói na doação total aos irmãos e às irmãs, significa sair do seu egoísmo e colocar-se a serviço das pessoas em todos os lugares e em todos os tempos.

Claro está que quem se coloca no caminho da doação nem sempre é uma pessoa totalmente perfeita e santa. Seja a pessoa, seja a Igreja todos fazem parte de uma comunidade de gente que busca a perfeição e a santidade, mas que apesar disso traz em si mesmo as marcas do pecado e da imperfeição. Tanto os discípulos de outrora como os cristãos contemporâneos, todos somos convidados a ser uma comunidade de diáconos na qual uns estão a serviço dos outros e certos que apesar das imperfeições e deslizes todos são conduzidos e animados pelo Espírito Santo. Como os diáconos daquele tempo cada pessoa que recebe ou assume uma função ou tarefa na comunidade não faz para a promoção pessoal nem para concretizar sonhos egoístas, mas desempenham a tarefa em benefício dos irmãos e das irmãs.

Na segunda leitura, Pedro deixa claro que todos formamos o templo espiritual, porém deve ficar claro que isso se manifesta à medida que nela se reconhecer Jesus como a Pedra Principal. Permanecer unido e no caminho de Jesus é a única e decidida maneira de se apresentar diante de Deus com aquilo que temos de mais precioso: nossa vida e nosso amor.

O Espírito Santo, que delicadamente conduz a história, nos impulsione, como comunidade eclesial, a viver a alegria, a verdade, a justiça e a paz.

 

sexta-feira, 21 de abril de 2023

HOMILIA PARA O DIA 23 DE ABRIL DE 2023 - 3º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 

PARTIR E REPARTIR O PÃO PARA RECONHECER JESUS

 

Não são raras nossas experiências de frustração e desencanto. Frequentemente vemos nossos sonhos se desfazerem como bolhas de sabão. Desiludidos diante destas situações resta nos lamentar e partilhar com outros que experimentam a mesma sensação de perdas e sofrimentos.

Situação de desolação é a que vivia a comunidade dos seguidores de Jesus depois da sua morte. O Texto do Evangelho de hoje, Lucas escreveu quase 50 anos depois da morte de Jesus. Recuperando um fato contado de boca o autor tem a intenção de reanimar a comunidade do seu tempo que estava atravessando mais uma das grandes crises e provações.

O que merece ser destacado no Evangelho é a maneira como se dá o encontro de Jesus com os desiludidos discípulos que caminhavam sem rumo depois da sua morte. Duas coisas são fundamentais: Recordar a Palavra de Deus transmitida por Moisés e os profetas e partir e repartir o pão como ensinou Jesus.

A maneira como Jesus lhes recordou a escritura fez arder o coração e a lição da partilha lhes fez reconhecer Jesus enchendo-os de coragem para retomar a vida e a tarefa que haviam abandonado: “Então disseram um para o outro: Não estava o nosso coração ardendo quando nos explicava as escrituras pelo caminho? No mesmo instante voltaram para Jerusalém e, encontrando os outros reunidos disseram: Nós vimos o Senhor”!

Também para nós serve a lição: As desilusões e fracassos da vida são superados quando aprendemos com Jesus a lição da partilha. Jesus continua caminhando conosco, para que nossos olhos se abram resta-nos aprender a lição da fraternidade. Muitas vezes sonhamos com coisas extraordinárias e intervenções espetaculares, esta não é a lógica de Deus. Ele caminha ao nosso lado nas estradas do mundo se o reconhecemos nossos sonhos não serão frustrações e devaneios.

A primeira leitura reafirma a ideia de um messias que passou pelo mundo realizando gestos que testemunhavam o jeito de ser de Deus, por causa disso foi condenado e morto, mas Deus o ressuscitou: “Gente de Israel, ouçam estas palavras: Jesus de Nazaré foi um homem em quem Deus confiava e que provou isso por meio de milagres e sinais realizados no meio de todos, apesar disso foi condenado a morte de uma maneira perversa. Mas, Deus o ressuscitou livrando-o dos laços da morte”.  Tal como Pedro cada cristão do nosso tempo é convidado a testemunhar Jesus no mundo de hoje.

Na segunda leitura, o autor da carta de Pedro nos convida a reconhecer o amor de Deus pelo mundo que se revelou na cruz de Jesus. A carta é um convite para manter a fidelidade e a firmeza da fé apesar das hostilidades e sofrimentos presentes em todos os tempos: “Lembrem-se que não foi com coisas corruptíveis, nem com ouro e prata que Deus se deu a conhecer, mas pelo sangue derramado na cruz”. Portanto sejam firmes na esperança, no amor, na solidariedade. Vivam com alegria, coragem e coerência aquilo que acreditam.

Então sim podemos cantar:

Mostrai-me Senhor o Caminho da vida!

Bendigo o Senhor por me ter aconselhado,
até de noite me inspira interiormente.
O Senhor está sempre na minha presença,
com Ele a meu lado não vacilarei.

quarta-feira, 12 de abril de 2023

HOMILIA PARA O DIA 16 DE ABRIL DE 2023 - 2º DOMINGO DA PÁSCOA - ANO A

 EU CREIO NUM MUNDO NOVO...

Expressões do tipo: “Em cima do muro”; “andar no escuro”; “cair para trás” e uma série de outras deste gênero são usadas em nosso cotidiano para indicar medo e insegurança em relação às responsabilidades e atividades que precisamos desenvolver. Pois o Evangelho deste domingo começa descrevendo algumas situações desta natureza pelas quais estavam passando os discípulos de Jesus logo após a sua trágica morte. O evangelho começa dizendo: “Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam...” Mais do que estar nestas condições, as expressões indicam que os discípulos estavam perdidos e desiludidos em relação a tudo o que acreditavam e ao futuro da sua condição de seguidores de Jesus de Nazaré.

Porém a continuidade do Evangelho e as outras leituras nos apresentam uma comunidade de gente que renasce das cinzas e à sombra da Cruz ganha coragem para recomeçar todos os seus projetos. As aparições de Jesus e a maneira como elas se realizam apontam com clareza que Jesus, agora ressuscitado, continua sendo o centro da comunidade. Reunidos os discípulos recebem a missão e a força para colocar em prática: “Jesus entrou e pondo-se no meio deles, disse: "A paz esteja convosco". Como o Pai me enviou, também eu vos envio. Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos". Enquanto estamos sozinhos somos um agrupamento de pessoas medrosas e sem rumo, mas à medida que reconhecemos Jesus nos tornamos fortes e corajosos diante das adversidades e medos que o mundo nos impõe.

A consequência deste reencontro com Jesus está descrita na primeira leitura. Os Atos dos Apóstolos fazem uma fotografia da comunidade cristã nascida em torno da pessoa de Jesus e fiel em algumas pequenas, mas significativas ações: “Eram perseverantes em ouvir o ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna na fração do pão e nas orações. Todos os que abraçavam a fé viviam unidos e colocavam tudo em comum; frequentavam o Templo, partiam o pão pelas casas e, unidos, tomavam a refeição com alegria e simplicidade de coração. Louvavam a Deus e eram estimados por todo o povo”. Também nós cristãos do século XXI somos convidados a reconhecer Jesus Cristo e a partir dele estabelecer um estilo diferente de vida sustentado nas mesmas práticas das primeiras comunidades.

Na mesma linha Pedro, na segunda leitura, fala aos cristãos do seu tempo: “Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Em sua grande misericórdia, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, ele nos fez nascer de novo, para uma esperança viva, para uma herança incorruptível, que não se mancha nem murcha”. O Apóstolo reconhece todas as provações e sofrimentos aos quais a comunidade está sujeita, mas deixa bem claro que: “Graças à fé, e pelo poder de Deus, vós fostes guardados para a salvação que deve manifestar-se nos últimos tempos. Isto é motivo de alegria para vós, embora seja necessário que agora fiqueis por algum tempo aflitos, por causa de várias provações”.

Não tenhamos medo, nem sejamos fracos como Tomé, não queiramos ir sozinho ao encontro de Jesus, antes na comunidade e junto com todos proclamemos: “Meu Senhor e meu Deus”! E rezemos com o Salmista:

Dai graças ao Senhor,

porque Ele é bom;

eterna é a sua misericórdia!